Zlatan já encara a sua própria mortalidade
Aos 40 anos, o avançado sueco ainda não pensa em retirar-se, mas diz que está em “pânico” com um final de carreira cada vez mais próximo.
O AC Milan regressou aos títulos 11 anos depois, um período em que a Série A foi um dos campeonatos mais monótonos do planeta – nove “scudetti” em dez possíveis para a Juventus – e este é um título com muitos pais. De Stefano Pioli, o treinador que teve tempo, a Paolo Maldini, “il capitano” promovido a director desportivo, passando por Olivier Giroud, o francês que se reencontrou com os golos em San Siro, Rafael Leão, o jovem português “cento milioni”, Maignan, o francês que fez esquecer o “traidor” Donnarumma na baliza, ou Sandro Tonali, o centro de gravidade no meio-campo. Mas este título também é filho de Zlatan Ibrahimovic, o imortal avançado sueco que, aos 40 anos, está obrigado a encarar a sua própria mortalidade. E está a entrar em pânico.
Zlatan é o elo entre os dois últimos títulos do AC Milan. Ele esteve presente no de 2011, no crepúsculo da era Berlusconi em San Siro, e antes de uma crise que iria deixar os “rossoneri” sem luz ao fundo do túnel. Claro que, há 11 anos, Ibrahimovic estava na plena posse dos seus poderes, um goleador quase sem rival no futebol mundial. Em 2022, o sueco já não é esse jogador, mas continua a ser fundamental. E no campo do Sassuolo, após o jogo que deu o título em que teve uma participação residual, lá estava ele, a celebrar, com um charuto na boca.
Mais do que em qualquer época da sua longa carreira de 23 anos (com a excepção dos primeiros tempos no Malmo e daquele ano no Manchester United em que se lesionou gravemente), Zlatan foi mais suplente utilizado do que titular. Noutros tempos, um treinador estaria a assinar a sua sentença de “morte” se deixasse o sueco no banco, mas ele abraçou a condição de suplente de luxo e o papel de mentor para alguns dos jovens da equipa, entre eles Rafael Leão.
O jovem internacional português é agora uma das figuras dos “rossoneri”, valorizado em 100 milhões de euros pela imprensa italiana pela extraordinária época que fez, a sua terceira no AC Milan – 14 golos e 12 assistências, três delas no jogo do título com o Sassuolo. Um enorme salto estatístico em relação aos dois anos anteriores, com um empurrão de “Ibra”. “Ele aperta muito comigo nos treinos”, contou há uns tempos o jovem português, eleito como o melhor jogador da Série A esta época.
“Tenho uma responsabilidade, tenho colegas que me admiram. Penso na minha experiência, nos meus antigos colegas, em todos os treinadores que tive… Na minha idade, tenho de retribuir. Quando era novo, só queria tirar sem dar nada em troca. Nesta idade, já não tenho nada a provar e não preciso de provar nada a ninguém há vários anos. Esta é uma equipa jovem, eu sou quem sou, e tento dar o meu apoio, dentro e fora do campo. Tento ser um líder à minha maneira”, reconheceu o sueco numa entrevista recente à ESPN.
Quase 600 golos
Quando regressou a San Siro, no final de 2019, Zlatan prometeu que não iria retirar-SE enquanto o AC Milan não fosse campeão, dando a entender que esta seria a sua última paragem antes do fim, um último “hurrah” de uma carreira que começou no século passado, no longínquo ano de 1999, no clube da sua cidade natal, Malmo. Agora, está quase a chegar aos 600 golos (592), números construídos em nove equipas diferentes e na selecção sueca: PSG (156), AC Milan (92), Inter Milão (66), Los Angeles Galaxy (53), Ajax (48), Manchester United (29), Juventus (26), Barcelona (22), Malmo (18) e Suécia (62).
Em San Siro, cumpriu o seu papel. Ajudou a estancar a hemorragia e foi devolvendo o optimismo aos “rossoneri”. Nessa primeira metade de época, marcou 11 golos, na temporada que se seguiu marcou 17, seguindo-se uma rara época em que não chegou aos dois dígitos: apenas oito golos marcados, também porque foi titular em cerca de um terço dos jogos do AC Milan na Série A, entrando muitas vezes em campo para o lugar do igualmente veterano Olivier Giroud (35 anos).
Nas celebrações do título, Zlatan abriu à porta a um eventual final de carreira, embora tudo dependa, como sempre, da sua condição física. “Vou continuar a jogar se me sentir bem. A decisão será tomada em breve. Tive muitos problemas físicos esta época, mas vou decidir rapidamente”, disse Zlatan, depois de conquistar o 33.º título da sua carreira.
Isto é um homem que gosta de se apresentar como Deus a reflectir sobre a sua mortalidade como jogador. Há uns dias, numa entrevista, o sueco dizia-se “em pânico” com a perspectiva de deixar de jogar futebol. “Estou numa situação em que estou próximo da linha de golo… Sinto-me um bocadinho em pânico”, contou à ESPN. “Porque, quando parar, o que é que vou fazer? Sei que posso fazer muitas coisas, vou ter muitas ofertas de todo o lado. Mas a adrenalina que tenho no campo, nunca voltarei a ter noutro lado. Tentei adiar. Vou tentar adiar o máximo que conseguir.”