“Desde há uns anos para cá — há sete, para ser exacta —, estou numa relação séria com plataformas de encontros”, avisa Rita Sepúlveda nas primeiras páginas do recentemente lançado Swipe, Match, Date. Faz sentido pôr as cartas na mesa logo no início, já que mais tarde nos vai aconselhar a fazer o mesmo — não só de forma introspectiva, mas também numa lógica de ética dentro das aplicações de encontros.
O livro, escrito a pensar em “todas as pessoas que tenham dúvidas, incertezas ou estejam curiosas” sobre plataformas de encontros, é uma ramificação da contínua investigação que Rita tem vindo a desenvolver desde o mestrado, ainda que os estudos que realizou durante o doutoramento em Ciências da Comunicação tenham sido os mais determinantes.
Dos primórdios dos encontros “arranjados” (sabias que Agustina Bessa-Luís e o marido se conheceram através de um anúncio no jornal?) ao nostálgico mIRC, a investigadora começa por traçar uma breve cronologia que mostra que as plataformas de encontros não surgiram do nada. A partir daí, avança para revelações, motivações, segurança, até ao marketing pessoal: afinal, fazer um perfil no Tinder, Hinge, Bumble, ou qualquer outra semelhante, deve contar com um bocadinho de esforço (já lá vamos).
Para escrever o livro, ouviu relatos de pessoas de “diferentes idades, orientações sexuais, origens e vivências, utilizadores ou ex-utilizadores” de apps de encontros. E se, em 2017, quando começou a investigação, demorava “muito tempo” a encontrar participantes para estudos relacionados com plataformas de encontros, agora, seis anos mais tarde, nota que “esse tempo é mais reduzido”.
Desbloquear conversa... e não só
Ajuda-a também, no estudo que desenvolve actualmente (é investigadora de pós-doutoramento na Universidade Nova de Lisboa, com um projecto intitulado Status: In a relationship with an app), o DatingLab que criou no ano passado, no CIES-Iscte, que junta investigadores e utilizadores ou ex-utilizadores destas apps. “O objectivo é pensar em métodos para investigar esta temática”, explica.
Até porque ainda há muito para pensar. Apesar de já nos sabermos movimentar nas plataformas de encontros, ainda “temos de entender” melhor “o espaço onde estamos”. “Uma plataforma de dating não é uma rede social, tem contextos e contornos distintos. Pode haver mil e uma motivações para me inscrever numa destas plataformas, mas sabemos que há duas que se destacam: sexo e relacionamentos. Tendo isso em conta, devo-me apresentar de uma forma ou outra, mas sendo sempre autêntica e honesta.” E, claro, assumir o compromisso. Como?
“Parece que há algum receio em falar com o outro, quando, em teoria, estamos lá para conhecer pessoas”, aponta a investigadora. Muitas das pessoas com quem falou partilharam com ela que “preferiam não partilhar fotos de determinada maneira” ou “não escrever nada na biografia” — mas “essa informação faz falta”, afiança Rita Sepúlveda. “Se podemos pôr uma média de seis fotografias, não vamos pôr só uma em que estamos misteriosamente de costas.”
No quinto capítulo do livro, a autora ajuda a construir um perfil não só mais apelativo, mas também mais verdadeiro. “É fundamental que se aceite como é”, afiança. Ou seja, se alguém mede 1,55 metros, é melhor que não diga que mede 1,80 — ou vai acabar por ter uma conversa embaraçosa quando se encontrar pela primeira vez com um “match”.
A autora aconselha, por isso, a escolher fotografias recentes, do rosto, em que estamos a sorrir e a olhar directamente para a câmara. A evitar: selfies em casa de banho ou elevadores, fotos de grupo ou com pormenores pessoais, como a matrícula do carro ou o número da porta de casa.
Mais ainda, é importante saber criar (e desbloquear) conversa. E isso pode ser feito logo a partir da biografia. Em vez de escrevermos, simplesmente, “gosto de cinema”, a investigadora sugere algo mais interactivo: “És tu que vai ter coragem de ver comigo os nove filmes do Star Wars e como extra os dois 'spin-offs'? Eu ofereço as pipocas.”
O livro termina com motivos para deixar as aplicações de encontros. Este é, na verdade, um dos actuais temas de estudo da investigadora. As conclusões que já adianta no livro dizem-nos que há utilizadores que, simplesmente, perceberam que aplicações de encontros não são para eles. Outros sentiram que estavam a perder tempo ou cumpriram o aclamado propósito de utilização e encontraram alguém. De qualquer forma, tranquiliza Rita Sepúlveda, é legítimo. E voltar também.