Igreja recebeu do Vaticano explicações sobre acesso aos arquivos pela comissão que estuda abusos

Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa precisa que não é ainda uma autorização para consultar os arquivos

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Pedro Strecht e D. José Ornelas numa das conferências da comissão Daniel Rocha

O presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) disse esta sexta-feira que aquele órgão já recebeu do Vaticano “uma explicação dos parâmetros” que devem orientar o acesso aos arquivos eclesiásticos pela comissão que estuda os abusos no seio da Igreja.

“Acabámos de receber uma explicação - não é uma autorização - dos parâmetros em que se move tudo isto, concretamente, também, em relação aos arquivos eclesiásticos que nós temos e não queremos que sejam para guardar coisas que não prestam, mas para defender a dignidade das pessoas”, disse José Ornelas, em Fátima, no final da Peregrinação das Crianças.

As explicações do Vaticano surgem na sequência das reuniões que a CEP teve em Roma, no dia 18 de Maio, com os prefeitos das congregações para os Bispos e para a Doutrina da Fé, para debater a questão dos abusos sexuais no seio da Igreja.

Na ocasião, em comunicado, a CEP sublinhou que “a partilha de experiências (...) foi enriquecedora e os vários intervenientes manifestaram o seu apreço pelos passos dados pela Conferência Episcopal Portuguesa e pela Comissão Independente, e com quantos com ela colaboram, e reafirmaram a importância de estudar os casos de abuso sexual, acompanhar as vítimas e actuar preventivamente”.

Esta sexta-feira, José Ornelas assegurou que de Roma não veio “propriamente uma permissão” para o acesso aos arquivos, mas antes uma explicação de como isso deve acontecer. “Está tudo muito claro”, disse aquele responsável, apontando para a “etapa” que será a consulta dos arquivos diocesanos.

“Temos de ter em atenção aquilo que é a defesa dos direitos de cada pessoa, o segredo de justiça, a protecção de dados individuais, para que, de facto, se faça realmente justiça”, disse o também bispo de Leiria-Fátima.

Este trabalho de articulação obriga a “combinar a lei portuguesa com as prescrições do Direito Canónico”, referiu o prelado, segundo o qual a Igreja Católica quer que, “de facto, se faça justiça e se esclareça, se faça luz” sobre o assunto.

“Não é agora que vamos pôr tudo na praça pública, porque esse não é o modo de fazer justiça, porque vamos criar outras injustiças, e não é na rua que se faz justiça neste género [de casos]”, prosseguiu.

Por outro lado, José Ornelas disse que não interessa à Igreja “apenas a questão penal”. “Aquilo que mais nos move é fazer justiça às pessoas que sofreram dramas enormes na sua vida e que agora precisam, pelo menos, de ser escutadas. Isso é a nossa primeira vontade”, acrescentou.

A CEP decidiu criar, no final de 2021, a Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais contra as Crianças na Igreja Católica Portuguesa, coordenada pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht, e que iniciou os trabalhos no início deste ano.

Até agora, a comissão recebeu já mais de 300 denúncias, tendo encaminhado para o Ministério Público 16, como foi divulgado no dia 10 de Maio, numa conferência sobre o tema, que decorreu na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.