Governo dos Açores diz que tem procurado “rapidez” para instalar porto espacial
Esta semana, Manuel Heitor acusou os executivos açorianos de “incompetência” no processo do porto espacial de Santa Maria.
O presidente do Governo dos Açores disse esta quinta-feira que o executivo tem procurado agir com “rapidez” e “sentido muito estratégico” no processo de instalação do porto espacial de Santa Maria, lembrando o contencioso judicial que impediu avanços.
“Fomos confrontados com um legado e estamos a procurar agir com rapidez, mas sobretudo com sentido muito estratégico”, afirmou o chefe do executivo açoriano da coligação PSD/CDS-PP/PPM, José Manuel Boleiro, em declarações aos jornalistas, em Angra do Heroísmo, ilha Terceira, à margem da cerimónia de recepção de uma nova antena de recepção de dados no Air Centre. O presidente do Governo Regional foi confrontado com as declarações do ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, que acusou os executivos açorianos de “incompetência” no processo do porto espacial de Santa Maria.
O governante justificava a alteração à legislação sobre o Espaço que o parlamento açoriano considera colocar em causa a Constituição e a autonomia regional, levando os deputados regionais a votarem unanimemente contra a pretensão da República. “Lancei esta ideia ao então Governo Regional no verão de 2018. Nada aconteceu, porque a solução não funcionou, houve incompetência local e, sobretudo falta de humildade no projecto”, disse o ministro.
Bolieiro, que tomou posse em Novembro de 2020, assegurou que o Governo Regional está a “acelerar” o processo, mas teve “impedimentos de contexto”. “Tivemos um impedimento ultimamente, por causa de um contencioso judiciário que ultrapassa completamente as decisões e as opções do governo”, apontou. O chefe do executivo açoriano acrescentou que, “resolvido o problema judiciário”, o executivo açoriano está em condições para lançar um novo concurso público internacional.
Bolieiro salientou que, “ainda este mês”, será aprovada em Conselho de Governo a Estratégia Regional para o Espaço dos Açores. O governante garantiu que o executivo açoriano estava a trabalhar em parceria com a Agência Espacial Portuguesa, com o Governo da República e com a Europa para implementar o porto espacial de Santa Maria, mas “com defesa autonómica”. “Queremos dar músculo a este projecto, porque ele é universal e altamente competitivo e queremos valorizar os Açores nessa centralidade mundial do espaço, da ciência e das novas tecnologias”, adiantou.
No discurso de encerramento da cerimónia realizada no Air Centre, com sede na ilha Terceira, com Manuel Heitor na plateia, Bolieiro reafirmou a defesa da autonomia regional. “Não abdico das nossas competências autonómicas para este exercício de integração, de co-autoria e afirmação estratégica, mas sem medo da participação na globalização, não apenas para receber, mas também para dar e para nos integrarmos em estratégias universais que nos enriquecem e não nos diminuem”, frisou. Questionado sobre estas declarações, Bolieiro disse que não teve “intenção de dar recados”, mas sim de fazer uma “afirmação”.
O parlamento dos Açores manifestou-se esta semana, por unanimidade, “contra a aprovação” do regime jurídico das actividades espaciais proposto pelo Governo da República, considerado um ataque à autonomia regional e uma violação da Constituição. Na legislação em vigor, consultada pela Lusa, os licenciamentos de actividades espaciais nas Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira são definidos por decreto legislativo regional”, enquanto o projecto do Governo da República prevê que os licenciamentos sejam apenas “objecto de consulta ao Governo Regional”.
O Governo da República aprovou em Março de 2019 a criação da agência espacial portuguesa Portugal Space, com sede na ilha de Santa Maria, nos Açores. Inicialmente estava previsto que o contrato para a instalação e funcionamento do Porto Espacial de Santa Maria fosse assinado em Junho de 2019, para que os primeiros lançamentos de pequenos satélites ocorressem no verão de 2021.
As duas propostas que chegaram à fase final do procedimento foram excluídas pelo júri do concurso público e um dos consórcios impugnou a decisão em tribunal, solicitando, além da admissão da sua proposta, que não possa ser lançado novo concurso para o mesmo efeito. A 11 de Novembro, Luís Santos, coordenador da Estrutura de Missão dos Açores para o Espaço, disse que o projecto do Porto Espacial não foi abandonado pelo Governo dos Açores, aguardando-se autorização do tribunal para avançar com um novo concurso, após uma revisão e simplificação do processo.
A resposta do antigo presidente do Governo dos Açores
O antigo presidente do Governo dos Açores Vasco Cordeiro já retribuiu as acusações de “incompetência” ao ministro da Ciência. Numa declaração escrita enviada após questões da Lusa, o actual líder do PS/Açores reagiu às críticas de Manuel Heitor. “Julgo que o senhor ministro, quando fala de atrasos e quando tece outras considerações sobre a acção dos anteriores Governos Regionais, está confundido quanto ao assunto e quanto aos protagonistas. Certamente por lapso, refere-se ao dossiê espacial, quando me parece evidente que se quer referir ao dossiê Universidade dos Açores. Quando fala de incompetência dos anteriores Governos Regionais, parece-me que se estará a referir ao próprio ministério que lidera”.
Sobre o processo do porto espacial, Vasco Cordeiro, que presidiu aos XI e XII Governos Regionais dos Açores, destacou que não existiu “nenhuma derrapagem do prazo”. “Até ao momento de impugnação judicial, e à decisão do actual Governo Regional de aguardar pelo desfecho da mesma, não houve nenhuma derrapagem de prazo em qualquer fase do processo de contratação, que seja imputável à entidade que lançou o concurso, ou seja, a Região Autónoma dos Açores/Governo Regional dos Açores”, afirmou.
O socialista, que liderou o executivo açoriano entre 2012 e 2020, lembrou que o Governo dos Açores criou a 30 de Janeiro de 2017 a Estrutura de Missão dos Açores para o Espaço, “ainda antes de o senhor ministro ter conseguido criar a agência Portugal Space” em 2019. Vasco Cordeiro salientou que a “tipologia do procedimento concursal para a instalação” do porto espacial foi indicada por Manuel Heitor e “aceite pelo Governo Regional de então tendo em conta a vertente internacional” do projecto.
O também deputado regional do PS no parlamento açoriano criticou a “falta de palavra” de Manuel Heitor face ao “que se comprometeu publicamente, perante o reitor da Universidade dos Açores e perante o presidente do XII Governo Regional”, referindo-se ao contrato-programa entre a academia açoriana e o ministério. Aquele contrato, no valor de 1,2 milhões de euros, foi anunciado a 5 de Fevereiro de 2020, mas ainda não entrou em vigor.