Ex-Presidente de Taiwan em visita inédita à China “para melhorar ambiente no estreito”
Visita de Ma Ying-jeou, que presidiu ao período de maior abertura entre Taiwan e a China desde o fim da guerra civil, segue-se ao corte de relações das Honduras com o Governo taiwanês.
O antigo Presidente taiwanês Ma Ying-jeou, um político muito menos hostil às ameaças de reunificação por parte da China do que a actual líder do território, Tsai Ing-wen, chegou nesta segunda-feira a Xangai para uma visita inédita e que está a causar um grande desconforto no Governo de Taiwan.
A visita de Ma à China é a primeira de um ex-Presidente taiwanês desde o fim da guerra civil, em 1949, e começa apenas um dia depois de as Honduras terem cortado relações diplomáticas com Taiwan e reconhecido a soberania de Pequim sobre a ilha.
"Esperamos que a visita de Ma, um antigo comandante supremo de Taiwan, esteja em linha com os interesses nacionais e que decorra por forma a não ferir os sentimentos dos taiwaneses", disse a porta-voz da Presidência de Taiwan, Lin Yu-chan, numa conferência de imprensa.
"Ele deve tentar transmitir os valores da democracia liberal taiwanesa e reiterar que a cooperação entre os dois lados do estreito deve prosseguir de uma forma igual e digna, especialmente depois da invasão da Ucrânia pela Rússia e da contínua expansão das operações militares [da China] no estreito de Taiwan e na região do Indo-Pacífico."
Ma, um antigo líder do partido nacionalista Kuomintang, foi responsável pelo período de maior abertura nas relações entre Taiwan e a China desde o fim da guerra civil, que terminou com a vitória do Partido Comunista Chinês e a fuga para a ilha dos nacionalistas liderados por Chiang Kai-shek.
Presidente taiwanês entre 2008 e 2016, Ma lançou o tráfego aéreo directo entre os dois lados do estreito, abriu o território a turistas chineses e facilitou os investimentos dos empresários de Taiwan na China.
A visita ao continente chinês, durante a qual não estão previstos encontros com altas figuras do Governo de Pequim, foi apresentada por Ma como uma viagem pessoal – para visitar as origens dos seus antepassados – e como uma oportunidade para facilitar um encontro entre jovens estudantes dos dois lados do estreito.
"Levo comigo estudantes universitários de Taiwan, na esperança de melhorar o actual ambiente entre os dois lados através do entusiasmo e das interacções dos jovens, para que a paz possa ser alcançada o mais rapidamente possível", disse Ma aos jornalistas, à partida para Xangai, citado pela agência Reuters.
Ofensiva diplomática
Desde a eleição de Tsai Ing-wen, em 2016, com a promessa de maior resistência aos avanços de Pequim no sentido de uma reunificação dos dois territórios, o número de Estados que reconhecem a soberania de Taipé sobre Taiwan caiu de 22 para 13 – incluindo Belize, Guatemala e Paraguai, nas Américas; o Vaticano, na Europa; Eswatini, em África; e um conjunto de ilhas nas Caraíbas e no Pacífico Sul.
E se a eleição presidencial no Paraguai, a 30 de Abril, for vencida pelo candidato Efraín Alegre, o conjunto de países com relações diplomáticas oficiais com Taiwan ficará reduzido a 12.
Separados por apenas 24 horas, os dois acontecimentos – a visita de Ma e o corte de relações pelas Honduras – são vistos como parte de uma ofensiva diplomática de Pequim para responder ao esperado encontro entre a Presidente taiwanesa e o líder da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, Kevin McCarthy. De visita à América Central, Tsai tem uma paragem agendada nos EUA, onde deverá ser recebida por McCarthy.
O encontro entre os dois líderes, a confirmar-se, será alvo das críticas do Governo chinês, que vai olhar para o acontecimento como mais um exemplo de quebra, por parte dos Estados Unidos, da aceitação do princípio "uma só China". Por seu lado, Washington afirma que nunca aceitou a soberania de Pequim sobre Taiwan e apenas reconheceu a posição oficial das autoridades chinesas de que existe uma só China – com o entendimento de que uma eventual reunificação só seria possível num processo pacífico.
A visita de Tsai aos EUA terá sido uma forma de o Governo taiwanês adiar, para já, uma deslocação do líder da Câmara dos Representantes norte-americana a Taiwan – um gesto que poderia motivar um novo período de grande hostilidade por parte da China no estreito que separa os dois territórios, à semelhança do que aconteceu após a visita da anterior líder da Câmara dos Representantes dos EUA, Nancy Pelosi, em Agosto de 2022.
"A visita de Pelosi trouxe muitos problemas a Taiwan e não proporcionou nada de concreto aos taiwaneses", disse William Stanton, o director do Instituto Americano de Taiwan (a embaixada não oficial dos EUA no território) entre 2009 e 2012, numa entrevista ao jornal Japan Times.
"A mudança de local pode ser vista como uma iniciativa de Taiwan para evitar a repetição dos perigosos exercícios militares e os lançamentos de mísseis nas proximidades da ilha que se seguiram à visita de Pelosi."