A vacuidade do debate eleitoral
Durante os debates, não vimos sombra desse abanão tão necessário para sairmos deste marasmo em que a “geringonça” nos mergulhou (embora o mal já venha de trás).
Sou cliente de um oftalmologista proprietário da clínica onde exerce a sua profissão. Não sendo uma organização grande, é já suficientemente complexa para exigir a intervenção de um ou uma directora. Visitei-o há dias e contou-me esta história maravilhosa: tinha uma directora muito competente e pretendia aumentar-lhe o ordenado. Porém, feitas as contas, com essa melhoria salarial a funcionária perderia dinheiro. Porquê? Porque subia de escalão e o imposto comer-lhe-ia o aumento! Esta pequena história é uma perfeita parábola sobre o reino, não de Deus, mas do Portugal socialista. Um Portugal socialista em que todos estão de acordo que os nossos salários são baixos, mas ninguém se atreve a suprimir pelo menos alguns dos escalões que nos asfixiam.
Esta seria apenas uma das muitas reformas profundas de que Portugal necessita. Mas a impressão que temos é que nem esta nem outras jamais verão a luz do dia. O país está economicamente estagnado há pelo menos vinte anos. Mas a estagnação não se verifica apenas no domínio da economia. Verifica-se de um modo generalizado, como se Portugal tivesse atingido o estádio da petrificação: nada de importante muda ou se consegue mudar. É uma espécie de esqueleto bom para os estudantes de anatomia. Não faltam diagnósticos. Mas nada de essencial muda ou melhora, sobretudo em tudo o que são serviços do Estado, nomeadamente na Segurança Social e no SNS. Os mais novos vivem na ignorância a respeito da sua hipotética reforma, os de todas as idades vivem na ignorância a respeito de quando terão a sua consulta ou a sua cirurgia.
Não vale a pena endeusar o SNS como se fosse um totem intocável que presidiria à nossa democracia. O SNS está roto pelas costuras e, no entanto, com o argumento absurdo de que “a saúde não é um negócio” a nossa esquerda opõe-se com unhas e dentes às parecerias público-privadas, que poderiam aliviar ou mitigar as gritantes insuficiências do SNS.
Os privados lucram com isso? Claro que sim, só no reino de Deus é que haverá quem trabalhe de graça. E se o custo do recurso aos privados for mais económico do que o Estado paga em horas extraordinárias, em contratações de emergência e outros expedientes engendrados para tapar os buracos do SNS? Ou se o custo for comparável? Não serão as PPP um complemento benéfico para quem espera meses e até anos por uma consulta ou uma cirurgia? A rejeição das PPP é apenas mais uma manifestação do ódio ao capitalismo; é uma birra puramente ideológica. E devemos nós todos suportar as consequências de uma ideologia anacrónica e prejudicial?
Tive oportunidade de ver a maioria dos debates eleitorais. Infelizmente, esclareceram pouco ou nada. Os 25 minutos eram consumidos em mútuos ataques pessoais, na ânsia de enterrar o adversário. O que interessa é quem ganha este campeonato deplorável, não quem se compromete com medidas concretas, arrojadas, e as expõe clara e sucintamente. Este país arrasta-se penosamente há anos e anos, precisa urgentemente de uma barrela, de um abanão que o faça mudar de alto a baixo. Durante os debates, não vimos sombra desse abanão tão necessário para sairmos deste marasmo em que a “geringonça” nos mergulhou (embora o mal já venha de trás). Vinte anos de governação socialista colocaram o país de novo na cauda da Europa, graças a um modelo de crescimento baseado no consumo e nas prestações estatais de toda a ordem. Portugal precisa de crescer para sair do seu principal problema, que é a pobreza. Isto não se consegue com pachos quentes, resolve-se adoptando um novo modelo de crescimento assente no fortalecimento da iniciativa privada, nas exportações, numa significativa baixa dos impostos e numa diminuição dos escalões fiscais, para que deixe de haver pessoas que não podem ser aumentadas, porque, dado o imposto, ainda ficariam a perder!