Governo indiano manda congelar contas da congregação criada pela madre Teresa de Calcutá
Protestos contra a celebração do Natal depois do partido de Narendra Modi ter acusado as missionárias de proselitismo.
O Governo do primeiro-ministro indiano Narendra Modi mandou congelar esta segunda-feira as contas das Missionárias da Caridade, a congregação religiosa criada pela madre Teresa de Calcutá, no estado de Bengala Ocidental, depois de um fim-de-semana de protestos por causa das celebrações de Natal, anunciou a líder política do estado.
Grupos de milícias populares atacaram espaços onde se celebrava o Natal em algumas regiões da Índia.
Meios de comunicação nacionalistas hindus, ligados ao partido de Modi, têm repetido muitas vezes a acusação de proselitismo contra a congregação fundada pela religiosa que foi canonizada em 2016. De acordo com esses meios, as Missionárias da Caridade teriam programas de conversão religiosa disfarçados de acções de caridade, ao oferecerem dinheiro, educação gratuita e abrigo aos hindus mais pobres.
“Chocada por ouvir que [no] Natal, o Conselho de Ministros congelou todas as contas bancárias na Índia das Missionárias da Caridade da Madre Teresa!”, escreveu no Twitter a primeira-ministra do estado de Bengala Ocidental, Mamata Banerjee. “Os seus 22 mil utentes e empregados foram deixados sem alimentos nem medicamentos. Mesmo que a legalidade seja fundamental, os esforços humanitários não podem ser postos em causa”, escreveu Mamata Banerjee, líder da oposição e uma voz crítica do Governo de Modi.
As Missionárias da Caridade foram fundadas em 1950 pela freira católica, que nasceu na Albânia (com o nome de Agnes Gonxha Bojaxhiu) e se naturalizou indiana, vencedora do Nobel da Paz em 1979. Com sede no estado de Bengala Ocidental, situado no Leste da Índia, a congregação tem mais de 3000 freiras que gerem asilos, cozinhas comunitárias, escolas, colónias de leprosos e casas para crianças abandonadas no mundo inteiro.
A direcção das missionárias não tinha reagido ainda à decisão e o ministro do Interior indiano afirmou que o Governo emitirá uma declaração assim que terminar o inquérito preliminar.
“Peço à imprensa para não misturar irregularidades financeiras de um grupo de beneficência com sentimentos religiosos… A decisão de congelar as contas não tem nada a ver com cristandade”, referiu um membro do Governo, que pediu anonimato, por não estar autorizado a falar à comunicação social.
O vigário-geral da Arquidiocese de Calcutá, Dominic Gomes, afirmou que o congelamento das contas daquela instituição no estado de Bengala Ocidental é “uma cruel prenda de Natal para os mais pobres entre os pobres”.
Conversões religiosas?
Desde que Modi chegou ao poder em 2014, grupos hindus de extrema-direita consolidaram a sua posição em todos os estados e lançaram ataques em pequena escala contra minorias religiosas, dizendo que as suas acções visam prevenir a conversão religiosa.
Cristãos e outros críticos dizem que o argumento de que se trata de uma forma de impedir as conversões religiosas é falso, tendo em conta que os cristãos representam 2,3% da população indiana, sendo os hindus a vasta maioria dos 1,37 mil milhões de habitantes.
O jornal The Hindu publicou esta segunda-feira uma notícia sobre perturbações nas celebrações do Natal na semana passada e durante o fim-de-semana, incluindo a vandalização de uma estátua em tamanho real de Jesus Cristo em Ambala, no estado de Haryana, no Norte do país, governado pelo Bharatiya Janata Party (BJP), o Partido Popular Indiano, de Modi.
O mesmo órgão de informação informou que, no sábado, junto a uma igreja em Varanasi, a circunscrição do primeiro-ministro e a cidade mais sagrada para os hindus, um modelo do Pai Natal foi queimado e gritaram-se palavras de ordem contra as celebrações de Natal e as conversões religiosas. Anoop Shramik, activista social em Varanasi, disse à Reuters que viu duas dezenas de pessoas a queimar o Pai Natal.
No sábado, as celebrações foram também perturbadas em Silchar, no estado de Assam, no Nordeste, depois de vários homens, que se identificaram como membros do Bajrang Dal, um grupo de extrema-direita com ligações ao BJP, terem entrado à força numa igreja, segundo noticiou o canal de notícias local NDTV.
Vários estados indianos aprovaram ou estão prestes a aprovar leis contra a conversão religiosa que põem em causa a liberdade e os direitos religiosos que a Constituição da Índia consagra às minorias.
Elias Vaz, vice-presidente da União Católica de Toda a Índia, condenou os últimos incidentes. “A força da Índia está na sua diversidade e as pessoas que fizeram isto durante o Natal é que são os verdadeiros antinacionais”, disse.
Com Saurabh Sharma, Subrata Nagchoudhury e Rupam Jain
Reuters