“Longas horas” ou sair. Após ultimato de Musk, centenas de funcionários deixam Twitter

Muitos engenheiros responsáveis por corrigir bugs e evitar interrupções no serviço estarão de saída, o que levanta questões sobre a estabilidade da plataforma.

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Escritórios do Twitter em Nova Iorque, EUA BRENDAN MCDERMID/Reuters

Centenas de funcionários do Twitter terão decidido abandonar a empresa após o novo proprietário, Elon Musk, ter feito um ultimato, na quinta-feira, no qual instava os funcionários a estarem dispostos a trabalhar “longas horas em alta intensidade” ou a saírem.

Após se ter apercebido que o número de pessoas decididas a abandonar a empresa poderia ser mais elevado do que o esperado, Musk recuou numa decisão que tinha divulgado há uma semana sobre o regresso aos escritórios, tendo afirmado na quinta-feira que os funcionários teriam permissão para trabalhar remotamente caso os seus gestores considerem que demonstram “uma excelente contribuição”, de acordo com o diário The Washington Post.

O mesmo jornal refere ainda que os líderes das equipas se reuniram rapidamente para discutir quem deveria ser convidado a regressar à empresa.

As demissões mostram a relutância de alguns dos cerca de 3000 funcionários do Twitter em permanecer numa empresa onde Musk despediu metade da força de trabalho, incluindo a alta administração, e tem tentado alterar as práticas.

Segundo o The Washington Post, os funcionários estimam que entre 2000 e 2500 pessoas tenham permanecido na empresa, mas a averiguação sobre quem saiu não é ainda certa porque a maior parte das pessoas que integrava a equipa de recursos humanos também abandonou a empresa.

Elon Musk recorreu ao Twitter, na noite de quinta-feira, para revelar que não está preocupado com a saída dos funcionários, uma vez que “as melhores pessoas ficam”. De acordo com fontes citadas pela Reuters, o multimilionário encontrou-se com alguns funcionários importantes na quinta-feira para tentar convencê-los a permanecerem na empresa.

“Acabámos de atingir outro recorde histórico na utilização do Twitter...”, acrescentou, sem avançar detalhes.

Mais de 110 funcionários do Twitter em pelo menos quatro continentes anunciaram a sua decisão de abandonar a empresa em publicações feitas na rede social, embora as publicações não tenham sido verificadas de forma independente pela Reuters. Cerca de 15 funcionários, muitos deles da área da publicidade, manifestaram a intenção de permanecer na empresa.

Numa plataforma de comunicação interna do Twitter, mais de 500 funcionários escreveram mensagens de despedida na quinta-feira, segundo uma fonte próxima.

Numa conversa privada na plataforma Signal com cerca de 50 funcionários do Twitter, quase 40 disseram que decidiram sair, de acordo com um ex-funcionário citado pela Reuters. Por sua vez, num grupo privado na plataforma Slack, cerca de 360 funcionários do Twitter juntaram-se a um novo grupo intitulado “demissão voluntária”, segundo outra fonte.

Plataforma em risco

Muitos engenheiros responsáveis por corrigir bugs e evitar interrupções no serviço estarão de saída, o que levanta questões sobre a estabilidade da plataforma.

Na noite de quinta-feira, a versão do Twitter utilizada pelos funcionários começou a desacelerar, segundo uma fonte citada pela Reuters, que prevê que a versão pública do Twitter corra o risco de bloquear durante a noite.

“Se bloquear, não resta ninguém para consertar as coisas em muitas áreas”, afirmou a fonte, que não quis ser identificada por medo de represálias.

“Tenho conhecimento de seis sistemas críticos que já não têm engenheiros”, disse um ex-funcionário ao Washington Post. Além disso, a maioria das pessoas responsáveis por detectar desinformação, spam, contas falsas e falsificação de identidade também saiu.

“Qualquer erro no código e nas operações agora é mortal”, disse um ex-engenheiro que deixou a empresa esta semana citado pelo jornal norte-americano. Aqueles que permanecerem “ficarão sobrecarregados e, por causa disso, mais propensos a cometer erros”, acrescentou.

Relatos de problemas no Twitter aumentaram acentuadamente para cerca de 350 na noite de quinta-feira, de acordo com o site Downdetector, que rastreia interrupções de sites e aplicações.

"Vamos precisar de ser extremamente duros"

“No futuro, para construir um Twitter 2.0 inovador e ter sucesso num mundo cada vez mais competitivo, vamos precisar de ser extremamente duros”, disse Musk, na quarta-feira, num e-mail que enviou aos funcionários do Twitter.

O e-mail pedia aos funcionários que clicassem na opção “sim” se quisessem permanecer na empresa. O proprietário disse ainda que iria supor que aqueles que não respondessem até as 17h (hora local) de quinta-feira queriam sair e receberiam uma indemnização no valor de três meses de salário, segundo o Washington Post.

Tess Rinearson, que estava incumbida de criar uma equipa responsável pelas criptomoedas no Twitter, foi uma das funcionárias a abandonar a empresa. Por sua vez, alguns engenheiros que decidiram sair alteraram as suas biografias no Twitter, descrevendo-se como “engenheiros softcore” ou “ex-engenheiros hardcore”.

Muitos funcionários que estão de saída utilizaram a hashtag #LoveWhereYouWorked para anunciarem a decisão.

“Eu pensei que a minha alma já estava totalmente esmagada depois das últimas duas semanas. Eu estava tão errado. Hoje foi difícil”, lê-se numa publicação.

À medida que os funcionários anunciavam a sua saída, Musk recorreu à rede social para fazer uma piada. “Como se faz uma pequena fortuna nas redes sociais? Começa-se com uma grande [fortuna]”, escreveu.

Na quinta-feira, foram também projectadas nas paredes da sede do Twitter, em São Francisco, as palavras “bilionário sem valor” e “bebé falido” numa referência a Elon Musk, embora não tenha ficado claro quem organizou a manifestação.