Governo, um ano de barafunda
Na minoria, António Costa disfarçava o seu conformismo com o seu equilíbrio precário. Agora, esse biombo caiu.
O inspector-geral de Finanças anunciou esta quarta-feira, na Assembleia da República, a salvação do ministro Fernando Medina do pântano do caso TAP, dizendo que os membros do Governo que sabiam do pagamento milionário e ilegal a Alexandra Reis já abandonaram as suas funções. O PS e o Governo aplaudem a inocência do ministro das Finanças que, pouco a pouco, se vai transformando no ás de António Costa. Mas o que sobra de tudo isto é uma vitória de Pirro.
E é assim porque, se o PS está aliviado, os portugueses têm razões para continuarem preocupados com as revelações do caso. A confirmação do desconhecimento feita pelo inspector-geral de Finanças é uma prova de que a tutela do Governo sobre a gestão financeira da TAP pura e simplesmente não existiu. Medina fica com razões reforçadas para pedir que acabem de vez com as suspeitas sobre a sua actuação; mas o Governo não se salva da suspeita da negligência pela forma como conduziu o dossier crítico da transportadora onde vai injectar 3,2 mil milhões de euros.
Este caso tem valor próprio e ganha ainda mais importância por confirmar uma tendência. O Governo acumulou, desde a revelação do caso TAP, uma longa lista de exemplos que fazem recear impreparação, desmazelo, superficialidade ou incompetência. Tanto como “cansado”, para usar a expressão mais suave do Presidente, o Governo parece ser incapaz vezes de mais.
No pacote de habitação, não estudou a lição; na história dos supermercados, agiu sem reflexão nem desígnio estratégico (ou não correria de imediato para garantir acordos com os operadores); em leis críticas como a das stock options, inverte a noção do risco e da recompensa e faz um diploma que os empreendedores recusam; em detalhes de políticas como a que pretende estimular o emprego jovem qualificado, reserva os seus incentivos às empresas dispostas a despender 1330 euros por posto de trabalho, como se, nesses casos, as empresas precisassem de ajudas; na Justiça, há atrasos incompreensíveis na produção de leis.
No primeiro ano de Governo, a estabilidade formal continua a valer por si — há-de ter a sua influência nos bons resultados da economia, por exemplo. Mas, em tudo o resto, sobra a ideia comprovada de que este elenco tem demasiados ministros desorientados, sem perfil nem classe para gerirem um país em crise. No PRR, na economia ou na descentralização, a governação derrapa vezes de mais.
Na minoria, António Costa disfarçava o seu conformismo com o seu equilíbrio precário. Agora, esse biombo caiu. Ou ele ousa uma remodelação profunda, ou condena-se e condena o país a arrastar-se sem glória nos próximos anos.