Casos de covid-19 voltam a subir: “Vamos ter aqui uma espécie de montanha-russa”
Para o epidemiologista Manuel Carmo Gomes, Portugal vai assistir a um efeito de montanha-russa no que toca aos contágios por covid-19, “mas em que cada um dos picos da montanha vai ser inferior ao pico anterior”. Especialistas alertam que se a subida for muito acentuada poderá atrasar o atingir da meta para o último levantamento de restrições.
O levantamento de restrições de combate à pandemia de covid-19 em Portugal, que teve lugar em meados de Fevereiro, já se reflecte no aumento de contágios e transmissibilidade, refere o matemático Óscar Felgueiras em declarações ao PÚBLICO. Este “recrudescimento” de infecções, que já se verifica há cerca de duas semanas, está também associado à prevalência da sublinhagem BA2 da variante Ómicron do SARS-CoV-2, actualmente dominante em Portugal. Manuel Carmo Gomes, epidemiologista, acredita que se está a verificar um efeito de “montanha-russa” nos contágios.
“As medidas foram levantadas já quase há três semanas. Numa primeira fase, isso traduziu-se num abrandamento do ritmo de descida no número de novos casos e, entretanto, já está a dar-se um aumento de transmissibilidade”, refere Óscar Felgueiras.
O maior aumento de infecções tem-se verificado nas faixas etárias dos jovens: dos 12 aos 17 anos e dos 18 aos 24 anos. Para Manuel Carmo Gomes, a explicação para o recrudescimento nestes grupos etários não se justifica apenas com um único factor, mas antes por “um conjunto” deles: “A explicação do carnaval poderá ter sido apenas uma gota de água.” É por isso que o epidemiologista correlaciona o aumento de casos com a dominância da linhagem BA2 no país e com a perda de protecção contra infecção conferida pelas vacinas e por contágio prévio, que diminui com o tempo.
Para o especialista, o volume de pessoas que está, por isso, propensa a infecção continua a ser elevado, o que, a reboque de uma linhagem mais contagiosa, faz disparar os contágios. “Vamos ter aqui uma espécie de montanha-russa, mas em que cada um dos picos da montanha vai ser inferior ao pico anterior”, reflecte. “A dinâmica das subidas e descidas é a maneira como nós, humanos, nos expomos ao vírus.”
Isso significa que é esperado que o aumento de casos que actualmente se verifica não atinja valores próximos daqueles que existiram na quinta vaga da pandemia, em Janeiro último, quando se chegaram a verificar 65.706 casos de infecção num único dia. De acordo com o boletim epidemiológico desta quarta-feira, referente à totalidade do dia anterior, verificaram-se 14.595 novos casos de covid-19 em Portugal.
Para Óscar Felgueiras, o que impede que os contágios atinjam novamente valores tão elevados quanto os já registados no início do ano é a elevada taxa de vacinação contra a covid-19 em Portugal, a par da protecção conferida através da infecção natural. “Por enquanto, estamos ainda sujeitos a um certo recrudescimento de casos, embora, esperemos, com um impacto menor em doença grave e internamento hospitalar”, reforça, acrescentando que também concorda com o exemplo da “montanha-russa” dado por Carmo Gomes. “Perante as novas condições [de aligeiramento de medidas] que temos nestas últimas semanas, o percurso natural é que haja de facto uma maior transmissibilidade e cheguemos mesmo a ter um aumento” de casos, justifica.
Meta para o fim das restrições em causa
No que toca às mortes por covid-19, que por norma registam um atraso em relação à subida de casos e que actualmente continuam com tendência decrescente, poderão, se a subida for muito acentuada, pôr em risco a data apontada (final de Março ou início de Abril) para conseguir atingir a meta que dita o último levantamento de medidas restritivas em Portugal, dizem os dois especialistas ouvidos pelo PÚBLICO. Contudo, é difícil de fazer este cálculo uma vez que, como explica Carmo Gomes, “depende dos comportamentos humanos”.
“As mortes andam sempre com muito atraso em relação aos picos [de casos] da epidemia, que já começaram a descer há muito tempo e agora já estão a subir, mas as mortes continuam a descer. Reagem com muito atraso. É evidente que vamos ter uma subida no número de casos e, se ela for muito significativa, a certa altura as mortes começam a subir novamente também”, justifica o epidemiologista.
Apesar disso, diz que “isto não é um drama” e não encontra razão para que se olhe para esta subida com alarme, nem deverá servir para alterar as medidas já levantadas. “Não penso que isto seja razão para mudarmos a nossa política de saúde pública que aprovámos há umas semanas, até porque estamos a entrar num período mais favorável de Primavera e Verão. Além disso confirma-se que a doença não nos causa um impacto hospitalar significativo em medicina intensiva, por exemplo.”