Milhares de professores protestaram no Porto. “O gigante acordou. A classe estava adormecida”
A última greve distrital contou com taxa de adesão de 98%, segundo a Fenprof. Nogueira diz que recurso às greves continua em cima da mesa. Fonte da PSP estima que tenham estado cinco mil no protesto.
“Nem os serviços mínimos, essa vergonha que o Governo decretou, vieram alterar a adesão dos professores à greve.” As palavras de Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, nos altifalantes, ecoaram na Avenida dos Aliados, no Porto, esta quarta-feira, na manifestação de docentes. Foi a última da ronda de greves distritais de professores iniciada a 16 de Janeiro. A PSP estima que tenham estado no protesto cerca de cinco mil docentes, indicou fonte daquela polícia ao PÚBLICO.
Por entre as bandeiras nacionais, de sindicatos e de associações, pediram, a plenos pulmões, “respeito” por parte do Governo.
Aos jornalistas, Mário Nogueira mostrou a satisfação com a "extraordinária" adesão à greve. “Contabilizamos à volta de 98% dos professores em greve. Praticamente não há um aluno com aulas neste distrito”, garantiu. Para o secretário-geral da Fenprof, a falta de respostas por parte do governo contribuiu para que a adesão às sucessivas greves fosse aumentando: “Começamos na ordem dos 90%. À medida que se foram realizando reuniões no ministério, a ausência de respostas aos problemas dos professores levou sempre a que a greve tivesse uma adesão maior.”
Na multidão, um grupo de professoras do agrupamento de Pedrouços partilhava uma camisola única. Nas cabeças usavam bandeiras de Portugal. Ana Freire, colega do grupo e professora desde 2008 explicou o simbolismo da indumentária peculiar.
“A camisola é a união. Estamos todos a vestir a mesma camisola, a da escola pública”, afirmou. Para a professora de 37 anos, tem-se assistido a um verdadeiro despertar de uma classe profissional. “Felizmente, o gigante acordou. A classe docente estava completamente adormecida”, desabafou.
Um pouco atrás, Mónica Silva, de 42 anos, professora há 18, fez-se acompanhar pelos filhos. Eles também são uma das razões para ter estado presente. “Eles [os filhos] são a minha contribuição para o mundo e eu quero que eles tenham o melhor possível. Que façam deste país o melhor sítio possível”, afirmou. Ao lado, Alice, de 13 anos, sente que é “muito importante” estar na greve com a mãe. “Não se formam novas pessoas sem uma boa base. A educação é essencial para que este país cresça”, disse.
“A função da escola não é [ser] um depósito de crianças”
Isabel Pinheiro é professora há mais de 26 anos e, actualmente, é professora em Paredes. Acredita que “a cada ano que passa é mais desmotivador” ser professor. “Hoje em dia, só é professor mesmo quem gosta e tem dedicação. É mesmo por paixão”, desabafou.
Sobre as queixas dos pais que pediram que o tempo de greve fosse compensado com aulas extraordinárias, Isabel pensa que os pais têm de perceber o lado dos professores. “Um professor motivado é completamente diferente de um professor desmotivado”, considera.
Ana Paula Brito, apesar de ser natural de Viseu e exercer em Viatodos - freguesia do concelho de Barcelos - marcou presença nos Aliados. Para a professora, os serviços mínimos servem apenas de distracção para os pais: “Isto dos serviços mínimos é só mais uma manobra de diversão para o governo agradar de certa forma os pais e enganar a sociedade.” Ana Paula defendeu ainda que os pais devem perceber que o objectivo da escola é “transmitir conhecimento”. “Os pais têm de perceber que a função da escola não é [ser] um depósito de crianças. É dar conhecimento aos alunos”, defendeu.
Quinta ronda de negociações foi adiada
Apesar de estar prevista uma nova ronda de negociações entre o Ministério da Educação e os sindicatos de professores para o final desta semana, as reuniões foram adiadas para 15 e 17 de Fevereiro.
Mário Nogueira condena a decisão: “É pena que o ministério não tenha marcado a reunião para sexta ou sábado. Mas é sinal de que não deve ter grande coisa para apresentar aos professores.” No entanto, assegurou a resiliência da classe profissional em defender os seus interesses. “Nunca desistiremos de negociar, nunca deixaremos de lá estar”, assegurou aos jornalistas.
No final da última greve distrital, o secretário-geral da Fenprof confirmou que o fim do ciclo não significa que não se vão fazer mais greves: “Sim, estão mais greves em cima da mesa. Estão mais manifestações em cima da mesa.”
Entre os cânticos por respeito, dignidade e valorização da carreira, os professores também asseguraram que não vão baixar os braços. Mónica Silva disse ver “uma união muito grande entre os professores” e acredita “que a maioria quer continuar”. Já Ana Paula sublinhou que a resistência vai continuar: “Vamos a todas, não vamos parar.”