Carlos Caldas ganha prémio por avanços na investigação do cancro da mama
O cientista Carlos Caldas trabalha há mais de 20 anos na biologia, diagnóstico e tratamento do cancro da mama. Agora recebeu o Prémio Leopold Griffuel pelas suas contribuições para esta área.
Nas últimas décadas, o nome de Carlos Caldas tornou-se incontornável no estudo do cancro da mama, sobretudo pelas descobertas acerca da biologia destes tumores e de como os podemos monitorizar e atacar. É por estes motivos que o investigador português do Instituto de Cambridge para a Investigação em Cancro (Reino Unido) recebeu, no início desta semana, o Prémio Leopold Griffuel na categoria de investigação clínica, atribuído pela Fundação ARC para Investigação em Cancro. A distinção foi entregue no Parlamento Europeu e garante 150 mil euros para o futuro trabalho científico da equipa de Carlos Caldas.
É a primeira vez que um cientista português recebe este prémio – cuja verba atribuída mostra bem a importância da distinção. Este ano, a fundação francesa criou uma edição especial, dedicada exclusivamente aos avanços no cancro da mama, área em que Carlos Caldas se tem destacado ao longo das últimas décadas. Desde uma nova enciclopédia genética do cancro da mama até à resposta terapêutica, esta é a investigação dos últimos 20 anos que motivou a entrega desta distinção ao português.
No diagnóstico de cancro da mama são utilizados dois marcadores genéticos que, em 2012, permitiam classificar o cancro da mama em quatro tipos diferentes. Nesse mesmo ano, o investigador português alargou o mapa conhecido destes cancros. A análise molecular realizada pela equipa de Carlos Caldas ajudou a descobrir novas classes de cancros da mama: são agora 11 tipos diferentes descritos nesta “enciclopédia genética”, como caracterizaram os autores na altura.
No tratamento, também há trabalho feito, com a descoberta de que o ADN originado nas células tumorais, e que entra em circulação no corpo, pode ser utilizado como biópsia líquida e é “uma forma de monitorizar o cancro” e perceber “como está a responder à terapêutica”, como explica agora Carlos Caldas ao PÚBLICO. Além disso, ainda se utilizaram, mais recentemente, os dados moleculares das biópsias dos tumores malignos para conseguir prever a resposta do cancro à terapia – ajudando a personalizar o tratamento consoante o paciente.
Este estudo aprofundado deriva da análise dos ecossistemas tumorais, ou seja, o espaço em que o cancro vive e que junta as células malignas, as células normais do sistema imunitário e outros tecidos, como os vasos sanguíneos. Além de estudar o cancro em si, Carlos Caldas investiga todo o conjunto que constitui a doença oncológica.
Na edição deste ano do Prémio Léopold Griffuel também foi distinguida Sarah-Maria Fendt, do Centro de Biologia do Cancro de Leuven (Bélgica), na categoria de investigação fundamental, pelo trabalho desenvolvido sobre o metabolismo das células cancerosas. Na mesma cerimónia, em Bruxelas, entregou-se pela primeira vez o Grande Prémio Oberling-Haguenau, também da Fundação ARC para Investigação em Cancro, que distinguiu Gwenn Menvielle, do Instituto Nacional de Saúde e Investigação Médica de França (Inserm), pelo trabalho em torno das dificuldades das mulheres com cancro da mama em regressar ao mercado de trabalho.
“Os avanços cirúrgicos, terapêuticos e no diagnóstico são de facto enormes. Quando acabei o curso de Medicina, em 1984, menos de 50% das mulheres diagnosticadas com cancro da mama sobreviviam dez anos. Hoje, uma doente diagnosticada com cancro da mama tem mais de 85% de probabilidade de estar viva dez anos depois do diagnóstico”, contextualiza o português.
Em 2018, entrevistado pelo PÚBLICO, Carlos Caldas deixava uma profecia optimista para o futuro: “Não vai haver uma cura universal para o cancro. Vamos ter mais cancros precoces curáveis, porque são diagnosticados numa fase precoce. Vamos tentar, e nós estamos a trabalhar nisso, rastrear mais cedo, através de uma biópsia líquida, os cancros que metastizam.”
Ainda assim, apesar da evolução, continua a haver trabalho pela frente. “O cancro é tão frequente no mundo ocidental que ainda há muito, mesmo muito, para fazer. O cancro da mama é hoje a principal causa de morte por cancro nas mulheres. Só mais investigação pode melhorar isto”, defende, acrescentando que quer continuar a “fazer descobertas com impacto clínico” nos próximos dez a 15 anos.