Lilo, uma cadela pastor alemão de 4 anos, foi encontrada a vaguear sozinha pelas ruas de Chattanooga, no estado norte-americano do Tennessee. Trazia apenas uma trela e uma coleira – com um bilhete escrito à mão que emociona qualquer um.
"Por favor, mantém o meu nome. Chamo-me Lilo. Por favor, ama-me. A minha mãe não pode cuidar de mim e está sem-abrigo com dois filhos. Ela deu o seu melhor, mas não consegue que a ajudem. [Deixar-me] custou-lhe muito", lia-se na nota.
"Ela gosta muito de mim. Sou uma boa cadela e gosto de ser amada. Por favor, não me maltrates", acrescentava.
Lilo foi encontrada por um morador no dia 20 de Janeiro e levada para o McKamey Animal Center. Quando chegou, "estava realmente assustada", afirma Lauren Mann, a directora do departamento de comunicação do abrigo.
"Todos chorámos ao ler a mensagem. Vemos muitas coisas tristes todos os dias, mas isto atingiu-nos realmente a todos. A última frase é angustiante", declarou.
Os funcionários da associação sentiram que a mulher amava verdadeiramente a cadela e conseguiram perceber que não tinha outra opção senão deixá-la. Além disto, também podiam sentir que Lilo sentia desesperadamente a falta da família.
"Decidimos em conjunto que íamos fazer tudo o que pudéssemos para os reunir e para os ajudar", disse Mann, que trabalha na causa animal há quase seis anos e raramente viu um dono escrever um bilhete destes. "Sem dúvida que se destacou", afirmou.
Os funcionários decidiram partilhar esta história nas redes sociais, na esperança de que a dona a pudesse ver. "Uma nota para a tutora da Lilo: Estamos aqui para si", dizia o título da publicação no Facebook. No TikTok também partilharam um vídeo.
"Lamentamos muito que tenha tido de tomar a decisão de a deixar para trás. Sabemos que muitas pessoas estão a lutar para conseguirem cuidar dos seus animais de estimação neste momento. Sabemos como deve ser difícil abdicar de um animal que ama porque não lhe pode dar os cuidados de que precisa. Nós compreendemos", escreveram.
"Queremos que saiba que a cadela está bem e que tomaremos muito bem conta dela. Será amada pelos nossos funcionários e voluntários, manteremos o nome e prometemos-lhe que faremos o nosso melhor para lhe encontrar um novo lar maravilhoso. Mas se estiver a ler isto, estamos à sua espera no abrigo para a reclamar. Vamos ajudá-la no que for preciso para que possa cuidar dela com o melhor que conseguirmos fazer."
A associação garantiu ainda à dona de Lilo que compreendia o que tinha feito, prometeu não julgar e disse que ia ajudar da forma que conseguisse, uma vez que tem recursos e está ligada a agências que ajudam sem-abrigo.
O reencontro
Bastou um dia para que um amigo de um amigo visse a publicação e a fizesse chegar à tutora – que o abrigo optou por não identificar para manter a privacidade. No dia 25 de Janeiro, a mulher ligou para o abrigo e falou com Mann. Mais tarde, nesse mesmo dia foi até à associação para ver o animal.
"Não havia ninguém que não estivesse a chorar", recordou Mann, que já tinha feito perguntas específicas à mulher para ter a certeza que era, de facto, a dona da cadela. "Se um cão pudesse chorar como um humano, juro que a Lilo estava a chorar", acrescentou.
A cadela – que Mann descreveu como "muito fofa", "muito, muito doce" e "bem comportada" – ficou extasiada por estar reunida com a dona, que, segundo a responsável, também estava eufórica.
"Tivemos uma conversa privada, e ela estava muito agradecida”, revelou, acrescentado que lhe disse que não estava sozinha. “Há tantas pessoas por aí que estão sem-abrigo neste momento. É uma coisa horrível de ter de lidar, mas há recursos e pessoas que se preocupam."
Neste momento, a dona de Lilo e os dois filhos pequenos estão alojados num espaço que não permite a presença de animais. No entanto, os funcionários do abrigo estão a trabalhar com o Centro de Justiça Familiar, assim como com um abrigo local pet friendly, para que a família seja rapidamente realojada. Entretanto, a cadela vai ficar no abrigo o tempo que for necessário, até que possa ir viver com a dona outra vez.
"Estamos a fazer tudo o que podemos para acelerar o processo e reuni-los de novo assim que pudermos", diz Mann, que trabalhou anteriormente num centro de violência doméstica e agressão sexual para mulheres. A história da tutora de Lilo "pesou-lhe no coração”.
O pessoal do abrigo partilhou uma actualização nas redes sociais, tendo em conta que muitas pessoas ficaram interessadas nesta história e esperavam um final feliz. "Estamos a trabalhar activamente com a família para lhes arranjarmos um sítio seguro, abrigo e recursos para ficarem juntos e enfrentarem o problema de terem ficado sem casa", lê-se na mensagem. "Estamos gratos a todos os que têm defendido a família e partilharam a nossa publicação."
Mann acrescenta que deixar uma carta com um cão abandonado é um acontecimento raro, mas a história de Lilo, infelizmente, não é. "Neste último ano, acolhemos quase cinco mil animais, e quase todos eles têm uma história como esta", afirmou. "Ela teve sorte porque tinha uma nota presa na coleira", acrescentou.
A inflação está a fazer com que pessoas de todo o país já não tenham meios para cuidar dos animais de estimação. O problema é agravado pelo facto de os americanos terem adoptado em números nunca antes vistos no pico da pandemia.
De acordo com dados do grupo comercial da Associação Americana de Produtos para Animais de Estimação, 35% dos donos estão preocupados com os custos de os terem tendo em conta a economia actual; destes, metade afirma que pode ter de os entregar. "São muitos os factores que o transformaram numa grande crise nacional. Temos alguns cães que têm estado à espera de um adoptante há mais de um ano", disse Mann.
Além da inflação, os serviços veterinários têm-se tornado cada vez mais caros e existe ainda uma falta de alojamento acessível e pet friendly.
"Estamos todos a fazer o que podemos para o ultrapassar todos os dias", declarou, para acrescentar que o abrigo está actualmente acima da capacidade e que a principal prioridade é encontrar lares para os animais e, nos casos em que for possível, reuni-los com os donos.
O abrigo tem programas para tornar a posse de animais mais acessível, incluindo uma despensa comunitária de alimentos, clínicas que dão vacinas e colocam microchips, serviços de esterilização de baixo custo e recursos de realojamento. A McKamey Animal Center também faz parcerias com outras organizações locais de animais para oferecer apoio adicional.
"Estamos extremamente dedicados a fazer o que podemos para manter os animais de estimação e as pessoas juntas. Existe definitivamente um problema de cães vadios na nossa área, tal como provavelmente existe em todo o país neste momento", afirmou a responsável pelo abrigo.
Mann e os colegas esperam que a história de Lilo inspire pessoas a contactar associações de animais locais e as apoiem – através da adopção, acolhimento temporário, doação de mantimentos ou voluntariado.
A mulher relembra ainda que embora algumas pessoas possam ser rápidas a julgar a dona de Lilo por ter abandonado a cadela e talvez acreditem que não merece ter o animal de volta, situações como esta merecem empatia. "Compaixão e bondade são o que as pessoas e os animais precisam neste momento mais do que nunca", destacou.
Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post