PCP e Chega querem que Igreja tome “medidas preventivas” para afastar presumíveis abusadores
Comunistas consideram que conclusões da Conferência Episcopal “não correspondem à gravidade da situação”. Chega defende que a Igreja encontre forma de suspender preventivamente padres suspeitos.
O PCP defendeu, esta segunda-feira, que é possível que a Igreja Católica tome “medidas preventivas e administrativas” que permitam “retirar os presumíveis abusadores” da vida pública, até “conclusões judiciais e canónicas”. Na mesma linha, o Chega espera que a Igreja possa estudar formas que permitam suspender preventivamente padres suspeitos da prática de abusos.
Numa nota enviada à imprensa, o partido considera que “face à dimensão do problema e às expectativas existentes, as conclusões conhecidas da Conferência Episcopal sobre os trabalhos da Comissão Independente não correspondem à gravidade da situação”.
“Tal como muitos católicos e mesmo padres têm dito, com respeito pela sua independência, é possível a Igreja Católica, no seu funcionamento, tomar medidas preventivas e administrativas que, até conclusões judiciais e canónicas, permitam retirar os presumíveis abusadores da vida pública e do inevitável alarme social que isso motivaria”, defendem.
Isto, salientam, “independentemente das decisões judiciais que a situação imponha”.
A Comissão Independente para o estudo dos abusos sexuais de crianças na Igreja Católica validou 512 testemunhos, apontando, por extrapolação, para pelo menos 4815 vítimas. Vinte e cinco casos foram enviados ao Ministério Público, que abriu 15 inquéritos, dos quais nove foram arquivados.
Estes testemunhos referem-se a casos ocorridos entre 1950 e 2022, período abrangido pelo trabalho da comissão.
A comissão entregou à Conferência Episcopal Portuguesa uma lista de alegados abusadores, alguns no activo, tendo esta remetido para as dioceses a decisão de afastamento de padres suspeitos de abusos e rejeitado atribuir indemnizações às vítimas.
No domingo, o cardeal-patriarca de Lisboa, Manuel Clemente, afastou a suspensão de alegados padres abusadores de menores sem que haja "factos comprovados, sujeitos a contraditório" e um processo canónico feito pela Santa Sé.
O psiquiatra Daniel Sampaio negou esta segunda-feira que a Igreja tenha recebido uma lista com os nomes dos padres abusadores sem ter mais informações sobre os casos denunciados, descrevendo a postura dos bispos como um “atrasar do problema”.
“Não é verdade que é só uma lista de nomes”, afirmou o membro da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa, esclarecendo: “A lista foi obtida a partir das denúncias de vítimas – em que a vítima X diz que foi abusada pelo padre Y – e da investigação resultante do Grupo de Investigação Histórica junto dos arquivos. E a lista que foi entregue resulta da junção destas duas”, afirmou, em declarações à Lusa.
Ventura defende que sociedade "exige mais"
O líder do Chega, André Ventura, apelou a que a Igreja estude a suspensão preventiva de padres, leigos ou dirigentes de estruturas eclesiais com indícios fortes da autoria dos crimes de abuso sexual de menores.
Em declarações aos jornalistas na sede nacional do Chega, André Ventura saudou a conferência de imprensa da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) na sexta-feira, considerando "importante que a Igreja assuma publicamente que deu e está a dar o tratamento devido" ao relatório da Comissão Independente.
No entanto, apesar de saudar a decisão de a Igreja Católica pedir perdão às vítimas durante a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), que se realiza em Lisboa, no Verão, André Ventura considerou que a "Igreja falhou um pouco" por não perceber que a sociedade actual "exige mais de um relatório tão substancial" como o da Comissão Independente.
"O que se esperava era um bocadinho mais do que simplesmente uma assunção de responsabilidades e um pedido de desculpas e aí, não usaria o termo desrespeitoso, mas acho que ficou-se aquém de onde se deveria ter ido, e poder-se-ia ter ido muito mais longe", defendeu.
Nesse sentido, André Ventura apelou a que a Igreja estude a "aplicação de alguma suspensão preventiva a clérigos ou leigos ou dirigentes de estruturas eclesiais ou religiosos que estejam (...) com indícios fortes" de terem abusado de menores.
Apesar de ressalvar que não é "especialista em direito canónico", Ventura considerou que essa suspensão "seria recomendável" para que os "católicos não sentissem que os padres, os bispos ou os leigos abusadores continuam no activo, eventualmente até perto de crianças ou outras vítimas".
O líder do Chega abordou ainda as declarações do cardeal-patriarca de Lisboa, Manuel Clemente – que descartou a suspensão de padres sem "factos comprovados, sujeitos a contraditório" – referindo que esse afastamento preventivo permitiria que a pessoa se defendesse e apresentasse provas, apesar de estar temporariamente sem exercer funções.
"Acho que isso merecia ser estudado verdadeiramente e ser aplicado com alguma celeridade, sempre, na nossa perspectiva, antes da vinda do Papa a Portugal em Agosto, até para não manchar a visita que o santo padre fará a Portugal por altura da JMJ", disse.
Por outro lado, Ventura instou também a Igreja a "criar alguma fórmula de compensação" das vítimas, argumentando que, em muitos casos, os abusos tiveram repercussões "na sua situação pessoal, material, financeira e social". "Isso parecer-nos-ia muito, muito importante e parece-nos que foram as duas maiores falhas da conferência de imprensa", defendeu.
IL diz que Igreja foi demasiado cautelosa
O líder nacional da Iniciativa Liberal (IL) manifestou-se também preocupado com a mais recente intervenção da Conferência Episcopal a propósito dos alegados abusos sexuais na Igreja, apelando a que haja "bom senso" para evitar novos casos. "Se há suspeitas, se há indícios, então não vamos continuar a permitir que estas situações possam acontecer", insistiu o dirigente liberal, em declarações aos jornalistas, no âmbito de uma visita aos Açores, afirmando que a Igreja Católica tem uma "abordagem demasiado cautelosa" sobre esta matéria.
Para Rui Rocha, a Conferência Episcopal "parece não estar a aproveitar" o trabalho e a oportunidade que a Comissão Independente criou, com o levantamento de denúncias sobre alegados casos de abusos sexuais na Igreja, ao longo de vários anos. "Analisando aquilo que foi a intervenção da Conferência Episcopal, fico preocupado, porque a Comissão Independente abriu, de facto, uma oportunidade para que tudo isto possa ser diferente, no futuro, e que as vítimas possam ter acesso à justiça que merecem", realçou.
Para o líder nacional dos liberais, impunha-se que a Igreja tomasse medidas preventivas no sentido de evitar que novos casos de abusos sexuais pudessem ocorrer, mas quando confrontado sobre se os padres acusados deviam ser afastados do culto, Rui Rocha fala apenas em "bom senso". "A cautela aqui, não é adiar decisões. A cautela aqui é prevenir novas situações, e por isso, importa uma solução de bom senso", rematou Rui Rocha, dizendo apenas que, na sua opinião, a Conferência Episcopal não estará a aproveitar a oportunidade criada pela Comissão Independente.