Encenador russo Kirill Serebrennikov autorizado a abrir Festival de Avignon
Apesar de proibido de viajar para fora do país até Junho de 2023, as autoridades acederam ao seu pedido para apresentar em França a sua última encenação, inspirada numa novela de Tchékhov.
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O encenador e realizador Kirill Serebrennikov foi autorizado pelas autoridades russas apresentar a sua encenação de O Monge Negro, de Tchékhov, na abertura do próximo Festival de Avignon, no próximo dia 7 de Julho, não obstante a condenação judicial que o proibiu de viajar para fora do país por um período de três anos, que só expirará em Junho de 2023.
O próprio Serebrennikov diz não ter “a mínima ideia” do que que levou as autoridades russas a responderem agora positivamente ao seu pedido para estar presente em Avignon. Uma solicitação semelhante fora-lhe recusada em 2021, quando quis viajar também para França, onde o seu filme Petrov’s Flu (A Gripe de Petrov) concorria à Palma de Ouro do Festival de Cinema de Cannes.
A notícia de que o encenador irá estar em Avignon foi confirmada à imprensa francesa pelo director delegado do festival, Paul Rondin, que adiantou a intenção de abrir o programa com O Monge Negro, que Sebrennikov já apresentou em Janeiro em Hamburgo, na Alemanha, mas cuja encenação irá agora retrabalhar para esta estreia em França.
A autorização agora concedida pelas autoridades russas já tinha, portanto, um precedente. Os responsáveis do Festival de Avignon terão razões, mesmo assim, para estar positivamente surpreendidos, mas não tanto quanto Joachim Lux, o director artístico do Thalia Theater, em Hamburgo, quando recebeu Sebrennikov no aeroporto daquela cidade alemã, a 8 de Janeiro deste ano. Contra todas as expectativas – “um grande milagre”, comentou Lux na ocasião –, o encenador fora autorizado a permanecer algumas semanas em Hamburgo para preparar a apresentação de O Monge Negro, cuja bem-sucedida estreia teve lugar a 22 de Janeiro no Thalia Theater.
A última vez que Sebrennikov estivera em Avignon fora em 2019, para apresentar a peça Outside, centrada na vida do poeta e fotógrafo autodidacta chinês Ren Hang, que se suicidou em 2017, e cujas obras, designadamente os seus nus fotográficos, foram atacadas e censuradas pelo regime chinês, que deteve várias vezes o artista.
Não surpreende o interesse de Sebrennikov por Ren Hang, já que a reacção das autoridades russas ao seu trabalho tem sido bastante semelhante. Quer pela sua abordagem de temas políticos e religiosos, quer sobretudo pela forte presença da homossexualidade, hoje um tema praticamente proibido na sociedade russa.
Embora não seja um opositor declarado do governo de Putin, o encenador tem criticado o cerceamento da liberdade artística, vem defendendo publicamente a comunidade LGTB e criticou, em 2014, a anexação da Crimeia.
Em Agosto de 2017, foi detido e acusado de uma fraude envolvendo subsídios estatais num valor equivalente a dois milhões de dólares, tendo ficado um ano e meio em prisão domiciliária. No início de 2020 foi finalmente a julgamento, que durou seis meses, tendo terminado com a aplicação de uma multa e de uma pena suspensa de três anos de prisão, com proibição de viajar para o estrangeiro, sentença criticada na ocasião pela organização não-governamental Human Rights Watch.
A confirmação de que poderá agora mostrar o seu trabalho em Avignon acaba por ser uma notícia um tanto a contracorrente, não tanto pela ocasional condescendência do regime de Putin, mas por ocorrer num momento em que, após a invasão da Ucrânia, muitos artistas russos estão a ser banidos das programações das instituições culturais europeias.