Operação Lex: Advogado de Vieira diz que cliente “não foi pelas traseiras” para reaver 1,6 milhões
Juiz encarregado da fase instrutória do processo inquiriu responsável pelo protocolo do Benfica, para saber que critérios eram usados na escolha de convidados para a tribuna presidencial, onde ex-juiz Rangel era presença assídua.
O advogado do ex-presidente do Benfica, Raul Soares da Veiga, considera normal que o seu cliente tenha tentado convencer o então juiz Rui Rangel a ir com ele ao Tribunal de Sintra para reunirem com a magistrada que tinha em mãos um processo em que Luís Filipe Vieira reclamava à Autoridade Tributária a devolução de 1,6 milhões de euros.
O ex-magistrado, que é o principal arguido da Operação Lex, não tinha nada a ver com o processo tributário. Mas tinha sido frequentemente agraciado pelo Benfica com convites para a bancada presidencial para assistir aos jogos e com viagens e estadia paga quando estes desafios se desenrolavam no estrangeiro. Foi esta coincidência que levou o Ministério Público a acusar Vieira e outro colega seu da direcção do Benfica, Fernando Tavares, do crime de concessão indevida de vantagem ao antigo juiz.
Trata-se de um crime menor, cuja moldura penal não ultrapassa os três anos – ao contrário das suspeitas que impendem sobre Vieira no processo Cartão Vermelho, ainda sob investigação, e que ditaram a sua saída da liderança do Benfica.
Em 2017 o dirigente desportivo pressionou várias vezes Rangel para que o ajudasse a resolver o processo de Sintra, cujo desfecho acabaria por lhe ser favorável: foram-lhe mesmo devolvidos 1,6 milhões de IRS pagos em demasia. E apesar de nunca o ter acompanhado ao tribunal, como lhe deu a entender que estava disposto a fazer, o ex-magistrado mexeu cordelinhos junto dos colegas para se informar do estado do processo.
Questionado esta quarta-feira pelos jornalistas, durante a fase instrutória do processo, que está a decorrer no Supremo Tribunal de Justiça, sobre se a atitude de Luís Filipe Vieira teria sido normal, Raul Soares da Veiga assegurou que sim: “Querer apresentar-se em tribunal acompanhado de um juiz só demonstra independência e lealdade. Não foi pela porta das traseiras. Não vejo nada de indevido, é uma coisa normalíssima todos os dias – saber porque é que um processo está atrasado.”
Nesta primeira audiência de testemunhas do processo foram arrolados por Fernando Tavares vários funcionários do clube dos “encarnados”, para explicarem os critérios que presidiam à entrega de convites para a bancada presidencial. O juiz que presidiu às diligências inquiriu longamente a responsável pelo protocolo do Benfica, Ana Paula Godinho, para saber quem tinha direito a convites e em que quantidade.
Fora desta fase instrutória estão os factos relacionados com a alegada manipulação fraudulenta da distribuição de processos aos juízes do Tribunal da Relação de Lisboa, onde Rui Rangel estava colocado antes de ser expulso da magistratura, na sequência deste caso, assim como a vida dispendiosa que levava, pouco compatível com o salário de juiz. São questões que só serão abordadas em julgamento, se o juiz de instrução considerar que existem indícios suficientes para fazer sentar todos os arguidos ou pelo menos alguns deles no banco dos réus.
Ao todo foram acusados 17 arguidos na Operação Lex. Segundo a acusação, Rui Rangel, a sua mulher, a juíza Fátima Galante e Luís Vaz das Neves utilizaram as funções que desempenhavam na Relação de Lisboa para obterem vantagens indevidas, num montante superior a 1,5 milhões de euros, para si ou para terceiros, montante que tentaram dissimular.