Tchizé pede funeral de José Eduardo dos Santos “organizado com o devido tempo”
Filha do antigo Presidente de Angola reage criticamente à chega do corpo a Luanda este sábado e prevê um “teatro fúnebre-eleitoral” nos próximos dias.
Uma das filhas do ex-Presidente de Angola, José Eduardo dos Santos, apelou este sábado a um funeral do pai “organizado com o devido tempo” e reiterou que avalia uma queixa nas instâncias europeias por violação de direitos humanos.
Através de um comunicado dos seus advogados, Tchizé dos Santos, uma dos cinco filhos de José Eduardo dos Santos que disputava a custódia do corpo do ex-Presidente na Justiça, diz ter tido conhecimento esta manhã, através de imagens emitidas pela televisão pública angolana, que o corpo do seu pai tinha sido entregue à viúva, Ana Paula dos Santos.
O corpo foi entregue a Ana Paula dos Santos em Barcelona, Espanha, onde José Eduardo dos Santos morreu a 8 de Julho, e, segundo, o Governo de Angola, chega este sábado a Luanda, para o funeral, cuja data ainda se desconhece.
“Por causa desta situação”, Tchizé dos Santos e quatro dos seus irmãos “não puderam despedir-se do seu pai”, pelo que a filha do ex-Presidente de Angola afirma que “quando se esclarecer o ocorrido, avaliará se houve uma violação dos seus direitos humanos e dos seus irmãos”, lê-se no mesmo comunicado.
A advogada Carmen Varela, que representa Tchizé dos Santos, já tinha dito à Lusa que os cinco filhos mais velhos de José Eduardo dos Santos desconheciam que o corpo do pai já tinha sido entregue à viúva.
Tchizé dos Santos e os irmãos apresentaram recursos da decisão de quarta-feira do tribunal de Barcelona de entregar o corpo a Ana Paula dos Santos e de permitir a trasladação para Angola.
Segundo os advogados de Tchizé dos Santos, apesar de um recurso ter sido rejeitado e um segundo não ter efeitos suspensivos dessa decisão judicial, estava pendente uma resposta ao pedido de realização do funeral em Barcelona, para permitir a presença de todos os filhos do ex-Presidente, uma vez que os cinco mais velhos invocaram que não podem deslocar-se a Angola por considerarem que isso representa um risco para as suas vidas.
No comunicado divulgado este sábado pelos advogados de Tchizé dos Santos, é dito que a viúva do ex-Presidente trasladou o corpo para Angola sem responder a esta questão do tribunal sobre a possibilidade de o funeral ser em Barcelona.
As “feiticeiras” e o “bruxo”
Nas redes sociais, Tchizé, depois de se saber que o corpo do pai estava a caminho de Angola, apelou ao voto dos angolanos nas eleições presidenciais de 24 de Agosto no candidato Adalberto da Costa Júnior, da UNITA, na oposição, para isso permitir “de facto” uma “homenagem de Estado à altura” a José Eduardo dos Santos.
Tchizé dos Santos pede um funeral “organizado com o devido tempo, tal como está a fazer o Japão, que previu e anunciou mais de dois meses e meio para a organização do funeral de Estado do seu antigo primeiro-ministro [Shinzo Abe], falecido no mesmo dia que JES [José Eduardo dos Santos]”.
“Neste tipo de funeral deve haver condições para que possa participar toda a sua família, chefes de Estado vindos de todo o mundo, dos quais vários já manifestaram publicamente a intenção de prestar a dos Santos uma última homenagem e é isto que os angolanos de boa-fé de facto merecemos e queremos e não a vergonha mundial a que nos expõe o chefe de governo de Angola [João Lourenço] ao usar o cadáver do seu antecessor como ferramenta de campanha política e/ou de cobertura da fraude eleitoral”, acrescentou Tchizé dos Santos.
A filha de José Eduardo dos Santos considera que nos próximos dias haverá um “teatro fúnebre-eleitoral”, em que as “feiticeiras” e o “bruxo” vão usar o corpo do antigo chefe de Estado “de forma hedionda e repugnante”.
Também a empresária Isabel dos Santos, outra das filhas de José Eduardo dos Santos, lamentou hoje a trasladação do corpo do pai para Angola com uma publicação nas redes sociais em que escreveu que não poderá levar o ex-Presidente angolano à “última morada” por terem-no “arrancado” dos seus braços.
Duas facções da família dos Santos disputavam, na Vara de Família do Tribunal Civil da Catalunha, quem ficaria com a guarda do corpo de José Eduardo dos Santos.
De um lado, estava Tchizé dos Santos e os irmãos mais velhos, que se opunham à entrega dos restos mortais à ex-primeira-dama e eram contra a realização de um funeral de Estado antes das eleições para evitar aproveitamentos políticos.
Do outro, estava a viúva Ana Paula dos Santos e os seus três filhos em comum com José Eduardo dos Santos, que reivindicavam também o corpo e queriam que fosse enterrado em Angola.
Na quarta-feira, o tribunal decidiu-se pela atribuição do cadáver à antiga mulher e autorizou a trasladação para Angola, depois de concluir definitivamente que José Eduardo dos Santos morreu de causas naturais.