Defensor de Mariupol recupera nos EUA após cirurgia paga por clube de futebol
Mykhailo Dianov foi um dos últimos soldados a deixar a fábrica Azovstal, em Mariupol. Após meses detido pelas tropas russas, regressou irreconhecível, e a Ucrânia uniu-se para o ajudar.
Por duas vezes, o retrato de Mykhailo Dianov correu o mundo: primeiro, a partir das trincheiras improvisadas da fábrica Azovstal, em Mariupol, de braço ao peito, enquanto com a outra mão fazia um V, em sinal de vitória. Meses depois, quando foi libertado numa troca de prisioneiros entre Kiev e Moscovo, surgiu irreconhecível, visivelmente debilitado.
A história de Dianov chegou a um terceiro capítulo e parece, ainda assim, ter um final feliz. O soldado ucraniano de 42 anos, ferido durante a defesa da cidade portuária de Mariupol, actualmente ocupada pela Rússia, viajou para os Estados Unidos à boleia do clube de futebol Shakhtar Donetsk, onde está a recuperar de uma cirurgia ao ombro.
Dianov foi operado esta terça-feira, no estado norte-americano do Missouri, intervenção que o clube diz ter sido "um sucesso", numa publicação acompanhada por fotografias do militar com o equipamento do clube. Além da viagem, o Shakhtar Donetsk, uma das equipas de futebol mais populares da Ucrânia, cobriu os custos da cirurgia e restantes despesas médicas do combatente da Azovstal.
“O braço direito de Mykhailo ficará totalmente recuperado depois da reabilitação”, anunciou o Shakthar, que em 2014 deixou de jogar no estádio do Donbass e se mudou para Kiev. “Dianov regressará à Ucrânia nos próximos dias.”
Após a rendição da Ucrânia em Mariupol, em Maio, os últimos soldados entrincheirados na fábrica siderúrgica Azovstal foram detidos pelas forças russas. Desse grupo de resistentes fazia parte Dianov, que acabaria por ser libertado a 21 de Setembro, numa troca de 215 combatentes ucranianos pelo milionário Viktor Medvedchuk, amigo próximo de Putin.
Em comparação ao retrato tirado pelo militar e fotógrafo Dmytro Kozatsky, Dianov regressou irreconhecível, muito magro e com uma fractura num braço, evidente nas fotografias, agravada pela falta de cuidados médicos.
“Está numa condição física muito complicada, mas psicologicamente é muito forte. Está muito feliz por estar de volta. Diz: ‘Ando e respiro ar puro e livre’”, garantiu, à data, a sua irmã, Olena Lavrushko, ao jornal ucraniano Ukrainska Pravda.
Antes de uma operação ao braço, a prioridade foi recuperar peso, já que terá perdido quase um terço da massa corporal — cerca de 30 quilos — durante os meses de cativeiro, explicou.
“Era impossível comer. Eram-nos dados 30 segundos para cada refeição. Em 30 segundos tínhamos de comer tudo o que conseguíssemos. O pão era muito duro de propósito, quem tinha os dentes partidos não conseguia comer a tempo”, descreveu Mykhailo Dianov, citado pelo britânico Daily Star, acusando os soldados russos de práticas de tortura e agressões aos prisioneiros de guerra.
Após serem divulgadas as fotografias de Dianov aquando da sua libertação, em Setembro, os ucranianos organizaram uma angariação de fundos para o seu tratamento.
O antigo fuzileiro naval acabaria por doar o dinheiro angariado a várias associações: entregou cerca de 75 mil euros à Associação de Familiares dos Defensores da Azovstal; 43 mil euros a um centro de reabilitação de vítimas da guerra; e 25 mil euros ao Heroes Tribune Fund, criado para apoiar as famílias de fãs de futebol mortos na guerra.