Zelensky visita a frente Leste, onde Putin admite situação “extremamente complicada”

Ao 300º dia de guerra, a batalha mais feroz decorre em Bakhmut, onde Zelensky distribuiu medalhas e elogiou os soldados por estarem a “vergar o Exército russo e os mercenários”.

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Volodymyr Zelensky visitou Bakhmut e entregou medalhas aos soldados ucranianos EPA/UKRAINIAN PRESIDENTIAL PRESS SERVICE HANDOUT

O Presidente da Ucrânia voltou a fazer uma visita surpresa a uma cidade próxima da linha da frente, desta vez percorrendo as centenas de quilómetros que separam Kiev de Bakhmut, no Leste do país, que é actualmente um dos principais pontos territoriais em disputa entre russos e ucranianos.

Volodymyr Zelensky já por várias vezes esteve em locais próximos das batalhas, mas, ao contrário das visitas a Kherson ou Izium, que tinham sido recentemente recuperadas pelas forças ucranianas, a deslocação desta terça-feira foi a uma zona onde decorre há meses uma batalha feroz e sangrenta. “Desde Maio que os ocupantes têm tentado vergar a nossa Bakhmut, mas o tempo passa e Bakhmut está a vergar não só o Exército russo como os mercenários russos que vêm substituir o famigerado Exército”, disse o governante, segundo um vídeo divulgado pelo seu gabinete. A visita só foi tornada pública depois de Zelensky deixar a cidade.

Bakhmut não é de particular importância estratégica para o desenrolar da guerra, mas a sua conquista permitiria à Rússia continuar a avançar na região de Donetsk, em direcção a Sloviansk e Kramatorsk, duas cidades bem mais relevantes. O problema, para a Rússia, é que desde o Verão que tem recorrido a constantes ataques de artilharia e infantaria sem que isso esteja a render muito.

“Para Putin eles são apenas carne e Bakhmut é uma trituradora de carne”, disse ao Financial Times um combatente ucraniano, Kostiantin, depois de uma tentativa de avanço inimigo que terminou com um grande número de soldados russos mortos ou feridos. O combate junto à cidade faz-se com recurso a trincheiras de parte a parte e os especialistas militares comparam-no às brutais e sangrentas batalhas da Primeira Guerra Mundial.

De acordo com Kostiantin, esta é uma cena que se repete com frequência: a tropa russa lança rockets sobre as posições ucranianas, depois lança-se a correr pelo terreno que a separa do inimigo. Os ucranianos respondem com fogo de metralhadora e recomeça tudo outra vez. De ambos os lados há baixas pesadas, embora os números reais sejam desconhecidos.

A visita de Zelensky a Bakhmut decorreu – ou pelo menos foi divulgada publicamente – no 300.º dia desde o início da invasão russa. Na cidade, o Presidente da Ucrânia foi fotografado a distribuir medalhas aos soldados e citado a desejar-lhes que tenham “luz interior”. Nos arredores encontravam-se, como acontece há semanas, membros do grupo Wagner, cujo chefe Yevgeny ​Prigozhin​ disse num vídeo do Telegram: “Caro Vladimir Alexandrovich [Zelensky], se ainda não saiu de Bakhmut, estou pronto para nos encontrarmos.”

Guterres duvida que haja paz em breve

Em Moscovo também foi dia de distribuição de medalhas por parte de Vladimir Putin. Numa cerimónia realizada no Kremlin, o Presidente russo condecorou os líderes separatistas do Donbass, os políticos nomeados pela Rússia para as regiões ilegalmente anexadas e vários propagandistas e comentadores pró-guerra.

“Quando um país ou até mesmo uma pessoa se desenvolve, avança, tem sempre de ultrapassar algumas dificuldades no seu caminho”, disse Putin, citado pelo The New York Times, no que parece ser ao mesmo tempo uma admissão dos problemas na frente da guerra e uma garantia de que ela não vai parar.

Antes disso, num discurso dirigido às forças de segurança cuja transcrição foi publicada pelo Kremlin, o chefe de Estado russo reconhecera que “a situação nas [autoproclamadas] repúblicas populares de Donetsk e de Lugansk e nas regiões de Kherson e Zaporijjia é extremamente complicada”. A admissão é incomum e parece destinada tanto a audiências internas como externas. “As pessoas que vivem lá, os cidadãos russos contam convosco e com a vossa protecção”, afirmou, deixando subentendido que não abdicará dos territórios ilegalmente anexados. “Pelo nosso lado, continuaremos a fornecer às novas unidades equipamentos e armas modernas, assim como pessoal experiente.”

Com todas estas palavras, actos e omissões, o secretário-geral da ONU mostra-se descrente num fim rápido para o conflito. “Não estou optimista em relação à possibilidade de negociações de paz eficazes num futuro imediato”, disse António Guterres numa conferência de imprensa de balanço do ano. “Penso que ainda teremos de esperar pelo momento em que negociações sérias de paz sejam possíveis.”

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