Países da NATO com tropas na Ucrânia. “É evidente que contribui para a narrativa russa” contra o Ocidente
Documento secreto especifica as tropas de países da NATO destacadas para território ucraniano. Revelação poderá ser aproveitada pelo Kremlin na narrativa de que guerra opõe Rússia ao Ocidente.
Forças especiais de – pelo menos – cinco países da NATO foram destacadas para território ucraniano após a invasão russa, de acordo com um documento secreto conhecido na noite desta terça-feira. Esta é a mais recente de uma lista de revelações provenientes da maior fuga de informação de segredos norte-americanos desde o WikiLeaks, com fotografias de dezenas de documentos classificados partilhados online.
No documento em causa, noticiado em primeira mão pela BBC, é possível constatar que seguiram para a Ucrânia 50 elementos das forças especiais britânicas, 17 da Letónia, 15 da França, 14 dos Estados Unidos e um dos Países Baixos. As missões e localizações destes operacionais permanecem secretas, mas o documento pode ser aproveitado pelo Kremlin na retórica de que a guerra actual não está apenas a ser travada contra a Ucrânia, mas sim contra todo o Ocidente.
“É evidente que, dos muitos documentos, este elemento em particular acaba por contribuir para essa narrativa”, explica Pedro Sousa, professor de Relações Internacionais da Universidade Portucalense. Praticamente desde o início da invasão russa da Ucrânia iniciada em Fevereiro de 2022, a questão de uma presença militar de países da NATO no terreno tem sido alvo de especulação. Esta revelação não é, porém, uma surpresa, mas é necessário cuidado redobrado ao analisar esta informação.
“Não é absolutamente inesperado. Já seria mais ou menos previsível que existisse acção de forças militares especiais – pelo menos de alguns Estados – envolvidas em preparação ou recolha e análise de dados. Mas temos de agir sempre neste quadro da precaução, não sabemos se o que aqui está não é [divulgado] no sentido da desinformação”, comenta o docente.
Esta foi também uma das preocupações do Ministério da Defesa britânico, assim que o Reino Unido foi visado nos documentos norte-americanos. Através de um tweet, este ministério pediu cautela na análise das informações divulgadas, alegando que estas podem ter “o potencial de espalhar desinformação” e que existem muitas imprecisões no material que tem sido divulgado.
O ministro da Defesa da Ucrânia, Oleksii Reznikov, diz que o documento contém uma mistura de informação verdadeira e falsa, negando a presença de tropas da NATO na Ucrânia.
Em Washington, responsáveis do Pentágono confirmaram que muitas das fotografias partilhadas contêm informação classificada, alertando para a forte possibilidade de adulteração de alguns dos documentos. A par da autenticação dos documentos, foi aberta uma investigação criminal que pretende determinar a origem desta fuga.
Mas a quem serve a divulgação destes documentos? Para Pedro Sousa, a resposta não é fácil, visto existirem informações sensíveis para ambos os lados. Ainda assim, quem melhor conseguir aproveitar a incerteza criada pelas fugas será o grande beneficiado, algo que poderá ser percebido já nas próximas semanas.
“Já vimos coisas interessantes para a Rússia nestes leaks, mas também já vimos o contrário – a Sérvia querer ceder armas à Ucrânia, apesar de uma posição de neutralidade no conflito. Temos elementos favoráveis a ambas as partes. É difícil poder dizer à partida que a autoria ou o principal beneficiado será a Rússia. Só vamos saber quem será o beneficiado quando alguém conseguir tirar ganhos no terreno desta incerteza gerada [pelos leaks]”, concluiu.