Quem mistura posições de Lula com relação com Brasil “não está à altura de assumir cargos”
O líder do PSD discorda da data, mas estará na sessão solene de recepção ao Presidente brasileiro. Sobre o Chega não acrescenta “mais nada” e vai a Belém repetir que é alternativa.
O presidente do PSD distinguiu esta segunda-feira as posições do presidente do Brasil sobre a Ucrânia da relação entre os dois países, considerando que políticos que as confundem "não estão à altura de assumir cargos de responsabilidade na democracia portuguesa". Para a Iniciativa Liberal, a presença do presidente do Brasil na Assembleia da República no dia 25 de Abril significa "uma instrumentalização" da data. Já o Bloco de Esquerda argumenta que a visita de Lula da Silva acontece por "outros critérios" que vão além da guerra na Ucrânia.
Em declarações aos jornalistas no final de uma visita de comboio entre as estações de Agualva-Cacém e o Rossio, Luís Montenegro foi questionado se contava encontrar-se com Lula da Silva na próxima semana, depois de o vice-presidente do PSD Paulo Rangel ter instado no domingo o Governo a demarcar-se das declarações do presidente brasileiro de que a União Europeia, NATO e EUA estão a estimular a guerra na Ucrânia.
"Vou participar nas sessões solenes na Assembleia da República no 25 de Abril", respondeu Montenegro, considerando que a posição do PSD "é clara e inequívoca" quanto às duas polémicas recentes sobre a visita de Lula a Portugal, entre 22 e 25 e Abril.
Por um lado, o presidente do PSD recordou que o partido defendeu que a sessão de boas vindas ao presidente do Brasil "se deveria realizar num outro dia e que não se devia confundir com a sessão solene evocativa do 25 de Abril, na qual o Presidente da República e os partidos se devem expressar de forma livre e democrática".
O Parlamento acabou por marcar ambas para o dia 25 de Abril: às 10h a sessão de boas vindas e Lula da Silva e, às 11h30, a sessão solene que assinala o 49.º Aniversário da Revolução de 1974 em Portugal, sem oposição do PSD.
"Relativamente à posição do presidente Lula da Silva e da política externa do Brasil no que toca à guerra da Ucrânia há uma fronteira que nos separa completamente: nós não temos nenhuma complacência nem nenhuma condescendência com a agressão da Rússia à Ucrânia. Isso deve ficar muito claro, quer do ponto de vista do nosso partido, quer do ponto de vista da relação do Estado português com o presidente do Brasil", vincou.
No entanto, questionado se estas posições afectarão de alguma forma a participação do PSD na sessão parlamentar de boas vindas a Lula, Montenegro frisou ser necessário distinguir os dois planos. "Temos uma divergência profunda, elementar do ponto de vista dos princípios. Isso não significa que desrespeitemos o povo brasileiro que o presidente do Brasil representa. E mais: não nos podemos esquecer das centenas de milhares de portugueses que vivem no Brasil e de brasileiros em Portugal, somos países com uma cultura e uma história comuns e com uma ligação muito forte diariamente", frisou.
A este propósito, o presidente do PSD acrescentou ainda um "recado": "Aqueles que não têm capacidade de ver isto não estão à altura de assumir cargos de responsabilidade na democracia portuguesa", afirmou.
Chega não, alternativa sim
À chegada à estação do Rossio, vindo de comboio do Cacém, na primeira iniciativa da iniciativa "Sentir Portugal", esta semana dedicada ao distrito de Lisboa, Luís Montenegro foi desafiado a clarificar se, na entrevista à CNN Portugal na sexta-feira, quando disse que recusa ter no Governo ou apoio de políticos ou políticas racista, xenófobos ou populistas se estava a referir ao Chega.
"Eu acho que não é preciso adiantar nem acrescentar mais nada ao que disse, eu não quero, não vou, não é preciso acrescentar nada", afirmou, repetindo esta resposta a todas as perguntas sobre o partido liderado por André Ventura.
Questionado se, na audiência que terá com o Presidente da República, irá transmitir a Marcelo Rebelo de Sousa uma linha vermelha com o Chega, o presidente do PSD começou por dizer que vai a Belém "fazer uma análise da situação política, económica e social".
"Estou concentradíssimo e tocadíssimo em combater o PS e mostrar que há uma linha de rumo mais indutora de esperança, de crescimento. Não tenho mais nada a acrescentar [sobre o Chega] senão repetir aos portugueses que o PSD está dia a dia a palmilhar o território nacional e a falar com as pessoas de todas as condições para ouvir os seus problemas e construir soluções de futuro", disse.
Questionado sobre se esta clarificação em relação ao Chega foi motivada por reptos do presidente da República, Montenegro voltou a não responder directamente: "Sinto que Portugal precisa de um Governo novo e eu estou preparado", disse, assegurando que "obviamente" irá dizer a Belém que o PSD já é alternativa ao Governo do PS.
