Este é um novo princípio para as áreas protegidas
Dizem que dantes é que foi bom pois envolviam-se as autarquias e as populações locais. Desculpem-me o plebeísmo: tretas. Não conheço um autarca satisfeito com o paternalismo dos sábios, e 20% da população “envolvida”fugiu
Há dias, um conjunto de cavalheiros escreveu neste jornal que a política de cogestão para as áreas protegidas era o seu fim.
Procurarei explicar porque assim não é.
Começo por contrariar uma ideia, a do propalado sucesso do passado. É de facto uma falsidade. Nunca se investiu o necessário. Estas áreas, com paisagens humanizadas, perderam 20% da população numa década porque nada foi feito, muito menos a boa política invocada para manter as atividades humanas que geravam biodiversidade. A ria Formosa encheu-se de casas clandestinas. Os eucaliptais invadiram uma parte dos territórios protegidos. Os diretores dos parques funcionaram como autarcas não eleitos dispondo do território muito para além da proteção dos seus valores naturais (nem todos, é evidente).
Depois veio o absurdo centralismo na gestão, a penúria do investimento dos governos da direita, tempo que os autores do artigo não louvam, mas que omitem por completo.
Era evidente, no início do nosso mandato, que tinha de ser edificada uma nova política. Não servia a do passado recente, não havia um indicador de sucesso dos tempos anteriores, os glosados pelos autores, que também não sabem exemplificar.
E assim fizemos.
Foi estabelecida uma estratégia para a conservação da natureza e da biodiversidade. Determinámos uma forma de remunerar os serviços de ecossistema (não havia nenhuma). Investimos, em cinco anos, 40 milhões de euros nos parques e nas áreas protegidas, instituindo um conjunto de projetos de restauro de ecossistemas. Contratámos pessoas – só para a Peneda-Gerês foram 50 – e conseguimos reduzir em 90% a área ardida nos parques e reservas.
Também iniciámos um programa de cogestão destes territórios (esse é o alvo maior da crítica dos críticos) no qual, sem retirar quaisquer competências ao Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), envolvemos as autarquias, as Organizações Não-Governamentais do Ambiente e as universidades e politécnicos. Dizem os autores do artigo que dantes é que foi bom pois envolviam-se as autarquias e as populações locais. Desculpem-me o plebeísmo: tretas. Não conheço um autarca satisfeito com o paternalismo dos sábios e, repito, 20% da população “envolvida”, simplesmente, fugiu.
Os autarcas não são quem os autores do artigo a que respondo sugerem ser. São cada vez mais agentes políticos conscientes de que a valorização do seu capital natural é um fator decisivo na competitividade dos seus municípios. Dou como exemplo o orgulhoso discurso da presidente da Câmara de Silves há dias, na criação da área protegida nacional da Lagoa dos Salgados: há 21 anos que não era criada uma, em Portugal.
É um projeto diferente, o nosso? Sim, e por isso fizemos um projeto piloto, no Tejo Internacional, que foi de facto um sucesso, multiplicando por quatro os investimentos na conservação e fazendo o que se sonhava há anos e andava por cumprir.
Chegamos a um ponto de que nos orgulhamos? Ainda não. Herdámos da direita 20 milhões de euros no quadro comunitário que nos foi legado, para investir na conservação da natureza; garantimos que, o próximo, terá 300 milhões.
Descentralizámos o ICNF, que tem, em cada região, não um diretor regional mas um vogal do conselho diretivo. Acrescentamos à sua orgânica a responsabilidade de combate aos fogos rurais. Quase duplicamos o número dos vigilantes da natureza. E anunciámos que o ano de 2022 será o da Conservação da Natureza, por ser necessário assegurar, discutindo, que os 300 milhões que aí vem serão investidos em territórios locais sob uma lógica verdadeiramente nacional.
É este o nosso projeto. E se temos dúvidas humildes em relação ao futuro que só o caminho saberá dissipar, sem humildade vos digo: o passado que defendem foi um passado de disparate de que muito poucos têm saudades.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico