110 Histórias, 110 Objectos: os robôs futebolistas
O podcast 110 Histórias, 110 Objectos, do Instituto Superior Técnico, é um dos parceiros da Rede PÚBLICO.
No podcast 110 Histórias, 110 Objectos, um dos parceiros da Rede PÚBLICO, percorremos os 110 anos de história do Instituto Superior Técnico (IST) através dos seus objectos do passado, do presente e do futuro. Neste 41.º episódio do podcast, conhecemos os robôs futebolistas do Instituto Superior Técnico.
Um pequeno robô está em campo, faz uma rotação e visualiza a baliza. Não pode chutar porque ainda não tem a bola. Mas guarda a informação. Roda novamente para olhar à sua volta, desta vez encontra e alcança a bola e como se “lembra” onde viu a baliza, vira-se para o lado certo, remata e… está feito o primeiro golo de sempre dos robôs do Técnico no RoboCup! Estávamos em 1998 e o IST dava os primeiros passos nas competições internacionais que misturavam futebol e robótica.
“Nessa altura os robôs praticamente não se mexiam. Até “ver” onde estava a bola já era um sucesso, que é uma coisa que parece trivial. Jogava-se para o zero a zero”, recorda Pedro Lima, professor do departamento de Engenharia Electrotécnica e de Computadores do IST e investigador no Instituto de Sistemas e Robótica (ISR). No seu gabinete, situado na Torre Norte do campus Alameda do Técnico, acumulam-se taças, cachecóis, bolas de futebol, artigos sobre a participação portuguesa nessas competições e muitas memórias de “cargas de ombros e caneladas” entre robôs.
Os robôs futebolistas do Técnico, hoje representados por este exemplar que não foi desmantelado, foram dos primeiros do país a participar na Middle Size League, uma das categorias da RoboCup, competição internacional de robôs. Trata-se de um computador com rodas e com sensores que pode ser visto nas vitrines da entrada principal do ISR, na Torre Norte. Com cerca de 80 centímetros de altura e com cilindros de aproximadamente 40 centímetros de diâmetro, é constituído por uma caixa, onde se situa uma motherboard, por rodas com motores e um dispositivo baseado nos motores de abrir as portas dos automóveis “comprado na Feira da Ladra ou coisa parecida” que estava ligado a um dispositivo de chuto. Tinha uma câmara que olhava para a frente (mais tarde foi introduzido um sistema de visão omnidireccional) e um algoritmo “extremamente simples” que ainda hoje “espanta como era tão eficaz”. “É um robô móvel que pela primeira vez nos permitiu integrar a visão, o controlo e o movimento, tudo numa máquina só”, recorda.
O IST entrou assim, desde muito cedo, neste evento (que é científico e não desportivo), actualmente um dos de maior dimensão na área da robótica. A iniciativa desafia os paradigmas da investigação na área, criando competições em torno de objectivos comuns. O RoboCup surgiu em 1997, por iniciativa de um grupo de investigadores japoneses, após os mediáticos jogos de xadrez entre o supercomputador Deep Blue e o campeão mundial de xadrez, Garry Kasparov. “Quiseram lançar um novo desafio para a Inteligência Artificial”, explica Pedro Lima. “A ideia era passar para outro desafio: um jogo dinâmico, em que a bola e os adversários vão mover-se para todo o lado, em que todos os aspectos que os robôs têm que abordar, sobretudo a percepção, vão ser fundamentais”, complementa.
Depois do xadrez virava-se a atenção para o futebol, uma modalidade capaz de atrair ainda mais pessoas. “Em 1998, metemo-nos numa carrinha e fomos até Paris, na altura com três robôs”, recorda. Foi a primeira competição de sempre com participação de equipas portuguesas. Antes, em 1997, já tinha havido uma competição em Loures, apadrinhada por Mariano Gago, na altura Ministro da Ciência e Tecnologia. E em 2004 encheu-se um pavilhão inteiro da Feira Internacional de Lisboa (FIL) com centenas de robôs e cerca de 4 mil participantes.
Muito para além dos holofotes da competição, o RoboCup é também um laboratório vivo de investigação fundamental na área da robótica. “Muitas vezes a investigação aprofunda aspectos específicos, como a percepção, a navegação e o controlo”. Aqui o que tínhamos que aprofundar era a integração de todos estes temas: percepção, raciocínio, acção”, explica Pedro Lima. “O objectivo é resolver os vários problemas técnicos, tirando ilações para outros robôs”, complementa. E têm saído da competição conhecimentos com aplicação em robôs cruciais para operações de busca e salvamento (outra das vertentes do evento) em grandes tragédias ou mesmo para robôs de transporte em armazéns de empresas de entregas.
No Técnico, a participação no RoboCup espelha a experiência na área de robôs colaborativos, que junta investigadores das áreas da inteligência artificial e do controlo automático. “Fomos pioneiros em termos nacionais. Nem sabíamos que havia futebol robótico e a RoboCup”, recorda. A informação chegou através de Manuela Veloso, antiga aluna do Técnico e actualmente investigadora na Carnegie Mellon University, que deu uma palestra sobre a RoboCup, em 1997, com a seguinte mensagem como complemento: “Vocês têm que ir ao próximo...”. E assim foi. Com o projecto surgiram também várias teses de mestrado e doutoramento feitas por alunos do Técnico.
Em 2013, o IST abandonou as competições de futebol no RoboCup, tendo continuado nas ligas de busca e salvamento e robôs domésticos. Quanto à versão futebolística do RoboCup, o objectivo competitivo mantém-se intacto desde o início: “Que em 2050 uma equipa de robôs seja capaz de derrotar o campeão humano da altura”. E Pedro Lima não arrisca prognósticos: “Por um lado espero não estar vivo em 2050 porque depois vão-me confrontar com o objectivo. Não ponho as mãos no fogo se vão ou não conseguir”.
O podcast 110 Histórias, 110 Objectos é um dos parceiros da Rede PÚBLICO. É um programa do Instituto Superior Técnico com realização de Marco António (366 ideias) e colaboração da equipa do IST composta por Filipa Soares, Sílvio Mendes, Débora Rodrigues, Patrícia Guerreiro, Leandro Contreras, Pedro Garvão Pereira e Joana Lobo Antunes.
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