Irão reclama ter “capacidade técnica para construir uma bomba nuclear”
Declarações de membros do regime iraniano sobre progressos no seu programa nuclear começaram depois da visita de Biden a Israel, com as negociações sobre acordo internacional em pano de fundo.
Se quisessem, os iranianos já poderiam produzir uma bomba atómica, garantiu esta segunda-feira o chefe da Organização de Energia Atómica iraniana, Mohammad Eslami, sublinhando que não planeiam fazê-lo. Afirmações deste tipo são extremamente raras, num regime que tanto se tem esforçado por assegurar que o seu programa nuclear é pacífico e não tem objectivos militares, mas parecem ter-se tornado frequentes nas últimas semanas – o objectivo de Teerão será aumentar a pressão sobre os Estados Unidos nas negociações para reactivar o acordo nuclear.
Washington também se tem esforçado por pressionar o Irão, reafirmando que a janela de oportunidade se está a fechar, e o mesmo têm feito alguns dos países europeus mais envolvidos nas conversações iniciadas em Abril do ano passado.
Do lado iraniano, este é um jogo arriscado. Numa altura em que crescem os receios sobre o tempo necessário para o Irão chegar à bomba atómica (ou para armazenar uma quantidade suficiente de urânio altamente enriquecido), estes comentários são recebidos como ameaças em vários países do Médio Oriente, principalmente em Israel.
Eslami, citado pela agência de notícias Fars, reiterava os comentários recentes de Kamal Kharrazi, ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e actual conselheiro do Guia Supremo, ayatollah Ali Khamenei. “Como mencionou Kharrazi, o Irão tem a capacidade técnica para construir uma bomba atómica, mas esse plano não está na agenda”, afirmou. Kharrazi falou há duas semanas, em declarações à televisão Al-Jazeera, sublinhando que o país tem “os meios técnicos” para o fazer, “mas não foi tomada nenhuma decisão para a construir”.
As afirmações de Kharrazi terão surgido em resposta à visita de Joe Biden a Israel, quando o Presidente norte-americano assinou com Yair Lapid uma declaração onde garante que os EUA estão prontos a “usar todos os elementos do seu poder” para assegurar que Teerão não chega à bomba atómica”.
Pelo meio, algumas mensagens em contas de redes sociais ligadas aos Guardas da Revolução (poderosa força de elite, muito próxima de Khamenei) sugerem que as actividades na unidade de enriquecimento de Fordow podem “transformar o programa nuclear pacífico num programa de construção de armas atómicas num piscar de olhos” – Fordow é um complexo subterrâneo que o Irão construiu em segredo, só revelando a sua existência em 2009, quando já era conhecido dos serviços secretos de vários países ocidentais. Noutras publicações fazem-se mesmo ameaças concretas, como a de reduzir Nova Iorque a “ruínas infernais”.
Para Eyal Zisser, vice-reitor da Universidade de Telavive, ouvido pelo serviço de notícias Jewish News Syndicate, tudo isto visa pressionar a Administração de Joe Biden. Zisser considera que tanto Teerão como Washington continuam interessados em concluir o acordo (rasgado por Donald Trump em 2018): o Irão para “levantar as sanções” contra o país; os EUA para “impedir o Irão de se tornar uma potência nuclear”, ou pelo menos adiar esse momento o mais possível. “Os americanos não querem ser desafiados pelo Irão, e um Irão com armas nucleares seria um desafio”, defende. “Passa tudo por adiar a questão para o próximo presidente e para o seguinte e para o que vier a seguir a esse”.
Em Abril, o Irão começou a enriquecer urânio com uma pureza de 60%, a maior já registada – três vezes acima do que estava a fazer, ainda longe dos 90% necessários para desenvolver uma arma nuclear – justificando a decisão como resposta ao “terrorismo nuclear” de Israel, depois de um ataque contra o complexo nuclear de Natanz, a sul de Teerão.