O Governo não pode demitir a CEO da TAP por despacho?
Em entrevista ao PÚBLICO/RTP, Marcelo Rebelo de Sousa destacou que a presidente executiva da TAP tem de ser destituída em assembleia geral e não directamente pelo Executivo.
A frase
“Quem pode fazer cessar as funções de chairman e de CEO [da TAP] é a assembleia geral, não é um despacho governamental”.
Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, no dia 9 de Março em entrevista à RTP e ao PÚBLICO
O contexto
Na conferência de imprensa de dia 6 de Março, no âmbito da apresentação do relatório elaborado pela Inspecção-geral de Finanças sobre a indemnização de 500 mil euros paga pela TAP à ex-administradora Alexandra Reis, o ministro das Finanças afirmou que, devido às irregularidades detectadas, ia exonerar por justa causa a presidente da comissão executiva (CEO), Christine Ourmières-Widener, e o presidente do conselho de administração (chairman), Manuel Beja. No caso de Ourmières-Widener, a gestora já está a preparar a sua defesa legal, mas ambos estão ainda em funções.
Os factos
Dois dias depois da conferência de imprensa, fonte oficial do Ministério das Finanças afirmou que Medina tinha determinado à Direcção-Geral do Tesouro e Finanças (accionista da TAP em nome do Estado) que “prepare e promova o procedimento de demissão do presidente do conselho de administração e da presidente da comissão executiva por justa causa, cumprindo o previsto na lei (garantir a audiência prévia dos visados e apresentar a fundamentação do procedimento)”.
Do lado da TAP, a empresa afirmou no dia 9 que os dois gestores estavam em funções, “nos termos da lei, cumprindo as responsabilidades inerentes aos respectivos cargos”.
No contrato de sociedade da TAP (artigo 11), refere-se que “os accionistas deliberam em assembleia geral sobre todas as matérias às quais a lei ou o contrato de sociedade lhes confiram competência”, designadamente “eleger e destituir” os membros de órgãos sociais como o conselho de administração, que abrange os executivos e os não executivos.
No artigo 25.º do estatuto do gestor público (a TAP voltou a ser uma empresa estatal no final de 2020) está estabelecido que a demissão do gestor público “compete ao órgão de eleição ou nomeação, requer audiência prévia do gestor e é devidamente fundamentada”.
Conforme afirma Jane Kirkby, da sociedade de advogados Antas da Cunha Ecija & Associados, "nos termos conjugados do estatuto do gestor público e dos estatutos da TAP, S.A., é à assembleia geral da empresa pública que compete a eleição e a destituição do respectivo conselho de administração, sendo imperativo, no caso de demissão prevista no artigo 25.º do estatuto do gestor público, a audição prévia do gestor”.
“Assim”, sintetiza, “a cessação de funções de Christine Ourmières-Widener e Manuel Beja está dependente de deliberação accionista (que, note-se, é o Estado) em assembleia geral”.
Em suma
Apesar de a decisão de afastar os dois gestores da TAP já estar tomada pelo Governo, esta tem de seguir os procedimentos formais, que culminam com a destituição da actual presidente executiva e do presidente do conselho de administração em assembleia geral da TAP, a qual servirá também para formalizar a entrada do novo presidente, Luís Rodrigues, já anunciado pelo Governo como sucessor. Essa assembleia geral ainda não foi convocada pela DGTF.