Arcebispo de Braga: “Vergonha e humilhação” pelos abusos na Igreja, que “chegou tarde”

“É uma crise grande que vivemos mas a crise é de purificação”, diz D. José Cordeiro, o novo responsável máximo pela Igreja Católica em Braga.

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A queda do número de católicos na Europa é “um enorme desafio” para a Igreja, diz D. José Cordeiro Cathal McNaughton/Reuters

O novo arcebispo de Braga, D. José Cordeiro, afirmou este sábado que a Igreja está a “sofrer muito” com a questão dos abusos sexuais, mas sublinhou que a aposta agora é “curar todas as feridas”, através do apuramento da verdade.

Em conferência de imprensa, após ter tomado posse como novo arcebispo de Braga, D. José Cordeiro admitiu sentir “vergonha e humilhação” pelos abusos sexuais no seio da Igreja.

“O contexto é de cuidar de todos, cuidar de todas as feridas. É uma crise grande que vivemos mas a crise é de purificação, porque é a verdade que nos liberta e a verdade pode custar e estamos todos a sofrer com isto, mas é para que ela nos liberte e para que a Igreja seja um lugar acolhedor, um lugar seguro, um lugar de paz e de reconciliação”, referiu.

D. José Cordeiro falava a propósito da Comissão Independente para o Estudo de Abusos Sexuais na Igreja Católica Portuguesa, que iniciou em Janeiro um período de recolha de denúncias de vítimas de casos ocorridos desde 1950, susceptíveis de serem remetidos às autoridades e serem investigados.

Num mês de funcionamento, a comissão independente que está a estudar os abusos sexuais na Igreja em Portugal desde 1950 recebeu 214 depoimentos. Na prática, os casos de abuso trazidos para cima da mesa poderão ser muitos mais, já que em muitos dos depoimentos as vítimas apontaram frequentemente “o conhecimento ou a forte probabilidade de, naquelas circunstâncias de tempo e espaço, outras crianças terem sido vítimas do mesmo abusador”, informou o grupo coordenado pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht, no dia 10 de Fevereiro.

Questionado pelos jornalistas se teme eventuais “surpresas” resultantes da acção desta comissão, D. José Cordeiro preferiu pôr a tónica no “cuidar das feridas” das vítimas e das respectivas famílias.

“Creio que a sociedade chegou tarde e a Igreja também, mas estamos em tempo de, juntos, com seriedade, com justiça, com caridade, com misericórdia, compaixão e ternura com as vítimas e com todas as pessoas que vivem esse sofrimento (…) dar voz ao seu silêncio e falar dele”, acrescentou.

Atenção às periferias

Até aqui bispo de Bragança-Miranda, D. José Cordeiro, de 54 anos, tomou posse como novo arcebispo de Braga, sucedendo a Jorge Ortiga, que ocupou o cargo durante 22 anos.

Na conferência de imprensa, disse que dedicará uma atenção especial aos pobres e aos jovens, mas também aos doentes, aos reclusos e às “periferias” assistenciais, sociais e geográficas.

Admitiu ainda que a diminuição do número de católicos na “velha Europa” é “preocupante” e constitui “um enorme desafio” para a Igreja.

“Não estamos preocupados com estatísticas, porque as estatísticas são a ruína da Igreja. Mas temos de tentar perceber as razões por que deixaram a Igreja, quais as feridas que existem e ser o azeite e o vinho, como o bom samaritano”, advogou.