Supremo dos EUA mantém acesso a pílula abortiva — por agora

Desafio legal mantém-se em processo que vai muito além do aborto e abre a porta à proibição de medicamentos assente em critérios que não são os científicos.

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Opositores do direito ao aborto em frente ao Supremo NATHAN HOWARD/Reuters

O Supremo Tribunal dos Estados Unidos manteve, por agora, o acesso à pílula abortiva mifepristone. Mas o processo, que tem implicações não só para a possibilidade de aborto com recurso a medicamento, mas também no próprio processo de avaliação dos medicamentos, não terá terminado com esta decisão.

O que o Supremo decidiu agora foi impedir a entrada em vigor de uma decisão de 7 de Abril de um juiz do Texas que suspendia totalmente do mercado a pílula mifepristone, um de dois medicamentos prescritos para interromper uma gravidez, mas que é ainda usada em casos de aborto espontâneo.

Esta pílula é usada há mais de duas décadas como parte de um regime em mais de metade dos abortos clínicos feitos nos Estados Unidos, junto com um segundo medicamento, o misoprostol (o protocolo mifepristone seguido de misoprostol é também usado em Portugal).

A decisão foi tomada apenas horas antes de entrar em vigor a proibição decretada pelo juiz do Texas, um veredicto que foi uma estreia: nunca antes tinha havido uma decisão judicial de suspender um medicamento. Há especialistas a temer que surjam processos, e decisões, contra medicamentos com base política e não com critérios de saúde.

“Se esta decisão fosse confirmada, não haveria qualquer medicamento sujeito a prescrição que tenha sido aprovado pela FDA que estivesse a salvo deste tipo de ataques políticos e ideológicos”, declarou o Presidente, Joe Biden, citado pelo diário The Washington Post.

A decisão foi uma vitória, ainda que não definitiva, para Biden, cuja Administração se empenhou em impedir estas restrições.

Mas o veredicto do Supremo não discute o caso em si, nem entra na questão da autoridade da FDA. Com processos simultâneos e sem uma decisão sobre o ponto central do caso, é provável que a questão possa acabar de novo no Supremo dentro de meses ou até anos, diz a agência Reuters.

As implicações de uma decisão de restringir o acesso ao medicamento seriam sentidas também em estados onde o aborto é legal, sublinha o New York Times, e teria ainda consequências maiores na autoridade da Food and Drug Administration, entidade responsável por avaliar e autorizar a entrada de medicamentos no mercado dos Estados Unidos e até na própria indústria farmacêutica.

Na argumentação contra mais restrições ao medicamento, o Departamento de Justiça sublinhou que mesmo nos estados em que é proibida a sua utilização como parte de legislação restritiva do aborto, não há um estado em que o mifepristone não tenha utilização legal.

O veredicto não muda, no entanto, a proibição de abortos com recurso a medicamentos que já existem em mais de 12 estados, diz ainda o Post.

Depois de o Supremo ter revertido, em 2022, a decisão do caso Roe vs. Wade , de 1973, que estabeleceu o direito ao aborto, a pílula abortiva tornou-se o novo alvo dos opositores do aborto, com tentativas em diversos tribunais de vários estados para impedir o seu acesso.

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