Aeroporto de Lisboa: Governo avança primeiro para Montijo e depois para Alcochete

O Governo decidiu acelerar a substituição da Portela e abandonar a Avaliação Ambiental Estratégica em curso. Em 2026, quer a pista complementar do Montijo a funcionar e, em 2035, um novo aeroporto em Alcochete. E avança, independentemente do apoio do PSD.

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Governo aposta no Montijo (na foto) no curto prazo e em Alcochete no longo prazo Daniel Rocha

O Ministério das Infra-Estruturas decidiu pôr um ponto final no processo de Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) que estava nas mãos do Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT) e vai avançar para uma solução que envolve Montijo e Alcochete, sem antes ter o acordo com o PSD como antes tinha proposto.

Esta quarta-feira à tarde já foi publicado um despacho do Ministério das Infra-Estruturas onde se anuncia a decisão e se determina que seja o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) a fazer uma AAE. O objectivo é o de avançar com as obras no Montijo dentro de um ano para que em 2026 haja aviões a aterrar nesta infra-estrutura complementar à da Portela, e que se comece a avançar para uma nova infra-estrutura aeroportuária de raiz no Campo de Tiro de Alcochete, mais pensada para o longo prazo. Nessa altura, de acordo com o plano, o aeroporto da Portela é encerrado, “libertando a cidade dos impactes associados a uma infra-estrutura aeroportuária tão perto do centro urbano”.

Para que tal seja possível, será também apresentada de novo à Assembleia da República a proposta de lei para mudar a legislação que permite a um município bloquear a localização de um novo aeroporto nas suas imediações. Na anterior legislatura, seria preciso o apoio do PSD, mas agora o Governo tem uma maioria absoluta.

No caso de Alcochete, a expectativa do ministério liderado por Pedro Nuno Santos é a de que a nova infra-estrutura esteja pronta em 2035, ano estimado para a saturação do Montijo, com duas pistas de aterragem (podendo chegar a quatro no futuro). Será preciso, no entanto, a realização de uma nova Declaração de Impacte Ambiental (DIA) para Alcochete, uma vez que a que existia já caducou. Do lado do ministério liderado por Pedro Nuno Santos, a ideia é a de que nessa altura também o Montijo deixe de ter aviões, concentrando-se as operações em Alcochete.

“Apesar de a crise pandémica ter afectado de forma muito negativa o tráfego aéreo, as previsões internacionais apontam para um regresso rápido aos níveis pré-pandemia, estimando-se, no longo prazo, que o tráfego aéreo previsto para a região de Lisboa possa duplicar ao longo das décadas seguintes, colocando uma pressão insustentável sobre a infra-estrutura existente”, refere-se no despacho publicado em Diário da República.

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“O esgotamento da capacidade aeroportuária de Lisboa e o prejuízo que representa para a economia nacional a impossibilidade de responder a toda a procura dirigida ao Aeroporto Humberto Delgado fazem da solução deste problema uma prioridade política da maior importância e impõem uma tomada de decisão célere”, justifica o ministério liderado por Pedro Nuno Santos.

Até aqui, Montijo e Alcochete eram opções antagónicas. No processo de AAE que estava a ser lançado pelo IMT estavam três alternativas em cima da mesa, duas das quais envolvendo o Montijo (numa delas seria aeroporto complementar, e na outra assume-se como a infra-estrutura principal), sendo a terceira a opção do Campo de Tiro de Alcochete.

O IMT já tinha anunciado que quem iria fazer a AAE que contemplava as três hipóteses que estavam até agora em análise era o consórcio formado pela Coba e pela Ineco, esta última detida pelo Estado espanhol. O facto de a Ineco estar ligada a empresas do sector, nomeadamente de gestão aeroportuária onde se inclui o aeroporto de Madrid, concorrente do de Lisboa, não foi do agrado de Pedro Nuno Santos. Segundo fonte do Ministério das Infra-estruturas, o consórcio vencedor já foi avisado de que a assinatura do contrato não se vai concretizar.

Fragilidades no cenário Montijo sem Portela

Por parte do Ministério das Infra-estruturas considera-se que não há condições, nomeadamente políticas e sociais, para o aeroporto da Portela crescer mais, algo que seria necessário no caso de Montijo ficar como infra-estrutura complementar. Assim, e conforme explica o despacho, as obras que irão avançar na Portela “terão como único objectivo a melhoria da operacionalidade da infra-estrutura”.

Por outro lado, o Governo avança que o Montijo também tem fragilidades para se apresentar como aeroporto principal. “Desde o momento da decisão da inclusão da solução Montijo stand alone como opção merecedora de estudo na avaliação ambiental estratégica, tanto a informação recolhida como a reflexão feita pelo Ministério das Infra-estruturas e da Habitação levaram a concluir pela existência de dúvidas fundadas sobre a viabilidade desta solução”, refere-se no despacho.

“Os riscos de uma infra-estrutura aeroportuária com duas pistas de grande extensão na península do Montijo não obter autorização ambiental para avançar são hoje avaliados como muito elevados”, pelo que, explica-se, o Governo deixou “de equacionar a opção Montijo stand alone como viável”.

Assim, defende-se, “a única solução aeroportuária que responde à exigência de dotar o país e a região de Lisboa de uma infra-estrutura aeroportuária moderna com capacidade de crescimento a longo prazo é a construção de um aeroporto no Campo de Tiro de Alcochete”.

A ideia é a de avançar “imediatamente” com o planeamento e concepção deste projecto “com o objectivo de obtenção o mais breve possível de uma declaração de impacte ambiental”, e que a sua construção “possa ter início logo que a procura no Aeroporto Humberto Delgado ou no Aeroporto do Montijo atinja determinados factores de capacidade e/ou uma dada referência temporal a definir”.

Pelo meio, será ainda necessário renegociar o contrato de concessão do Estado Português com a ANA - Aeroportos de Portugal, que pertence ao grupo francês Vinci. No caso do Montijo não está previsto que o Estado tenha de investir, e é nesse registo que o Governo está a pensar para Alcochete, à excepção das acessibilidades (onde se inclui o cenário de uma nova ponte).

A empresa que gere os aeroportos já saudou, através de um comunicado, a decisão do Governo de avançar para o Montijo. Sobre Alcochete, a ANA diz tomar “em consideração” a “vontade do concedente de enquadrar uma nova fase de desenvolvimento a longo prazo”. “Assumindo a saturação do sistema Lisboa-Montijo”, a empresa irá, “no âmbito do seu contrato de concessão, definir com o concedente as condições de desencadeamento e realização dessa nova etapa”. A Confederação do Turismo de Portugal também se mostrou satisfeita com a novidade, tendo o seu presidente, Francisco Calheiros, sublinhado que “esta é uma decisão que responde às exigências feitas” pelo turismo ao longo dos últimos anos e que “só peca por tardia”.

Quanto à AAE que ficará a cargo do LNEC, esta servirá, de acordo com o despacho do Governo, para “melhor planear o desenvolvimento das infra-estruturas aeroportuárias em causa, aprofundando o estudo do seu impacte em dimensões estratégicas”, bem como para fazer “a análise das medidas destinadas a prevenir e a reduzir os efeitos adversos significativos” ligados à decisão. Por outro lado, serve também como defesa contra os processos judiciais em curso e que visam o facto de se ter escolhido Montijo sem antes ter feito esse procedimento.

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