Consumidores de cocaína em Portugal são sobretudo homens jovens e licenciados
Estudo revela o consumidor-tipo da cocaína em pó em Portugal. Maioria consome para se divertir, de forma esporádica. Autora do relatório alerta que é sempre “muito arriscado porque é uma substância ilícita que não tem controlo de qualidade, frequentemente sujeita a adulterações”.
São sobretudo homens, entre os 25 e os 34 anos, com formação no ensino superior completa e a trabalhar a tempo inteiro por conta de outrem. Este é o perfil do consumidor-tipo de cocaína em Portugal, apurado por um inquérito online do Observatório Europeu da Droga e da Toxicodependência feito em vários países, entre os quais Portugal, através do Serviço de Intervenção nos Comportamentos Adictivos e nas Dependências (SICAD), cujos dados foram revelados nesta terça-feira. Segundo a autora do estudo, Ludmila Carapinha, estes consumidores são maioritariamente “pessoas integradas socialmente, que trabalham ou que estudam e que consomem cocaína”.
De acordo com o documento “Cocaína em Portugal: Inquérito Online Europeu sobre Drogas 2021”, os homens representam um total de 69% dos consumidores de cocaína. Quando consomem, pontualmente, fazem-no acompanhados por duas a três pessoas para se divertiram. A forma mais comum é inalar cocaína em pó.
Juntos, os grupos etários dos 25 aos 34 anos de idade e dos 18 aos 24 representam 74% do total de consumidores — 42% e 32%, respectivamente. No caso das pessoas entre os 45 e os 54 anos, este número baixa para 7% e para 1% no grupo etário seguinte, entre os 55 e os 64 anos.
Tendo em conta que o consumo de cocaína é realizado em “contextos específicos e de lazer”, como refere Ludmila Carapinha ao PÚBLICO, “a maioria dos consumidores não é aquele consumidor desenraizado”. “Portanto, [o consumo] não está, na maioria dos casos, associado propriamente a uma situação de degradação social, de marginalização e não é, por isso, surpreendente que exista uma proporção importante de consumidores que tenha formação ao nível do ensino superior e que até esteja a frequentar a faculdade.”
O inquérito online, de autopreenchimento, teve como população-alvo utilizadores de drogas com 18 ou mais anos e foi promovido em cerca de 30 países, entre Março e Maio de 2021, com um horizonte temporal quanto aos consumos relativo aos 12 meses anteriores. Em Portugal, participaram no estudo 652 indivíduos, a maioria concentrada nas regiões de Lisboa e Vale do Tejo (39%) e Norte (35%).
Trata-se de pessoas com o ensino superior completo (41%, aos quais acrescem mais 20% quando considerados os que ainda frequentam a universidade). Já os consumidores com o ensino secundário representam 26% do total (mais 7% a frequentar) e os restantes têm escolaridade inferior.
“Um consumo que seja é um consumo muito arriscado"
Quanto à situação laboral, praticamente metade (49%) dos consumidores está empregada por conta de outrem e trabalha a tempo inteiro (mais 4% a tempo parcial); 10% trabalham por conta própria também a tempo inteiro (mais 2% a tempo parcial); 16% são exclusivamente estudantes (mais 6% que são trabalhadores-estudantes) e os restantes não estão empregados.
Quando questionados sobre os motivos para consumir cocaína, 74% disseram que foi para ficar com a “moca”/divertir-se; 50% apontaram a socialização; 18% para reduzir o stress; 12% para experimentar; 10% para melhorar o desempenho (escola, desporto, trabalho, etc.); 9% para tratar a depressão/ansiedade; 1% para reduzir a dor/inflamação e 0,9% para melhorar o sono.
Apesar de a maioria dos utilizadores consumir esporadicamente, a autora do estudo alerta que “um consumo que seja de cocaína é um consumo muito arriscado porque é uma substância ilícita que não tem controlo de qualidade, frequentemente sujeita a adulterações”.
“Quando se vai consumir, mesmo que se tenha o cuidado de comprar sempre ao mesmo fornecedor, por exemplo, em que existe confiança a partir de situações anteriores, há sempre um elevado grau de desconhecimento relativamente àquilo que se vai consumir”, sublinha, ao mesmo tempo que recorda que “pode até ocorrer uma overdose”.
A maioria dos consumidores que responderam ao inquérito aufere um vencimento líquido igual ou superior a 500 euros e inferior a mil euros, representando 46% do total. Seguem-se os consumidores com rendimento inferior a 500 euros mensais (25%), depois os que conseguem uma quantia igual ou superior a mil euros, mas inferior a 2 mil (23%) e os restantes com 2 mil ou mais euros.
O padrão traçado pelo SICAD indica ainda que um terço dos indivíduos (33%) vive com os pais, 21% vivem maritalmente sem filhos (mais 7% com filhos), 18% vivem sozinhos, 14% partilham casa com amigos ou colegas e os restantes são outro tipo de situações, não especificadas no relatório.