Hogwarts Legacy leva fãs de Harry Potter ao mundo do feiticeiro. Trolls abundam
O PÚBLICO visitou Hogwarts Legacy para perceber o burburinho sobre o jogo que já bateu recordes. Apesar de (demasiados) interlúdios com trolls, o jogo leva fãs ao mundo de Potter.
Aulas de feitiçaria, criaturas mágicas, uma viagem ao passado, muitos clichés e nostalgia são os ingredientes-chave de Hogwarts Legacy, o mais recente videojogo de aventura inspirado no mundo de fantasia de Harry Potter. A aventura digital, lançada no começo de Fevereiro, é a primeira versão oficial da saga para consolas e computador em formato RPG (sigla inglesa para roleplaying game), em que os jogadores criam as suas próprias personagens e definem parte da narrativa consoante as suas escolhas. Para quem cresceu com as histórias de Harry Potter, é a oportunidade de explorar a escola de feitiçaria de Hogwarts na primeira pessoa, como um aluno. Mas no século XIX, bem antes de Harry Potter, ter nascido.
A ausência da personagem titular não reduz a acção. O jogador é atacado por um dragão, cai de uma carruagem voadora, é teletransportado para uma ilha misteriosa e luta contra estátuas medievais antes de o primeiro dia de aulas arrancar (o “tutorial” é – literalmente – exaustivo). O capítulo seguinte, porém, é dedicado a navegar o castelo de Hogwarts para encontrar as diferentes salas de aula, comprar uma varinha mágica e conhecer outros alunos. São actividades que qualquer fã de Harry Potter sonhou fazer em criança.
"Esforçámo-nos por criar um jogo que captasse o maior número possível de fantasias de ser uma bruxa ou um feiticeiro em Hogwarts e no mundo [de Harry Potter]”, explicou ao PÚBLICO Kelly Murphy, que lidera a equipa de design do jogo, numa conversa algumas semanas após o lançamento.
Em termos de números, Hogwarts Legacy foi um sucesso imediato. Nas primeiras duas semanas, o videojogo vendeu mais de 12 milhões de unidades e gerou 850 milhões de dólares (cerca de 780 milhões de euros) em receitas, tornando-se o maior lançamento da Warner Bros. Games de sempre. Não seria de estranhar, com mais de 600 milhões de cópias dos livros originais vendidos em todo o mundo desde a década de 1990. Só que o videojogo também veio acompanhado de protestos online, críticas e tentativas de boicote. Não pelo conteúdo do jogo, mas devido aos comentários da criadora do universo de Harry Potter, J.K. Rowling, sobre a comunidade trans e a nova lei de identidade de género na Escócia que visa facilitar o processo de mudança de género (Rowling é contra).
Apesar de Rowling não estar envolvida com o jogo, recebe dinheiro pelos direitos de autor (royalties) da marca Harry Potter. Grande parte das notícias iniciais sobre o jogo focava-se mais no papel de Rowling na saga de Harry Potter e menos no novo jogo. Ainda assim, os boicotes surtiram pouco efeito. Muitos fãs ignoram as opiniões da autora e só querem visitar o mundo ficcional com que cresceram a imaginar.
O jogo cumpre esse requisito. O castelo e o terreno em redor são bastante detalhados, com escadas e retratos que se mexem, e é possível visitar ambientes nunca mostrados nos filmes. Por exemplo, a sala de estar dos Hufflepuff (uma das quatro casas de Hogwarts), que faz lembrar uma enorme estufa cheia de plantas, e as cozinhas da escola. Também não é preciso ser um ás dos videojogos para explorar o universo, com o Modo de História a permitir ao jogador navegar a aventura sem batalhas muito complexas.
Ao longo dos níveis, Hogwarts Legacy esforça-se por mostrar que o universo de Harry Potter é inclusivo e diverso. Conhecem-se alunos e professores de todos os cantos do mundo e fala-se de escolas de feitiçaria que podem ser palco de outros jogos, como Uagadou nas montanhas da Nigéria.
Ao mesmo tempo, e sem a narrativa de Rowling, Hogwarts Legacy empurra o jogador numa aventura clássica de videojogo de acção e fantasia em que o protagonista tem de descobrir a origem dos “seus poderes misteriosos” e lidar com uma revolta de Goblins. Passa-se muito tempo a lutar contra criaturas mágicas e trolls em masmorras e grutas genéricas. Por vezes, é difícil perceber o que é que se está a jogar.
O que distingue o jogo de outros RPG de fantasia são os pequenos desafios e elementos do dia-a-dia de um aluno de Hogwarts. Desde roubar uma chave para entrar na secção “restrita” da biblioteca durante a noite, a ajudar uma aluna a encontrar páginas do diário que desataram a voar. E talvez a forma mais divertida de derrotar com trolls (criaturas pouco perspicazes, em geral) seja convencê-los a seguir o jogador enquanto este voa numa vassoura por cima de um penhasco.
O jogo varia ligeiramente consoante a casa de Hogwarts que se escolhe. Os alunos de Hufflepuff, por exemplo, são os únicos com acesso a uma aventura extra que leva o jogador à prisão de Azkaban. “Em raros casos, um aluno de Slytherin pode ver o Basilisco [um dos monstros da saga de Harry Potter] na sala comunal dos alunos de Slytherin”, sugere Kelly Murphy.
Inicialmente, a ideia era deixar o jogador explorar o castelo de Hogwarts livremente, ignorando a narrativa principal (a tal sobre os poderes misteriosos do jogador), mas tornou-se muito complicado. “Era muito aberto para jogadores casuais e não permitia o ritmo que queríamos do Mundo de Feitiçaria”, justifica a designer Kelly Murphy. “Então, acabámos por condensar a estrutura a uma narrativa principal — em vez de várias — com algumas escolhas e muitas missões secundárias e diferentes níveis de dificuldade.”
Na teoria, o jogador pode criar o seu próprio percurso — com decisões mais altruístas ou mais egoístas. Na prática, as escolhas influenciam pouco (ou quase nada) a narrativa. Mesmo assim, e apesar de vários interlúdios para derrotar trolls em grutas, o jogo consegue transportar os fãs de Harry Potter para um universo mágico por várias horas. Para muitos fãs, será o suficiente.
O PÚBLICO experimentou a versão para PC de Hogwarts Legacy (a partir de 60 euros). O jogo também está disponível para PS4 e XBox Series X/S. Hogwarts Legacy chega à PS4 e à Xbox One em Maio, e à Nintendo Switch, em Julho.