Uma das últimas mensagens que recebeste no Instagram foi um vídeo de patinhos a usar flores como chapéus ou a flutuar num lavatório cheio de água? Talvez tenha sido de um cão cockapoo demasiado entusiasmado a dançar no sofá com o dono? Ou então de um husky a fazer birra porque não podia entrar dentro de casa?
Se partilhar conteúdos engraçados de animais é a tua linguagem amorosa, não estás sozinho – fazes parte de um grande fenómeno cultural chamado cute economy (algo como "economia de conteúdos fofos", numa tradução literal)
Este conceito não é apenas uma rede de conteúdos adoráveis em que as pessoas participam através da criação, partilha e circulação, mas também um negócio multimilionário devido à capacidade dos criadores rentabilizarem o conteúdo que divulgam.
O que é a cute economy?
O investigador de comunicação social James Meese define-a como a criação e circulação de conteúdos gerados pelos utilizadores sobre vários organismos (animais, bebés, plantas, objectos, etc.) que são vistos como fofos.
Apesar de os investigadores e jornalistas terem publicado informações sobre este fenómeno das redes, partilhar fotografias queridas de animais não é novidade. Há mais de 100 anos, o fotógrafo Harry Whittier Frees criou postais inovadores de animais antropomórficos.
A nossa investigação foca-se no segmento específico, contudo considerável, da cute economy que faz circular o conteúdo sobre animais de estimação. Descobrimos que a fofura deste tema é representada através dos seguintes padrões: animais patetas ou tontos, pequenos ou jovens, conteúdo entre espécies, animais infantis, com tamanhos e proporções extremas (muito pequenos ou muito grandes) e aparência e comportamentos pouco habituais que achamos que são semelhantes aos dos humanos.
Apesar de algumas contas de animais terem mais seguidores do que as de políticos e celebridades para se tornarem virais – como é o caso do cão Jiff Pom com 9,9 milhões, da gata Nala com 4,3 milhões, do cão Doug the Pug com 3,9 milhões e da raposa Juniper com três milhões – há outro estímulo para a fazer circular conteúdos engraçados de animais: os memes ou contas que publicam conteúdos reutilizados com curadoria, como a empresa WeRateDogs, de Matt Nelson, que partilha fotografias e legendas divertidas sobre cães.
Os criadores e as famílias inter-espécies
Tal como as mães influencers criam contas nas redes sociais para os bebés, quem tem animais de estimação também tem vindo fazer o mesmo para mostrar os seus companheiros.
No entanto, tendo em conta que as pessoas têm vindo a humanizar os animais mesmo antes do surgimento da Internet, a presença deles nas redes sociais é uma espécie de brincadeira falsa. Quem gere contas como estas humaniza estes bebés com pêlo através do vestuário, acessórios ou adereços. Da mesma forma, também o fazem através dos textos, dando-lhes uma voz humana.
O criador do conteúdo vai, inclusive, acrescentar o vocabulário específico da espécie. No caso dos gatos, isto inclui o catspeak, meowlogisms ou o discurso infantil como o lolspeak – a gíria da Internet para memes destes felinos.
Ainda assim, o nível de fofura tem um limite. Muitos dos participantes que entrevistamos para a nossa investigação explicaram que, embora o antropomorfismo possa ser divertido, se parecer forçado ou pouco autêntico torna-se o oposto.
De qualquer forma, muitos criadores de conteúdo seguem esta tendência e certificam-se de que o conteúdo que publicam não se degrada ao ponto de se tornar estranho. Uma das nossas entrevistadas (que gere a conta da tartaruga de estimação) expressou desconforto e incerteza em relação à inclusão de legendas, uma vez que acha que é mais difícil encontrar "o equilíbrio entre ser estranho e divertido".
O que é que ver e partilhar estes conteúdos provoca?
Cultiva as relações: Este tipo de conteúdo é partilhado porque mostra uma experiência relacionável para quem vê. Além disto, também mostra à pessoa que gostamos dela e é um sinal de proximidade numa relação.
Uma das nossas entrevistadas sabe que a enteada adora cavalos e envia-lhe este tipo de conteúdos. Descobrimos que este gesto indica que o remetente sabe verdadeiramente o que aquece o coração da pessoa que recebe.
Sonhar com o futuro: Ver conteúdos divertidos também pode ser aspiracional. Por exemplo, uma das nossas entrevistadas quer adoptar um cão quando se mudar para um edifício pet friendly. Contudo, enquanto esse momento não chega, segue contas nas redes sociais que retratam o estilo de vida que quer ter, como é o caso da página The Golden Ratio.
Ligação entre espécies: O conteúdo fofo satisfaz quem o está a ver, porque permite que as pessoas interajam com animais à distância, sem precisarem de despender de quaisquer recursos para cuidarem deles. Uma das pessoas que falou connosco, e que assume adorar lontras, vê conteúdos destes animais, mas não quer ter uma nem gostava de saber como as domesticar.
Defender uma causa: Este tipo de conteúdo também pode servir como um meio de mudança. Quem cria ou assiste a estes vídeos pode partilhá-los para sensibilizar para uma causa ou mudar a opinião de outros.
Uma das nossas entrevistadas administra a conta do pato domesticado, onde mostra que o animal é amigável, carinhoso e tem uma personalidade única muito semelhante à de qualquer animal doméstico tradicional. Através desta conta, a dona pretende ensinar aos seguidores os problemas do especismo (discriminação da espécie) e defende uma convivência cruelty free com todos os animais.
Os benefícios destes conteúdos
A investigação concluiu que ver vídeos fofos de animais é benéfico para a nossa saúde mental.
Quer sejas criador, apreciador ou ambos, este tipo de conteúdo ajuda a iniciar conversas e facilita relações: quebra o gelo quando as pessoas não têm temas para debater, ou quando querem que os outros saibam que se preocupam com os animais.
Apesar de as pessoas se reunirem com menos frequência do que acontecia antes da pandemia, temos sido capazes de partilhar o nosso amor à distância através destes pequenos exemplos de carinho.
A sociedade tem a sorte de a tecnologia permitir que as pessoas reforcem as suas relações. No entanto, como não é tudo um mar de rosas, também existe um lado negro, por isso tem cuidado com a partilha de conteúdos de animais que possam ter sido explorados.
Exclusivo P3/The Conversation
Ghalia Shamayleh está a fazer o doutoramento em Marketing na Universidade Concordia, no Canadá
Zeynep Arsel é professora catedrática da disciplina de Consumo, Mercados e Sociedade na Universidade Concordia