Destruição da última ponte pode ditar a queda de Severodonetsk

A batalha pela cidade a Leste continua intensa e Zelensky fala num custo humano “aterrador”. Forças separatistas pró-russas dizem aos soldados ucranianos para se renderem.

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Um homem caminha entre ruínas em Lisichansk Reuters/STRINGER

Há quase um mês que Severodonetsk é o epicentro da guerra na Ucrânia, mas a batalha parece ter chegado à sua derradeira fase com a destruição da última ponte que ligava a cidade à vizinha Lisichansk e ao restante território ucraniano.

“É agora completamente impossível entrar na cidade de carro ou entregar qualquer coisa. A evacuação é impossível”, admitiu o governador regional de Lugansk, Sergii Haidai, confirmando uma alegação anterior, por parte dos separatistas pró-russos, de que a ponte sobre o rio Donets que permanecia intacta foi deitada abaixo.

Uma pequena parte de Severodonetsk mantém-se sob controlo ucraniano, mas as forças russas “têm uma vantagem significativa na artilharia” e conseguiram recuperar muito território urbano, explicou o governante. “Os russos estão a destruir quarteirão atrás de quarteirão”, lamentou.

Há duas semanas, depois de a tropa russa ter conseguido fazer progressos consideráveis em Severodonetsk, os ucranianos lançaram um contra-ataque que forçou o recuo dos invasores. Mas a guerra faz-se de constantes movimentações territoriais e o cenário mudou radicalmente nos últimos dias.

“As batalhas são tão ferozes que a luta por um único edifício pode durar dias”, acrescentou Haidai à RFE, garantindo que a tropa ucraniana está numa situação complicada, mas ainda não totalmente bloqueada. Lisichansk mantém-se nas mãos dos soldados ucranianos, embora esteja também sujeita a bombardeamentos imparáveis.

“Rendam-se ou morrem”, disse aos jornalistas um representante militar da autoproclamada República Popular de Donetsk. Com a destruição da última ponte para Severodonetsk, “as divisões [militares] ucranianas que estão lá, ficam lá para sempre”, afirmou Eduard Basurin, a menos que deponham agora as armas. “Não há outra opção”, declarou.

Conquistando as duas cidades vizinhas, que não distam mais do que dez quilómetros uma da outra, a Rússia derruba o último bastião ucraniano na região de Lugansk, alcançando um dos objectivos a que se propôs quando renovou a ofensiva no Donbass, no fim de Abril. E liberta recursos para reforçar o outro objectivo, que é a conquista do restante território na região de Donetsk, onde as importantes cidades de Sloviansk e Kramatorsk permanecem sob controlo da Ucrânia.

“O custo humano desta batalha é muito alto para nós. É simplesmente aterrador”, disse Volodymyr Zelensky ao fim da noite no seu habitual vídeo. “Estamos a lidar com mal absoluto e não temos outra escolha que não avançar e libertar o nosso território”, afirmou o Presidente ucraniano, acrescentando que a luta pelo Donbass “será sem dúvida recordada na História militar como uma das mais violentas batalhas na Europa.”

Aos avanços russos em Severodonetsk, a Ucrânia responde com ataques de artilharia no território controlado pelos separatistas. Um bombardeamento que atingiu um mercado onde estava “muita gente” provocou a morte a pelo menos três pessoas, incluindo uma criança, disse um responsável da autoproclamada República Popular de Donetsk, citado pela agência russa Ria.

Ecos de Mariupol

A batalha por Severodonetsk tem semelhanças com a de Mariupol, que caiu ao fim de 86 dias de uma feroz resistência que terá sido fundamental para atrasar o avanço russo noutros locais do país. Por outro lado, os bombardeamentos às instalações químicas de Azot, onde cerca de 500 pessoas procuraram refúgio, têm ecos do cerco a Azovstal.

“Os abrigos de Azot não são tão resistentes como os de Azovstal, temos de tirar de lá as pessoas com garantias de segurança”, disse ainda Haidai, revelando estar em negociações com o lado russo para que os civis possam ser retirados do local. “Até ao momento têm sido infrutíferas.”

A delicada situação da cidade levou os responsáveis políticos ucranianos a reforçar o apelo ao fornecimento de armas por parte de países ocidentais. “Sejamos claros: para acabar com a guerra precisamos de igualdade nas armas pesadas”, escreveu no Twitter um assessor de Zelensky, Mikhailo Podoliak, listando em seguida um conjunto de material bélico e as quantidades que acredita serem necessárias. “Estamos ligeiramente preocupados, não há uma compreensão suficiente do nível de ameaça com que estamos e a Europa confrontados”, disse um assessor do Ministério da Defesa ucraniano, Iurii Sak, à BBC.

Esta segunda-feira, a Amnistia Internacional acusou a Rússia de praticar crimes de guerra em Kharkiv (Carcóvia) por ter utilizado bombas de fragmentação durante os ataques. “Os repetidos bombardeamentos a edifícios residenciais em Kharkiv são ataques indiscriminados que mataram e feriram centenas de civis e, como tal, constituem crimes de guerra”, lê-se no relatório da ONG.

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