O Presidente da República voltou a afastar no início da semana passada a hipótese de dissolução, invocando a conjuntura e falta de "uma alternativa óbvia em termos políticos", e Luís Montenegro respondeu dois dias depois indirectamente a Marcelo Rebelo de Sousa, que tinha assegurado não estar no bolso nem do Governo nem da oposição.
A audiência entre os dois está marcada para as 15h de terça-feira, no segundo dia do "Sentir Portugal" em Lisboa".
A iniciativa "Sentir Portugal" foi um compromisso assumido por Luís Montenegro no 40.º Congresso do PSD de passar uma semana por mês nos diferentes distritos do país, esta semana dedicada ao distrito de Lisboa e que começou hoje no concelho de Sintra e passará pelo de Oeiras, antes de regressar à capital.
Lula no Parlamento significa instrumentalizar o 25 de Abril, defende IL
O líder da Iniciativa Liberal (IL), Rui Rocha, considerou que a presença do Presidente do Brasil na Assembleia da República no dia 25 de Abril significa "uma instrumentalização" da data histórica, sublinhando que o partido só será representado pelo líder parlamentar.
Em declarações aos jornalistas em Braga, à margem de uma visita à Associação Empresarial do Minho, Rui Rocha sublinhou que a presença do líder parlamentar servirá para dar um sinal de respeito da IL ao povo brasileiro e em defesa da Ucrânia. "Nós não aceitamos, quando estamos com uma guerra na Europa, que o "lóbi putinista" de que Lula da Silva faz parte venha impor-se aos portugueses numa data tão importante como o 25 de Abril. Mas queremos dar um sinal de que não aceitamos essa imposição", referiu.
O líder parlamentar da IL estará na sessão em que participará Lula da Silva ostentando um símbolo da bandeira ucraniana, enquanto a restante bancada se retirará da sala, antecipou. "Nós estamos lá e enfrentamos Lula da Silva olhos nos olhos, pela liberdade e pela Ucrânia", disse Rui Rocha.
A presença no Parlamento do Presidente do Brasil (que visita Portugal entre 22 e 25 de Abril) tem estado envolta em polémica desde que, em Fevereiro, o ministro dos Negócios Estrangeiros, João Gomes Cravinho, falou explicitamente num discurso de Lula da Silva na sessão solene da Revolução de Abril na Assembleia da República, assinalando o seu carácter inédito, o que mereceu a oposição de PSD, IL e Chega.
O Parlamento acabou por decidir que, em vez de uma intervenção do Presidente do Brasil na sessão solene anual comemorativa, realizará, no mesmo dia, uma sessão de boas-vindas à parte durante a visita de Estado de Lula da Silva a Portugal.
No sábado, o Presidente brasileiro defendeu, no final de uma visita à China, que "os Estados Unidos devem parar de encorajar a guerra" na Ucrânia e "a União Europeia deve começar a falar de paz".
Desta forma, explicou aos jornalistas, a comunidade internacional poderá "convencer" o Presidente russo, Vladimir Putin, e o homólogo ucraniano, Volodymyr Zelensky, de que "a paz é do interesse de todo o mundo". "É necessária paciência" para falar com Putin e Zelensky, disse. "Mas, acima de tudo, temos de convencer os países que fornecem armas, que encorajam a guerra, a parar", acrescentou.
BE assegura que visita de Lula tem "outros critérios" além da guerra na Ucrânia
A coordenadora do BE também falou esta segunda-feira sobre a visita do presidente do Brasil. Catarina Martins adiantou que Lula da Silva tem "outros critérios" além da guerra na Ucrânia, mas defendeu que a União Europeia (UE) "precisa de insistir mais na paz", salientando a condenação da Rússia pelo conflito.
Questionada sobre se a visita de Lula a Portugal estaria comprometida pelas declarações que fez no sábado sobre a guerra na Ucrânia, a líder do bloco respondeu que "não é por esses critérios que se rege a política externa portuguesa".
"A vinda de Lula da Silva tem todo outro significado, tem a ver com o funcionamento democrático das próprias instituições no Brasil que é reposto, direitos humanos serem valorizados, até a própria entrega do prémio [Camões] a Chico Buarque que tinha ficado cancelada porque com Bolsonaro a cultura era desprezada, há uma reatar de relações normais entre Portugal e o Brasil democráticas", afirmou Catarina Martins, no Porto, à margem de uma manifestação de trabalhadores dos bares da CP.
Catarina Martins lembrou que, para o BE, o "início da conversa" sobre o conflito na Ucrânia é a "condenação da Rússia" mas que a UE "precisa de insistir mais na paz, de querer ter paz na Europa".
"Também é verdade que temos apelado a que a União Europeia se empenhe mais na paz, a União Europeia tem aceitado um papel subalterno dos Estados Unidos, não tem tido uma estratégia para a paz e nós não precisamos de condenar a Rússia para defender a paz e isso tem faltado, é preciso defender a paz", salientou.