FMI alerta para possível recessão sem precedentes na Ucrânia

PIB do país invadido pela Rússia a 24 de Fevereiro deverá recuar 10% “no mínimo”, depois de um crescimento de 3,2% em 2021. A nível global, conflito põe em perigo a segurança alimentar mundial, alerta a instituição.

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Reuters/Valentyn Ogirenko

O Governo ucraniano continua funcional, o sistema bancário estável e a dívida viável a curto prazo, mas a guerra na Ucrânia pode levar a uma recessão sem precedentes, alertou hoje o Fundo Monetário Internacional (FMI).

“No mínimo”, o Produto Interno Bruto (PIB) ucraniano registará uma contracção de 10% em 2022, na hipótese de “uma resolução rápida” do conflito e contando com ajuda internacional “substancial”, de acordo com uma primeira estimativa do FMI.

Mas, a incerteza quanto a previsões é “enorme” e se o conflito se prolongar, tendo como base o que se passou em guerras anteriores no Líbano, no Iraque, na Síria e no Iémen, o PIB ucraniano pode afundar entre 25 e 35%, muito mais do que a contracção de 10% registada em 2015, num contexto da ofensiva russa na Crimeia, iniciada em 2014.

O crescimento na Ucrânia pode ter atingido no ano passado 3,2%, impulsionado pela procura interna e pelas exportações.

Mas desde a invasão do país pela Rússia, no dia 24 de Fevereiro, a “economia ucraniana mudou radicalmente”, sublinhou Vladyslav Rashkovan, director-executivo do FMI que representa a Ucrânia, numa declaração datada de 9 de Março e publicada esta segunda-feira.

“No dia 6 de Março, 202 escolas, 34 hospitais, mais de 1500 habitações, dezenas de quilómetros de estradas e numerosas infra-estruturas em várias cidades ucranianas foram total ou parcialmente destruídas pelas tropas russas”, indicou, com base em informações comunicadas pelo Governo ucraniano. Os aeroportos e portos marítimos foram fechados devido à “destruição maciça” e desde essa data muitos outros danos foram causados.

No dia 10 de Março, Oleg Ustenko, conselheiro económico do Presidente ucraniano, deu uma primeira estimativa dos danos de 100 mil milhões de dólares.

Apesar dos importantes estragos, o Governo e o país continuaram até agora funcionar. “Os bancos estão abertos e funcionam mesmo ao fim de semana”, assinalou Vladyslav Rashkovan. No curto prazo, a viabilidade da dívida “não parece ameaçada”, segundo o FMI.

“Dados preliminares mostram que a 1 de Março de 2022, as reservas internacionais da Ucrânia eram de 27,5 mil milhões de dólares, cobrindo 3,8 meses das actuais importações, valor suficiente para a Ucrânia cumprir os seus compromissos”, detalhou Rashkovan.

Segurança alimentar em perigo

Além das perdas humanas e económicas, o FMI está preocupado com as consequências do conflito no mundo, que põe em perigo a segurança alimentar mundial, segundo a instituição.

Em três semanas de guerra, os preços da energia, das matérias-primas e produtos agrícolas dispararam. No que diz respeito ao trigo, os efeitos podem ser ainda mais dramáticos, assinalou a instituição.

“As perturbações na temporada agrícola da Primavera podem travar as exportações, bem como o crescimento e comprometer a segurança alimentar” mundial, segundo os autores do relatório. Tanto a Ucrânia como a Rússia estão entre os maiores exportadores mundiais de trigo. A maior parte do trigo ucraniano é exportada no Verão e no Outono. Quanto mais a guerra durar, mais as exportações ficarão comprometidas, com impacto nas reservas actuais e futuras.

“As perturbações nas exportações no Mar Negro têm efeitos imediatos para países como o Egipto, que são fortemente dependentes das importações de cereais provenientes da Rússia e da Ucrânia”, destacou o Programa Mundial de Alimentos (PAM) num relatório divulgado na sexta-feira. O impacto também será significativo em países como o Afeganistão, Etiópia, Síria e Iémen “devido à sua dependência do trigo”, apontou.

“A guerra na Ucrânia significa fome em África”, afirmou no domingo Kristalina Georgieva, directora-geral do FMI, em declarações na CBS News.