Renovar a parceria Europa-África

Tribuna de opinião conjunta de Macky Sall, presidente do Senegal e da União Africana, e de Charles Michel, presidente do Conselho Europeu.

Nos dias 17 e 18 de fevereiro, os chefes de Estado ou de Governo da União Africana e da União Europeia reunir­‑se­‑ão numa cimeira em Bruxelas. A última Cimeira UA­‑UE realizou­‑se há mais de quatro anos, em novembro de 2017, em Abidjan.

A pandemia é, evidentemente, uma das razões que explicam o tempo decorrido desde o nosso último encontro. O seu surgimento reforça ainda mais a dimensão excecional que ambas as partes desejam imprimir a esta cimeira. O objetivo é nada menos do que estabelecer conjuntamente as bases de uma parceria renovada entre os nossos dois continentes, uma nova dinâmica em que temos vindo a pensar já há algum tempo. O crescimento, a prosperidade partilhada e a estabilidade são os grandes objetivos desta parceria. A nossa cimeira basear­‑se­‑á em dois princípios fundadores.

Respeito e valores

Os nossos dois continentes e os seus povos partilham a proximidade geográfica, línguas e laços humanos e económicos. A paz e a segurança dos nossos dois continentes são interdependentes. É por este motivo que o primeiro princípio fundador tem de ser o respeito. O futuro exige que aceitemos e respeitemos as nossas diferenças.

O segundo princípio fundador são os direitos e os valores da dignidade, da liberdade e da solidariedade, exercidos no quadro do Estado de direito e da boa governação. Esta base comum possibilita uma aprendizagem mútua diária.

Por último, o nosso projeto assenta em interesses comuns. No seu cerne está uma África próspera, estável, segura e sustentável, em plena posse dos seus recursos para enfrentar todos os desafios do futuro.

Uma parceria para a prosperidade

Uma parceria pressupõe intercâmbio e partilha. Cada um dos nossos dois continentes tem enormes valências que podem ser colocadas ao serviço deste projeto comum.

A UE proporcionará capacidades de investimento público e privado, bem como um saber­‑fazer em matéria de infraestruturas e de tecnologias ecológicas, que são essenciais para a nossa luta comum contra as alterações climáticas e para a transformação das economias africanas.

África tem recursos naturais importantes, uma população jovem e dinâmica pronta a ser mobilizada e capacidades de inovação e criação impressionantes.

Precisa, porém, de um melhor acesso aos recursos, nomeadamente através da reatribuição dos direitos de saque especiais numa base voluntária, para financiar as suas enormes necessidades de desenvolvimento económico e social.

Na mesma perspetiva, é desejável uma iniciativa destinada a aliviar a dívida dos países pobres, com vista a apoiar os esforços de resiliência e de recuperação dos países africanos.

Apelamos também a uma transição energética justa e equitativa que tenha em conta as necessidades específicas de África, nomeadamente para a sua industrialização e o acesso universal à eletricidade. Recordamos que mais de 600 milhões de africanos continuam sem acesso à eletricidade.

Uma parceria para a estabilidade

A nossa parceria reforçada colocará também a paz e a segurança no centro das suas prioridades. As ameaças revestem­‑se de uma natureza cada vez mais transnacional e complexa e pesam sobre todos nós, independentemente da forma que assumam, incluindo os ciberataques e os ataques híbridos.

Estas ameaças comuns exigem que continuemos a enfrentá­‑las em conjunto, inclusive em África, particularmente na luta contra o terrorismo.

Temos de continuar a refletir em conjunto, sob a égide da União Africana e da União Europeia, para coordenar melhor os nossos esforços nesta luta solidária contra um inimigo comum. Para fazer face a este enorme desafio, é necessário partir das causas profundas – a instabilidade e a radicalização – para se chegar à resolução sustentável das crises e à construção de uma paz real e duradoura.

Postos à prova pela pandemia

A pandemia pôs em evidência as nossas vulnerabilidades comuns, a nossa interdependência e, por conseguinte, a necessidade de agir em conjunto e de forma concertada para a superar e melhorar a nossa preparação para eventuais futuras crises sanitárias. A luta contra a covid-19 continua a ser uma prioridade imediata.

A Europa empenhou­‑se desde o início na organização e no financiamento da solidariedade internacional em matéria de vacinas, particularmente através do Mecanismo Covax. Até à data, a UE e os seus Estados­‑membros doaram quase 400 milhões de doses em todo o mundo, mais de 85 % das quais por via do Mecanismo Covax.

Com quase 130 milhões de doses entregues em África, a UE é um dos maiores doadores de vacinas ao continente africano. A UE está também a reforçar o seu apoio à administração das doses, visto que, com o aumento do aprovisionamento, o maior desafio será a implementação dos planos de vacinação.

Para além da solidariedade no domínio da doação de vacinas, o desafio que temos de superar em conjunto é também o da produção de vacinas e de outros produtos médicos e farmacêuticos em África, a fim de satisfazer as necessidades essenciais do continente. Saudamos e apoiamos os projetos já em curso no continente.

É fundamental adotar uma abordagem concreta: identificar os obstáculos e impedimentos às entregas, à armazenagem e à administração das doses, e eliminá­‑los, e, evidentemente, acelerar o desenvolvimento das capacidades locais de produção das vacinas em África, por parte de África e para África.

Por último, estamos convictos de que a solidariedade internacional em matéria de pandemias e de grandes crises sanitárias deve ser organizada de forma global, multissetorial e inclusiva. Lançámos e promovemos ativamente a ideia de um tratado internacional sobre pandemias. Esses esforços conjuntos dos europeus e dos africanos conduziram à decisão tomada recentemente pela Assembleia Mundial da Saúde de encetar negociações sobre um projeto de tratado, que deverá ser celebrado em março de 2024.

Um arco de paz

Assistimos ao aumento, no nosso mundo, dos riscos de confronto entre blocos. Face a esta tendência preocupante, acreditamos que África e a Europa podem trabalhar em conjunto na criação de um mundo melhor e mais seguro para todos, privilegiando o diálogo e a cooperação com base no respeito mútuo.

É neste espírito e com estes objetivos que nos preparamos, africanos e europeus, para arregaçar as mangas a fim de trabalhar por um futuro comum entusiasmante.

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