Estudante russa arrisca dez anos de prisão por partilhas nas redes sociais

Olesya Krivtsova está desde Janeiro em prisão domiciliária e foi colocada na lista do governo russo de terroristas e extremistas devido a publicações antiguerra nas redes sociais.

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Olesya Krivtsova é acusada de justificação de terrorismo e desacreditação das forças armadas russas Natalya Krivtsova

Olesya Krivtsova, uma estudante universitária na cidade de Arkhangelsk, no norte da Rússia, enfrenta uma acusação de justificação de terrorismo e de desacreditar as forças armadas russas que a pode colocar até dez anos numa colónia penal. Tudo porque partilhou nas redes sociais publicações contra a guerra na Ucrânia.

O caso de Krivtsova, de 20 anos, começa a 26 Dezembro, quando foi detida na sequência de buscas policiais à casa que partilha com o marido, Ilya. Durante os trabalhos das autoridades, a estudante estava fora do apartamento, acompanhada de um polícia que a intimidou com uma marreta, segundo contou a mãe ao site russo independente CurrentTime.

A forma da ameaça não foi um acaso. Semanas antes, o grupo Wagner tinha divulgado o vídeo de uma execução, com vários golpes de marreta, de um mercenário russo que fugiu da guerra. Mais tarde, no dia das buscas, um elemento do centro antiextremismo do Ministério do Interior disse a Krivtsova e ao marido que a visita fora uma “saudação” do grupo paramilitar russo.

Dois dias depois da detenção, a jovem apareceu perante um juiz, que decidiu que ficaria em prisão domiciliária a aguardar julgamento. As acusações terão por base denúncias feitas por colegas universitários, desagradados com publicações antiguerra de Krivtsova no Instagram e na rede social russa VKontakte.

As publicações incluíam recomendações dirigidas a soldados russos a combater na Ucrânia que pudessem querer render-se, fotografias de civis ucranianos mortos pelas tropas de Moscovo ou uma “story” relativa ao ataque ucraniano à ponte da Crimeia. Para as autoridades, Krivtsova é reincidente: em Abril, tinha sido multada por colar cartazes pacifistas que "desacreditavam as Forças Armadas russas".

Os estudantes da Universidade Federal do Norte, em Arkhangelsk, terão discutido num grupo de Telegram o melhor meio para denunciar o comportamento pacifista e antiguerra de Krivtsova – se à polícia, se aos serviços de segurança russos.

Os colegas acusavam a estudante de escrever “publicações provocatórias de carácter derrotista e extremista” que não têm espaço em tempo de guerra, devendo por isso ser “cortadas pela raiz”. Em excertos da conversa a que a BBC acedeu, os denunciantes sugeriram começar por “desacreditar” Krivtsova e, caso esta não percebesse a mensagem, denunciá-la. “A denúncia é o dever de um patriota”, referiu um dos envolvidos na conversa.

Além da prisão domiciliária, a jovem foi adicionada à lista do governo russo de indivíduos e grupos terroristas e extremistas. E está ainda proibida de utilizar Internet ou falar ao telemóvel.

Quando se encontrava há uma semana em prisão domiciliária, foi novamente detida pela polícia, que pediu prisão preventiva devido ao perigo de fuga: as autoridades alegaram que tinham sido comprados dois bilhetes de comboio, só de ida, para zonas fronteiriças da Rússia em nome da detida.

Krivtsova negou a compra, argumentando que não tem um passaporte interno válido e, por isso, não consegue adquirir bilhetes. A defesa pediu ainda registos que comprovassem a compra e como tinha sido feita, mas o pedido foi negado. Ainda assim, o tribunal rejeitou o pedido de prisão preventiva, mas acabou por acrescentar à prisão domiciliária a restrição de utilização de Internet.

Esta segunda-feira, Olesya Krivtsova voltou ao tribunal para tentar levantar a prisão domiciliária enquanto espera pelo julgamento que a pode levar a passar até dez anos numa colónia penal. Voltou a casa com a mesma pulseira electrónica presa à volta do tornozelo direito – na perna esquerda tem tatuada uma aranha com o rosto de Putin e a frase orwelliana "Big Brother is watching you".

A jovem diz ainda estar a tentar aceitar a possibilidade de ter de passar vários anos atrás das grades. Mas não deixa de criticar o regime russo em declarações à BBC. “O estado não tem estômago para debate, democracia ou liberdade”, refere. “Mas não podem pôr todos na prisão. A dada altura vão ficar sem celas”.

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