Partidos abrem a porta a consagrar direito à alimentação na Constituição

PSD mostrou reservas sobre redacção do artigo, IL diz que é só “uma coisa bonita” aprovada.

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O direito à alimentação como princípio constitucional suscitou a simpatia dos partidos Filipa Fernandez

O PS e o Livre propuseram consagrar o direito à alimentação na Constituição e esse princípio parece ter reunido o consenso dos demais partidos. O PSD manifestou dúvidas sobre a redacção do preceito, mas não fechou a porta à inscrição do direito humano na lei fundamental. O único partido que se opôs foi a Iniciativa Liberal (IL).

Na reunião da comissão eventual de revisão constitucional desta quarta-feira, o PS defendeu um aditamento ao artigo 64º (sobre saúde) que pretende assegurar que “todos têm direito a uma alimentação acessível, de qualidade, saudável e sustentável” e que incumbe ao Estado, “em articulação com as autarquias locais, promover as políticas públicas necessárias à sua efectivação”.

O socialista Pedro Delgado Alves sustentou que “a alimentação adquiriu uma centralidade nas políticas públicas nos últimos anos e deve ter tutela constitucional”. Trata-se de “um tema de actualização” da Constituição embora “as pessoas já se alimentassem em 1976”, gracejou.

Já a proposta do deputado único do Livre determina que “todos têm direito ao acesso regular à alimentação e nutrição adequadas” e detalha as tarefas do Estado para garantir este direito através de medidas que “combatam a fome e a segurança alimentar”, que garantam a “não discriminação no acesso à alimentação e que “a produção agrícola, industrial e o sistema comercial” assegurem “o acesso a produtos alimentares de qualidade, com respeito pelo equilíbrio ecológico dos ecossistemas”.

Rui Tavares admitiu que o articulado proposto pode ser “extenso” e mostrou estar disponível para um entendimento no sentido de tornar a redacção mais próxima da que é proposta pelo PS, o que foi aceite por Pedro Delgado Alves.

A social-democrata Emília Cerqueira mostrou reservas sobre a “densificação” dos preceitos. “Como é que o Estado pode garantir alimentação acessível?”, questionou, apontando também dificuldades em “garantir a produção agrícola” como refere o Livre. No entanto, a deputada não fechou a porta a incluir o direito à alimentação na Lei fundamental: “Parece-nos importante que esteja na Constituição como direito humano que é”.

"Uma coisa bonita"

À esquerda do PS, BE e PAN mostraram acompanhar as propostas, mas o deputado comunista Duarte Alves mostrou dúvidas sobre a referência às autarquias locais na proposta do PS por entender que a função cabe ao Estado como um todo. A posição mereceu a simpatia de Pedro Delgado Alves.

Neste consenso alargado em torno da consagração do direito à alimentação na Constituição, só a IL mostrou mais resistência, usando o critério que tem adoptado no processo de revisão constitucional: ter uma Lei fundamental o mais enxuta possível. “Tenho dificuldade com estes dois artigos. Quem pode negar o direito à alimentação?” disse João Cotrim Figueiredo, depois de por lapso se ter referido a habitação.

O deputado considerou que os preceitos “sinalizam virtudes mas depois são vazios”, ou seja, que “dificilmente terão aplicação constitucional plena”, restando apenas “uma coisa bonita que fica aprovada”.

O bloquista Pedro Filipe Soares disse compreender que a questão parece ser de “direito abstracto” mas lembrou que nenhuma das propostas refere que “tem de ser alimentação gratuita”.

Na sequência das ausências dos deputados únicos na reunião da passada quarta-feira e dos pedidos de adiamentos de discussão de artigos, que causou atrasos nos trabalhos, os coordenadores decidiram esta quarta-feira que haverá mais uma reunião por mês, à sexta-feira à tarde, caso não se consiga concluir o debate de cinco artigos por reunião. Foi também imposto um prazo de 48 horas prévio à reunião para pedir o adiamento de um artigo e a discussão dos artigos passará a ser agrupada por temas conexos sempre que possível.

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