Lagarde garante que o BCE está atento ao fluxo de financiamento das PME

Presidente do BCE insiste que os bancos na Europa estão capitalizados. Em todo o caso, diz, a autoridade monetária do euro tem armas para agir, “se necessário”.

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A líder do BCE, Christine Lagarde, reconhece que a subida das taxas de juro foi “muito repentina” Reuters/JOHANNA GERON

A viver num tempo em que o mundo “está a mudar mais rapidamente do que qualquer um de nós poderia ter imaginado”, a presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, justificou esta quarta-feira a subida “muito repentina” das taxas de juro nos últimos meses com a necessidade de refrear a pressão inflacionista e insistiu que a autoridade monetária vai continuar a agir para “trazer a inflação de volta” ao objectivo dos 2%.

Mas, ao mesmo tempo em que o banco central está a procurar induzir restrições na procura, estará igualmente atento às condições em que as pequenas e médias empresas (PME) estão a aceder ao crédito no mercado.

A discursar numa conferência em Frankfurt nesta quarta-feira, poucos dias depois de as autoridades suíças terem apoiado uma intervenção no gigante Credit Suisse, Lagarde repetiu que o sector bancário europeu é resiliente e que, em todo o caso, a autoridade monetária dispõe “de muitos instrumentos para fornecer apoio de liquidez ao sistema financeiro”, caso se revele necessário.

Lagarde já tinha deixado essa garantia por escrito no domingo, dia em que o Credit Suisse, também com actividade em países da área do euro, foi comprado pelo maior banco suíço, o UBS. Agora repetiu-a de viva voz em Frankfurt com estas palavras: “Embora o sector bancário europeu seja resiliente, e tenha fortes posições de capital e liquidez, tendo em conta a recente volatilidade dos mercados financeiros, estamos prontos a agir e a fornecer apoio de liquidez ao sistema financeiro, se necessário, e a preservar a transmissão regular da política monetária.”

O foco do BCE continua a ser a resposta às “pressões inflacionistas”, preocupação que outro membro do conselho da instituição, o presidente do banco central alemão, Joachim Nagel, evidenciou, ao afirmar ao Financial Times que o BCE deve insistir numa subida dos custos do financiamento. “Se quisermos dominar esta inflação teimosa, teremos de ser ainda mais teimosos”, defendeu o líder do Bundesbank, em declarações divulgadas também nesta quarta-feira.

Lagarde promete que o BCE prestará “muita atenção” a uma série de indicadores sobre a disponibilidade e o fluxo do crédito, bem como aos dados sobre o custo dos financiamentos, como o acesso ao financiamento bancário por parte das PME.

Para que as pressões inflacionistas diminuam, diz, é importante que a política monetária do BCE “funcione de forma robusta na direcção restritiva” e esse processo “só agora começa a ter efeito”. A primeira etapa no processo de transmissão monetária na zona euro “já está a ter um impacto substancial”, entende a líder do banco central, sustentando que “o custo dos empréstimos está a aumentar acentuadamente e a dinâmica dos empréstimos parece estar a contrair-se mais rapidamente” do que aconteceu em ciclos anteriores de aumento de taxas. “O crescimento do crédito às empresas abrandou acentuadamente desde o terceiro trimestre do ano passado.”

Processo “ordenado”

A última decisão de política do BCE foi conhecida na semana passada, já depois da queda do banco norte-americano Silicon Valley Bank e quando já se perspectivava a compra do segundo maior banco suíço pelo seu concorrente directo, movimentos que têm levado a uma perda das acções no sector financeiro. A 16 de Março, o BCE aumentou as taxas de juro de referência em 0,5 pontos percentuais, pondo a taxa de depósito, a principal referência para os custos de financiamento, nos 3%.

“Embora a existência de condições de crédito mais restritivas faça parte do mecanismo de funcionamento da nossa política de restrição para aliviar as pressões excessivas sobre os preços e trazer a inflação de volta ao objectivo, iremos assegurar que todo o processo será ordenado”, assegurou Lagarde nesta quarta-feira.

Em Lisboa, a presidente do Conselho das Finanças Públicas (CFP), Nazaré da Costa Cabral, lembrou na terça-feira a experiência da crise financeira internacional, em que uma instabilidade que começou por ser bancária acabou por “se transmutar numa crise de finanças públicas” nalguns países da região do euro. E alertou para a necessidade de Portugal manter um controlo das finanças públicas, dada a dimensão da sua dívida pública, que ainda é superior a 110% do Produto Interno Bruto (PIB).

“A nossa situação financeira e orçamental — pese embora o esforço que tem sido feito e a trajectória de redução que temos apresentado para a nossa dívida pública — não é ainda completamente tranquilizadora. Devemos estar sempre muito focados nisto: a nossa dívida ainda não nos tira completamente do radar dos mercados financeiros e, concretamente, do mercado de dívida”, afirmou Costa Cabral, ao apresentar as projecções económicas do CFP de 2023 a 2027.

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