Afinal, o que são “borboletas na barriga”? E porque as sentimos?

É uma resposta fisiológica (e primitiva), que retira o sangue do estômago e nos prepara para fugir ou lutar. Mas também a sentimos quando estamos apaixonados. A diferença é como a interpretamos.

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As famosas "borboletas na barriga" Henrique Lourenço

O primeiro encontro, o primeiro beijo, a sensação de estarmos apaixonados: sentimos borboletas a baterem asas no estômago — e gostamos delas. Mas as mesmas borboletas já não nos deixam tão felizes quando aparecem antes de um exame ou nos mantêm acordados na véspera da apresentação de um projecto importante. E, afinal, o que são?

É o nosso “cérebro primitivo” em acção, ou seja, é uma resposta fisiológica. “Mas se na pré-história a nossa preocupação era sobreviver, hoje em dia activamos esta resposta se alguém não nos responder a uma mensagem”, brinca a psicóloga Sara Crispim.

O que acontece biologicamente é a “activação de partes do sistema neurológico, de luta ou fuga”: “Antigamente seriam activadas pelo aparecimento de um leão, uma situação em que não podíamos estar a perder tempo com funções biológicas de descanso, como digerir alimentos”, começa por explicar a médica Nádia Sepúlveda. Quando esta mensagem é enviada, o nosso corpo dá “prioridade à circulação do sangue nos músculos, para podermos fugir do hipotético leão” e diminui a circulação no estômago, que “não é uma prioridade naquele momento, porque não nos ajuda a fugir”. É a ausência de sangue que provoca a sensação de borboletas.

Todas estas mensagens são transmitidas através do nervo vago, que faz parte do sistema nervoso autónomo — controla funções involuntárias, como a respiração e o ritmo cardíaco — e envia mensagens entre o cérebro e o sistema digestivo.

A paixão e as borboletas

Mas se até conseguimos ver alguma semelhança entre um exame e um leão, como é que uma resposta ao perigo acaba por se tornar numa resposta ao amor?

Quando estamos “nervosos ou apaixonados”, há também a “activação de hormonas e neurotransmissores que mexem com os movimentos digestivos”, aponta Nádia Sepúlveda. E a verdade é que o nosso organismo “não consegue distinguir as duas coisas”, os dois tipos de nervosismo (ou ansiedade). Temos de ser nós a interpretar estas situações, explica Sara Crispim. Se sinto esta sensação na barriga num momento de paixão, interpreto como uma “sensação positiva”; se for antes do exame de condução já a interpreto como desconfortável.

Quando vamos a um primeiro encontro, por exemplo, sentimos esta ansiedade por “não sabermos o que esperar, se vamos gostar da outra pessoa e se ela vai gostar de nós”. “O nosso organismo activa estas reacções fisiológicas, acreditando que são uma protecção. É a nossa ansiedade a tentar proteger-nos.”

Mas se muitas vezes esta sensação é romantizada — como se o amor bom fosse intenso e repleto de adrenalina —, é importante ter em conta que, ao fim de algum tempo, é normal e “expectável” que esta sensação (que, não te esqueças, é um sintoma de ansiedade) acabe por passar e dê lugar a um amor mais sereno. “Se não for confortável, devo ir à causa. Pensar porque é que a outra pessoa me faz sentir assim, como me sinto com ela”, aconselha a psicóloga.

Como controlar?

Ainda que esta sensação seja impossível de evitar, há algumas ferramentas que podem ajudar a controlá-la. A respiração diafragmática é “fundamental”: respirar não com o peito, mas com o diafragma, de forma “lenta, profunda e consciente”. Enquanto respiramos desta forma, pode ajudar fazer um exercício de distracção cognitiva: “Focarmo-nos, por exemplo, numa cor, e contarmos quantos objectos ao nosso redor são dessa cor. Isso faz com que retiremos a atenção da experiência interna e nos foquemos na externa”, explica Sara Crispim.

E Nádia Sepúlveda recorda que, quando estas borboletas batem asas durante um curto período de tempo e acabam por passar, sem afectar a nossa qualidade de vida, trata-se de uma “ansiedade normal” — a que nos permite termos medo, e por isso sobreviver. É que sem ela, os nossos antepassados tinham mesmo sido comidos pelo leão.

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