Pobreza: um assunto de todos

Enquanto a pobreza for vista como um problema dos outros, ou daqueles que “não querem trabalhar”, não o poderemos verdadeiramente resolver nem trabalhar em instrumentos e mecanismos de erradicação, que é o primeiro dos 17 Objectivos de Desenvolvimento Sustentável para 2030.

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Paulo Pimenta

Há uma conta que não pára de crescer e à qual nenhum de nós pode ficar indiferente. O número de pessoas a viver na pobreza e na pobreza extrema, em todo o mundo, tem subido violentamente ao longo dos últimos dois anos, aos quais, para além de todas as assimetrias que já vinham a ser discutidas, debatidas e estudadas, se somam a pandemia e a guerra. E este é um assunto que nos diz respeito a todos.

Várias vezes, nos relatórios das grandes organizações mundiais, como as Nações Unidas ou o Banco Mundial, o problema é levantado e são sugeridas medidas de combate e prevenção. E cada vez o panorama é pior. Os ricos cada vez mais ricos, os pobres cada vez mais pobres. Para termos uma ideia do que estamos a falar, o Banco Mundial já tinha estimado que 198 milhões de pessoas passariam a viver em pobreza extrema e, agora, a Oxfam estima que poderão ser mais de 250 milhões de pessoas. Cerca de metade da população europeia.

Por norma não é muito difícil estimar quem é que vai ser mais penalizado quando falamos de desigualdades e pobreza. São as mulheres e as crianças quem mais sofrem com este flagelo, que é mundial. Regionalmente, é na África Subsariana onde as dificuldades são mais agudas e onde há mais trabalho a fazer. Para trazer alguns números, estima-se que os preços da comida tenham subido 17% nos países ricos e 40% nesta região tão necessitada. Não quer isto dizer que não tenhamos trabalho a fazer na Europa ou em Portugal, bem pelo contrário.

Nas primeiras sessões plenárias na nossa Assembleia da República, vimos o debate vir para cima da mesa porque há, no Parlamento, quem se oponha à ideia de taxar mais aqueles que têm vindo a lucrar, deliberadamente, através da guerra.

No programa de Governo apresentado há dias, a palavra pobreza aparece 30 vezes, incluindo quando de energia se trata. Há um subcapítulo dedicado apenas à erradicação da pobreza, com quatro páginas. Nelas, o Governo propõe-se a retirar da pobreza 660 mil pessoas; destas, 170 mil são crianças e 230 mil trabalhadores pobres. Aproximar a taxa de privação material à média europeia e ainda reduzir a disparidade de pobreza territorial em Portugal para um máximo de três pontos percentuais. Se estas são as metas, quer isto dizer que temos muito a fazer, aqui, em Portugal. Muitas destas pessoas podemos ser mesmo nós, que lemos este texto, o nosso familiar ou mesmo o vizinho da porta ao lado.

Neste problema é importante que a abordagem não seja entre eles e nós. Não existe isso. Existimos todos. Viu-se, com a distribuição das vacinas pelo mundo, que o mundo não ficou um lugar melhor como muitos achavam no início desta pandemia. E, não, não ficou tudo bem.

Enquanto a pobreza for vista como um problema dos outros, ou daqueles que “não querem trabalhar”, não o poderemos verdadeiramente resolver nem trabalhar em instrumentos e mecanismos de erradicação, que é o primeiro dos 17 Objectivos de Desenvolvimento Sustentável para 2030.

Então o que é que se pode fazer? Algumas das medidas sugeridas nos relatórios, e das quais sou a favor, são a progressividade de impostos mais acentuada e o adiamento do pagamento de parte das dívidas externas de países altamente endividados (libertando, assim, 27 mil milhões de euros), quase como as moratórias que salvaram muitas das nossas famílias de entrar em incumprimento com os credores, mas também nos rendimentos e no trabalho. Outra medida seria libertar do fundo de austeridade (sabias que existe?) cerca de 92 mil milhões de euros para canalizar para as populações mais afectadas.

Temos muito trabalho a fazer. Se existe dinheiro para umas coisas, para o básico é que tem de existir mesmo. Não podemos deixar ninguém para trás e esta tem de ser a nossa orientação e vontade política.

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