Damien Hirst queima as suas obras depois de as ter transformado em NFT
Os coleccionadores tinham de escolher: desenho ou versão digital? Milhares de obras serão queimadas até ao final do mês às mãos do próprio artista e seus assistentes, acrescentando mais um capítulo na recente e tumultuosa história da criptoarte.
O artista britânico Damien Hirst começou esta terça-feira a queimar centenas de obras suas depois de um grupo de coleccionadores ter escolhido manter a versão NFT das respectivas peças, ou seja, tokens não fungíveis (a chamada criptoarte, baseada na tecnologia blockchain).
Hirst, que se tornou um dos rostos mais conhecidos da cena da Young British Art nos anos 1990, lançou a sua primeira colecção NFT, The Currency, em Julho de 2021. Consiste em dez mil NFT, correspondentes a dez mil obras originais compostas por pintas coloridas. Os coleccionadores tinham de escolher entre ficar com os NFT, que terão sido vendidos individualmente por dois mil euros, ou trocá-los por obras de arte “físicas”. Uma maioria, 5149, escolheu as obras palpáveis, enquanto 4851 optaram pelos NFT, segundo a Newport Street Gallery, que representa o artista.
A galeria dissera na altura que as obras que não fossem trocadas por NFT seriam destruídas — e vice-versa. Hirst anunciou na segunda-feira, no Instagram, que iria queimar mil obras no dia seguinte. O acontecimento foi transmitido em directo pela Internet, num vídeo onde se viu o vencedor do Prémio Turner e os seus assistentes a usarem pinças para depositar no fogo peças individuais, empilhadas junto a lareiras, perante o olhar de transeuntes.
“Muita gente pensa que estou a queimar milhões de dólares de arte, mas não estou. Estou a completar a transformação destas obras de arte físicas em NFT ao queimar as suas versões físicas”, escreveu Hirst no Instagram. “O valor da arte digital ou física, que é difícil de definir na maior parte das vezes, não será perdido, será transferido para NFT assim que [estas obras] forem queimadas.”
As obras, criadas em 2016 em papel feito à mão e numeradas, tituladas, carimbadas e assinadas, serão queimadas até ao encerramento da exposição The Currency, a 30 de Outubro. A popularidade dos NFT explodiu no último ano, quando os especuladores de bolsos virtuais cheios de criptomoeda procuraram lucrar com este mercado, mas mais recentemente o volume de vendas tem decrescido.
Hirst tem 57 anos e é conhecido por obras polémicas, como o tubarão morto que flutua num tanque cheio de formol, The Physical Impossibility of Death in the Mind of Someone Living, ou Mother and Child, Divided, uma vaca e a sua cria cortadas transversalmente. Também é famoso pelos seus quadros pintalgados e por For The Love Of God, um molde em platina de um crânio do século XVIII encrustado com diamantes. Questionado sobre como se sentia ao queimar as suas obras, Hirst disse: “Sabe bem, melhor do que esperava.”
Esta acção surge meses depois de o milionário mexicano Martin Mobarak ter destruído o que garantiu ser um desenho original de Frida Kahlo para o fazer sobreviver apenas em versão NFT, gerando discussão mundial e uma investigação do Instituto Nacional das Belas Artes e Literatura do seu país, porque toda a obra da artista está classificada como tesouro nacional do México e a sua destruição intencional é crime. Ainda não são conhecidos os resultados dessa investigação.