Há cor e música na longa espera para votar no Porto
Muitos eleitores, apoiantes tanto de Lula como de Bolsonaro, trazem t-shirts ou acessórios alusivos ao candidato de eleição.
“Avisa para as pessoas que aqui em Portugal é tudo Lula, viu?” A frase dita durante uma videochamada ouve-se logo no início da longa fila que os eleitores brasileiros no Porto têm de enfrentar para votar: quase um quilómetro e meio, à volta do quarteirão e até ao IPO. À porta do Instituto Superior de Engenharia do Porto há uma concentração grande de apoiantes de Lula da Silva, muitas T-shirts vermelhas, canta-se de quando em vez “Anunciação”, de Alceu Valença: “Tu vens, tu vens, / eu já escuto os teus sinais.”
Do outro lado da rua, o grupo apoiante do actual Presidente Jair Bolsonaro, com as suas T-shirts amarelas da selecção brasileira, grita: “Lula é ladrão, seu lugar é na prisão!” A polícia, estrategicamente posicionada entre os dois grupos, diz que não houve incidentes violentos durante o dia. “Cada um tem direito de expressar a sua opinião”, comenta um agente.
Tal como em Lisboa, os relatos sobre as votações no Porto dão conta de uma eleição muito participada, com filas longas, demoradas e animadas para votar desde cedo. Embora estivessem inscritos menos eleitores do que na capital – 30.098 – a verdade é que também aqui o número de brasileiros com capacidade de voto mais do que duplicou em relação a 2018.
“A fila está tão grande que eu estou pelo menos a 800 metros do local de votação”, mostrava um eleitor a meio da manhã, fazendo acompanhar o seu relato de um mapa assinalando o lugar onde está e aquele aonde quer chegar e onde estão as 39 mesas eleitorais. Nas redes sociais, vários vídeos de eleitores anónimos comprovam a animação, a longa espera e o clima geral ordeiro, sem desacatos e colorido.
A meio da tarde, a fila já ia com mais de um quilómetro, dando a volta ao quarteirão e chegando ao IPO, implicando mais de uma hora de espera. Aqui e ali, algumas picardias à passagem quando se cruzavam T-shirts vermelhas e amarelas.
O clima geral, no entanto, é de dever a ser cumprido.
Filas lá fora e cá dentro
“O Japão é nosso, viu?”, celebra um homem de T-shirt amarela ao ver passar um amigo igualmente vestido a rigor pró-Bolsonaro, remetendo-se aos resultados das primeiras urnas de voto a serem encerradas, em países asiáticos.
Nos corredores, continuam os comentários entre eleitores militantes dos diferentes candidatos, mas o ambiente é sereno. À frente de cada secção de voto, mais filas de espera para votar na urna electrónica. Das salas vai chegando o “pirililili” das urnas a confirmar o voto depositado.
Cá fora, a organização começa a apressar a entrada no edifício. Às 17h, os portões fecham-se e a partir daí só poderá votar quem já estiver no campus do ISEP.
Encontramos Sílvia Cunha, de 45 anos, que acaba de votar com a mãe. Natural do Rio de Janeiro, vive em Vila Nova de Gaia há seis anos. Perguntamos-lhe se o seu voto é secreto ou se pode partilhar, ao que responde com um sorriso aberto apontando para a t-shirt verde e amarela. Diz que não teve dúvidas sobre o sentido do voto: Jair Bolsonaro,"22, claro”. Fala no combate à corrupção como uma das principais bandeiras que subscreve. Sobre a provável vitória de Lula da Silva, responde já a pensar nas eleições daqui a quatro anos. “Vamos deixar a democracia funcionar.”
Danilo Galvão, natural de Recife, e Paulo Parnaba, do Rio de Janeiro, também não fazem segredo do voto em Bolsonaro — nem da desconfiança no sistema eleitoral. Danilo, residente em Portugal há dois anos, sente que a imprensa brasileira evita falar sobre o que acredita serem fragilidades do voto electrónico, remetendo a rumores sobre os resultados de eleições anteriores. Tem fé na reeleição de Jair Bolsonaro: ainda há muito para fazer para corrigir os anos de governo do PT.
Sidinéia Yamaguchi, em Portugal há 25 anos, receia o que pode acontecer depois das eleições, nomeadamente a reacção dos apoiantes de Bolsonaro e um eventual apoio das forças armadas — que, felizmente, nota, não têm dado sinais de movimentações nesse sentido. É mais uma que não esconde o seu voto: Lula da Silva, sem dúvidas, mantendo a escolha já de vários anos no Partido dos Trabalhadores. Identifica-se com a estratégia seguida pela “chapa” de Lula, em particular na última semana, tentando ocupar o lugar de única alternativa democrática ao bolsonarismo.
“O Brasil precisa de esperança”, reforça, ao despedir-se. “É essa esperança que sentimos renascer de novo.”