Cristián Samper: “Não vamos alcançar as metas de Paris se não tivermos o oceano como parte da solução”

O presidente da Wildlife Conservation Society destaca a importância da envolvência das comunidades locais na preservação do oceano.

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Cristián Samper DR

Cristián Samper está em Lisboa a propósito da Conferência dos Oceanos das Nações Unidas e falou com o PÚBLICO sobre as maiores ameaças ao oceano e também algumas soluções. “O oceano deve tratar-se como algo fundamental para as comunidades locais e para o bem-estar do planeta”, considera o presidente da organização não-governamental Wildlife Conservation Society.

Como podemos alcançar o objectivo de ter 30% das áreas marinhas protegidas no mundo?
Temos de liderar esta questão com a ciência. Precisamos que a ciência nos informe sobre quais são os lugares mais importantes para a biodiversidade, para o clima e para as pessoas. Ao identificá-las, os Governos têm de se comprometer [na sua preservação], porque esta é uma decisão política e que está relacionada com o ordenamento do território marinho. Também temos de envolver as comunidades locais – elas são fundamentais. E temos de pensar neste objectivo dos 30% tanto nos mares territoriais como nas outras zonas [fora da dimensão marítima do território nacional].

Hoje quais são as maiores ameaças ao oceano?
A pesca excessiva das espécies, as alterações climáticas e, nalguns sítios, as espécies invasoras e a poluição.

Quais as principais soluções para esses problemas?
Uma das soluções mais importantes são as áreas protegidas. Se as áreas protegidas se projectarem bem nos sítios certos e se forem bem geridas, são muito boas, entre outras coisas, para a pesca. Sabemos que são refúgios, que, pela forma como trabalham os organismos marinhos, podem aumentar a produtividade. Depois há [outras soluções] como o sequestro de carbono e o carbono azul. Estas são algumas das ferramentas mais valiosas. Relativamente à pesca, há a pesca sustentável. E, claro, para muitos países, questões como o turismo são fundamentais. O oceano deve tratar-se como algo fundamental para as comunidades locais e para o bem-estar do planeta. Não vamos alcançar as metas [do Acordo] de Paris se não tivermos o oceano como parte da solução. [O Acordo de Paris é um compromisso negociado por 195 países com o grande objectivo de conter o aquecimento global do planeta. A comunidade internacional comprometeu-se a limitar a subida da temperatura bem “abaixo dos dois graus Celsius” e a prosseguir esforços para “limitar o aumento da temperatura a 1,5 graus Celsius” em relação aos níveis pré-industriais.]

Pode dar-me alguns exemplos de boa gestão do oceano?
Nesta conferência acaba de ser abordada uma iniciativa muito importante que é o “corredor marítimo do Pacífico tropical Leste”. É um corredor marítimo que se está a estabelecer entre a Costa Rica, o Panamá, Colômbia e Equador. Vai gerar uma área transnacional com várias áreas protegidas de mais de 500 mil quilómetros quadrados. Vai ser uma área maior do que Espanha. Essa área vai ser gerida pelos quatro países. É um exemplo muito bonito de cooperação.

Qual vai ser o compromisso e objectivos?
O importante é avançar com uma designação de áreas protegidas [e o compromisso de chegar aos tais 30%]. Panamá já o fez. A Costa Rica e Colômbia acabam de o fazer esta semana na conferência. Aqui o compromisso é ao nível dos chefes de Estado e da existência de uma conectividade. Nos ecossistemas marinhos, muitas espécies são migratórias e para as poder conservar tem de haver um esforço local, regional e transnacional.

O que espera desta conferência?
Este é um espaço para compromissos políticos e para se pôr o oceano na agenda global, o que é muito importante. Uma das metas é o objectivo 14 para o oceano [este objectivo de desenvolvimento do milénio adoptado pelas Nações Unidas tem o tema da conservação e o uso sustentável do oceano e está a ser discutido nesta conferência]. Outro tema muito importante para os oceanos é a poluição de plástico. Há um acordo global a nível político que se está a negociar para a redução de plásticos. Todos têm de trabalhar nisto: desde o sector privado aos Governos. Essa negociação já tinha sido anunciada antes em Nairobi, mas está a ser analisada. Outra coisa que se está a concluir é um acordo para a intergovernabilidade para as áreas marinhas fora da jurisdição nacional. É algo muito importante, porque a maior parte do oceano está fora da jurisdição dos países. Isso é fundamental em questões como a pesca. Portugal é um dos países que tem aqui um papel importante.

Quais são os principais projectos da Wildlife Conservation Society neste momento?
O nosso grande objectivo é a conservação da vida selvagem, mas queremos fazer essa conservação com os países e as populações locais. Nesse contexto, já ajudámos a formar mais de 350 parques nacionais pelo mundo. Também estamos muito ligados à educação. Queremos descobrir, proteger e inspirar. Queremos usar a ciência para informar e para nos ajudar nas decisões que tomamos ao nível da conservação. Queremos inspirar toda a gente. Todos nós somos parte da solução.