Salgado pediu inquirição de 82 testemunhas na instrução do caso BES

Ivo Rosa diz que “não se alcança” qual “a utilidade para as finalidades da instrução na inquirição das 82 testemunhas”. Juiz quer “evitar a prática de actos inúteis ou com efeitos meramente dilatórios”.

Foto
Ricardo Salgado PAULO CUNHA/Lusa

O ex-banqueiro Ricardo Salgado pediu a inquirição de 82 testemunhas no âmbito da instrução do caso BES/GES, que passa a ter quatro novos arguidos por denúncia de assistentes no processo.

Segundo um despacho relativo à abertura da instrução do processo, a que a Lusa teve acesso, o juiz Ivo Rosa refere que da análise feita ao requerimento de abertura de instrução (RAI) de Ricardo Salgado “não se alcança […] qual a utilidade para as finalidades da instrução na inquirição das 82 testemunhas”, dado que “o arguido não concretizou a que matéria as testemunhas irão depor e qual a razão de ciência das mesmas”.

Também em relação ao arguido Amílcar Morais Pires, antigo administrador financeiro do BES, que arrolou 75 testemunhas para serem inquiridas em instrução, o juiz refere que, apesar de este “ter indicado as matérias sobre as quais as testemunhas devem depor, verifica-se que existem várias testemunhas indicadas sobre a mesma factualidade”.

No seu despacho, o juiz Ivo Rosa salienta que um dos princípios que regem as normas processuais é o da “economia processual”, mas também deve o juiz, “dentro dos seus poderes de direcção do processo, […] providenciar pelo seu andamento célere e evitar a prática de actos inúteis ou com efeitos meramente dilatórios”.

Com vista à “agilização processual”, o juiz determinou que os arguidos Ricardo Salgado e Amílcar Morais Pires, “no prazo de dez dias, indiquem quais os factos a que cada testemunha irá depor, assim como qual a razão de ciência das testemunhas em causa”.

O juiz deixou consignado no processo que o tribunal “apenas irá admitir […] a inquirição de duas testemunhas por cada facto ou conjunto de factos”.

Quanto às diligências de prova requeridas pela defesa de Ricardo Salgado no RAI, nomeadamente a prova pericial, o juiz refere que “no decurso da produção de prova o Tribunal melhor ponderará quanto à utilidade da mesma para as finalidades da presente instrução”.

Para contestar as imputações de burla qualificada e infidelidade que lhe foram feitas nas operações com as obrigações do BES, Ricardo Salgado requereu a produção de prova pericial, a realizar pela Faculdade de Economia da Universidade de Lisboa, para responder a várias questões sobre as operações daqueles produtos financeiros.

Com esta perícia, o ex-presidente do BES pretende apurar quais as emissões destas obrigações BES que foram colocadas no mercado secundário pelo banco desde 3 de Julho de 2014 até 2 de Agosto de 2014, na sequência da recompra realizada pelo BES destas mesmas obrigações antes da respectiva maturidade.

Pretende ainda que a perícia determine qual o montante do preço que o Novo Banco recebeu pelas recolocações das obrigações BES/Novo Banco, recolocadas no mercado secundário pelo Novo Banco, a partir de 4 de Agosto de 2014 até à presente data, bem como a quantificação dos respectivos ganhos.

Além de pedir a inquirição de 75 testemunhas, Amílcar Morais Pires pediu no seu RAI como meios de prova que o Banco de Portugal seja notificado para juntar aos autos vários documentos, entre os quais uma cópia integral do relatório elaborado pela Boston Consulting sobre a actuação do Banco de Portugal na supervisão e na resolução do BES.

Com esta diligência o arguido pretende fazer prova da alegada complacência durante anos do Banco de Portugal e da consultora KPMG quanto à relação do BES com o GES e o BESA (BES Angola), a desavença entre o Banco de Portugal e a KPMG, à actuação concertada de ambos contra o BES, o excessivo e ilegal aumento do passivo nas contas do BES do primeiro semestre de 2014, a resolução do BES e as suas implicações e a anulação das provisões.

Ao declarar aberta a instrução, o juiz Ivo Rosa aceitou o RAI dos assistentes/lesados Manuel Oliveira e Irene Oliveira, na qual estes pedem a pronúncia de Maria Beatriz Páscoa, Frederico Ferreira, Luís Miguel Neves e Rui Santos, gestores e directores intermédios do BES com responsabilidades na subscrição da dívida GES aos balcões do BES a clientes de retalho e private.

Estes assistentes pretendem que estes quatro funcionários do BES sejam pronunciados na instrução em co-autoria por um crime de abuso de confiança, um crime de burla qualificada e um crime de infidelidade.

A abertura de instrução foi requerida por 16 arguidos e nos autos estão constituídos até ao momento 123 assistentes.

Segundo o juiz Ivo Rosa, por força da lei processual “os denunciados […] assumem a qualidade de arguido nos presentes autos”, pelo que ficam sujeitos a termo de identidade e residência (TIR).

O despacho marca a inquirição de quatro dos arguidos para 22 de Fevereiro.

No âmbito da investigação ao processo BES/GES foram acusados pelo Ministério Público (MP) 25 arguidos (18 pessoas e sete empresas, nacionais e estrangeiras), destacando-se Ricardo Salgado, com 65 crimes de natureza económica e financeira, relacionados com a derrocada do Grupo Espírito Santo, que segundo o MP terá causado prejuízos superiores a 11 mil milhões de euros.

Paralelamente, Ricardo Salgado está já a ser julgado num processo conexo da Operação Marquês por três crimes de abuso de confiança, devido a transferências de mais de 10 milhões de euros.