Há cada vez mais água nas albufeiras, mas situação no Sul ainda preocupa

Com apenas duas semanas de precipitação intensa, o país viu as suas reservas de água superarem os 80%. No entanto, a região sul do país continua a debater-se com escassez.

Foto
A barragem da Bravura é uma das que continuam com pouca água Miguel Manso/ARQUIVO

O boletim semanal publicado pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA) continua a registar aumento nos volumes de água armazenados nas albufeiras públicas que monitoriza. Os valores relativos a 26 de Dezembro, registam 10.303 hectómetros cúbicos (hm3) armazenados (81%). No espaço de uma semana, cerca de 83 hm3 reforçaram o volume de armazenamento em 50 albufeiras, e apenas uma dezena registou descida na sua cota, debitada, na maior parte dos casos, para a produção de energia.

Nada fazia prever níveis de precipitação atmosférica tão concentrados num espaço de apenas duas semanas. O país foi fustigado por enxurradas de água que provocaram o caos de norte a sul do país.

Assim, no último dia do mês de Dezembro de 2022 e comparativamente ao último dia do mês anterior, a APA refere que se verificou um “aumento do volume armazenado em dez bacias hidrográficas e uma descida em duas”. Os armazenamentos por bacia hidrográfica apresentam valores “superiores às médias de armazenamento de Dezembro (de 1990/91 a 2021/22), excepto para as bacias do Sado, Mira, Ribeiras do Algarve e Arade.

Prevalece a crónica diferenciação entre o norte e o sul do país. Na bacia do Sado, as albufeiras das barragens de Campilhas (9%) e Monte da Rocha (10%), são as únicas a par da albufeira da Bravura (11%), no Barlavento algarvio, a permanecer no vermelho, no conjunto das 82 albufeiras referidas no boletim da APA.

A linha divisória situa-se no rio Tejo. Para norte, 36 das 54 albufeiras que estão referenciadas apresentam uma reserva de água entre os 80 e os 103%.

Na região sul do país, apenas três têm um volume de água superior a 80%: Alqueva (85,5%), Monte Novo (90%) e Abrilongo (101%). O pesadelo da escassez de água continua a pairar sobre 14 das 28 albufeiras ali instaladas onde prevalecem níveis de armazenamento inferiores a 50%.

Sul com escassez de água

As bacias do Sado, Mira, Arade, Sotavento e Barlavento algarvio são as mais problemáticas na escassez de recursos hídricos e onde persistem as situações mais críticas a antecipar mais um ano de persistente falta de água, sobretudo para a agricultura. Alqueva irá, eventualmente, suprir a falta de água nas albufeiras de Vale de Gaio, Pego do Altar, Campilhas e Alto Sado, Roxo, Odivelas, Morgavel e Fonte Serne.

No Norte do país e na bacia do Cávado, a albufeira do Alto Rabagão (que tem apresentado a mais baixa reserva de água na região) poderá ter beneficiado da intensa precipitação atmosférica que varreu a região transmontana, como aconteceu com a barragem de Alijó que apresentava há duas semanas 16% na sua cota de armazenamento e que nas últimas semanas encheu completamente. “Este ano, pelo menos para o Verão, não deveremos ter problemas de água”, salientou o vice-presidente da Câmara de Alijó, Vítor Ferreira à agência Lusa.

Também a região de Lisboa pode confiar na garantia de abastecimento a partir da barragem de Castelo do Bode que neste momento está prestes a atingir o seu enchimento pleno (1095 hm3).

O panorama na Bacia do Tejo já está longe do cenário deplorável na redução do seu caudal que tem alimentado a contestação das organizações ambientalistas. Em 14 das 19 albufeiras instaladas na sua esmagadora maioria na rede de afluentes, o nível de armazenamento está entre os 80 e os 103%.

E, em Espanha, as suas 52 albufeiras apresentam um volume global de armazenamento de 62,5%. Nas barragens de Alcântara e de Cedillo, directamente implicadas no escoamento de água para Portugal, a cota de armazenamento supera os 80%.

Na bacia hidrográfica do rio Douro as diferenças de recursos hídricos nos dois países são mais acentuadas: 53,9% em território espanhol e 92% em Portugal, contraste que se mantém no Guadiana e com uma diferença muito substancial: 32,7% na bacia hidrográfica espanhola e 83,7% em território português, dada a enorme capacidade de encaixe da albufeira de Alqueva.

No dia 1 de Dezembro, a cota de Alqueva estava nos 2584hm3. No espaço de um mês, o volume de água chegou 3560 hm3 (85.8%) e continuará a subir nos próximos dias. Às 18h desta terça-feira em Espanha (17h em Portugal) estavam a ser debitados 92m3/s.

Calor pode reduzir reservas de água

Apesar da abundância de recursos hídricos, observam-se factores que contribuirão para a redução das reservas de água, sobretudo as elevadas temperaturas térmicas que contribuem para a evapotranspiração nos espelhos de água das albufeiras. Alqueva é o exemplo que mais se evidencia.

Os dados divulgados pela Empresa de Desenvolvimento e Infra-estruturas do Alqueva (EDIA) comprovam o peso da evapotranspiração na redução da cota das albufeiras. Portugal recebeu de Espanha em 2021 através do açude Badajoz 819 milhões de metros cúbicos de água.

Por força da evapotranspiração perdeu 208 milhões de metros cúbicos. A precipitação atmosférica devolveu 90 milhões de metros cúbicos, mas as perdas de água em Alqueva podem chegar aos 300hm3, dependendo, acima de tudo, da temperatura ambiente e da direcção dos ventos.

O Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) na informação que divulgou relativamente a Novembro, concluiu que este mês foi considerado o “mais quente na Europa e o quinto mais quente em Portugal continental” em relação à temperatura do ar, e chuvoso em relação à precipitação.

O IPMA refere que, de acordo com o índice PDSI, verifica-se que no final de Novembro “apenas a região Sul se manteve em situação de seca meteorológica, sendo de realçar o interior do Baixo Alentejo e o sotavento Algarvio, ainda em seca severa”. Aguarda-se a análise relativa ao mês de Dezembro.