A quatro dias da ida às urnas, incerteza domina as legislativas francesas

Primeira volta realiza-se no domingo e a polarização entre Macron e Mélenchon está no centro de uma campanha até agora morna. A abstenção pode bater recordes.

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Jean-Luc Mélenchon assumiu-se como principal opositor a Macron e acredita que será nomeado primeiro-ministro Reuters/SARAH MEYSSONNIER

Pouco passava das 11 horas do sábado passado quando uma patrulha policial mandou parar um carro no 18.º bairro de Paris. Dentro da viatura estavam quatro pessoas e uma delas estaria sem cinto de segurança. Segundo a polícia, o condutor não obedeceu à ordem de paragem e acelerou. Os agentes dispararam sobre o veículo, provocando ferimentos graves em dois ocupantes. Uma mulher de 21 anos morreu no hospital no dia seguinte.

“A polícia mata”, escreveu Jean-Luc Mélenchon pouco depois no Twitter. E com três palavras apenas incendiou a campanha para as legislativas francesas.

O líder da Nova União Popular Ecologista e Social (NUPES) – a aliança de esquerda que congrega o França Insubmissa, ecologistas, socialistas e comunistas – teve resposta directa da primeira-ministra, Élisabeth Borne, que considerou “muito chocante” e “totalmente ultrajante” a forma como Mélenchon se refere à polícia francesa. Mas este não se ficou e apelidou Borne de ser uma “tecnocrata sem coração, sem compaixão humana”.

A troca de adjectivações reflecte o nervosismo que se apoderou da NUPES e da Juntos, a coligação que apoia Emmanuel Macron, na recta final de uma campanha eleitoral que a generalidade dos analistas considera estar a ser praticamente não existente e que galvanizou pouco os franceses.

A quatro dias da primeira volta, que se realiza no próximo domingo, as sondagens deixam tudo em aberto. A que o Le Monde divulgou esta quarta-feira dá 28% das intenções de voto à coligação de Macron e 27,5% à NUPES, mas um número de deputados mais confortável ao Presidente: 275 a 315 eleitos, contra 160 a 200 da coligação de Mélenchon.

Já o estudo de opinião revelado na terça-feira pela televisão TF1 deixa os apoiantes de Macron mais nervosos. O Juntos conseguiria 250 a 290 lugares na Assembleia Nacional, ficando em risco a maioria absoluta (que se obtém com 289 deputados). “São 20 lugares perdidos numa semana”, comentou Frédéric Dabi, director da empresa de sondagens Ifop, sublinhando a tendência de queda da coligação presidencial. “A esquerda pode obter três vezes mais lugares do que em 2017, o que era algo completamente inesperado se pensarmos no estado da esquerda antes das Presidenciais.”

Animada por essa ideia, a NUPES está apostada em criar um cenário de coabitação entre uma maioria parlamentar de esquerda e um Presidente centrista (que a esquerda vê como sendo da direita neoliberal). Jean-Luc Mélenchon não é candidato a nenhum dos 577 lugares da Assembleia, mas personalizou a campanha para se tornar primeiro-ministro, e Macron puxou da prerrogativa presidencial: “O Presidente escolhe a pessoa que nomeia primeiro-ministro tendo em conta o Parlamento. Nenhum partido político pode impor um nome ao Presidente”, declarou.

Abstenção recorde?

Nos círculos do estrangeiro, a primeira volta das legislativas já se realizou durante o fim-de-semana passado. Os candidatos por Emmanuel Macron ficaram à frente em oito das 11 circunscrições, enquanto os da NUPES venceram em duas e conseguiram apurar-se para a segunda volta em 10. A coligação presidencial “perdeu pontos em quase todas por comparação a 2017”, analisou o comentador político Matthieu Croissandeau na BFMTV.

A segunda volta das eleições realiza-se a 19 de Junho. Quem já não vai estar no boletim de voto é o ex-primeiro-ministro Manuel Valls, que era candidato da coligação macronista por Espanha, Portugal, Marrocos e Andorra, e que ficou em terceiro lugar no sufrágio.

Se a polarização entre Macron e Mélenchon parece encaminhar o Parlamento francês para uma aparência mais próxima à da Câmara dos Comuns inglesa, a prestação eleitoral da extrema-direita ainda é uma incógnita. As sondagens dão à volta de 20% para a União Nacional, de Marine Le Pen, e 5% para o Reconquista, de Éric Zemmour. A verificarem-se estes números, os três blocos conseguiriam 80% dos lugares parlamentares, esmagando os Republicanos, dissidentes e partidos regionais.

O que as sondagens também dizem é que estas legislativas, pelo menos a primeira volta, podem bater o recorde de abstenção que tem sido sucessivamente ultrapassado em todas as eleições para a Assembleia. Há cinco anos, 51,3% dos eleitores não foram às urnas. Este ano, o valor pode chegar aos 56%, segundo as previsões mais pessimistas. É nas faixas etárias entre os 18 e os 49 anos que se registam as menores percentagens de interesse na participação eleitoral.

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