Marcelo dará luz verde a referendo sobre regionalização
Presidente da República quer que partidos se posicionem sobre regionalização em matéria de orgânica, poderes, recursos financeiros e mapas.
Levantou dúvidas, falou em condições, disse o que espera, mas mostrou abertura. Sobre o processo de regionalização, defendido pelos autarcas reunidos em Aveiro, no congresso da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e no sábado, pelo primeiro-ministro António Costa, Marcelo Rebelo de Sousa diz que “deverá ser dada a última palavra aos portugueses”.
“Em princípio, convocarei um referendo que tenha aprovação parlamentar”, garantiu o presidente da República no discurso que encerrou o congresso. Marcelo disse que “só em circunstâncias muito excepcionais recusaria” uma proposta de referendo sobre regionalização que seja aprovada na Assembleia da República e que passe pelo crivo do Tribunal Constitucional.
Mas, antes de dizer que daria a sua luz verde, Marcelo, que, enquanto líder do PSD nos anos 1990, serviu como um dos principais travões à regionalização, colocou uma série de perguntas e estabeleceu um calendário para o processo.
O presidente considera que período que vai até às próximas eleições legislativas de 30 de Janeiro “poderá ser essencial” para que os partidos tornem públicas as suas intenções sobre a criação de regiões administrativas. Depois de Costa ter ido a Aveiro anunciar um referendo para 2024, “falta conhecer a posição dos demais partidos sobre o calendário e, se for caso disso, sobre a mudança orgânica, de poderes, de recursos financeiros, bem como o traçado definitivo de fronteiras regionais”, disse Marcelo. Minutos antes, o presidente tinha estabelecido estas como as perguntas que quer ver respondidas durante este processo.
“Seria difícil de entender que [os partidos] deixassem passar essa oportunidade para depois, na Assembleia da República, se debruçarem sobre a matéria a partir de 2022. Seria deitar fora o instante adequado para apresentarem e defenderem a regionalização”, advertiu.
No final do congresso em que os autarcas defenderam a “urgente regionalização do país”, Marcelo defendeu que se deve “blindar todos os passos com razões sólidas e irrefutáveis” e fez um pedido: “No debate que vai ocorrer, deixem sempre muito claro que a regionalização que desejam e vão construir não é para vós, não é para autarcas ou para algumas forças políticas, para criar lugares após o termo dos vossos mandatos ou para partilhar o poder entre partidos mais fortes. É para os portugueses”. Uma regionalização “com visão, sensatez e consenso nacional” será “um serviço inestimável” ao país, ao passo que uma regionalização “mal explicada e mal concretizada” poderá “matar a ideia”, dando “força aos centralismos, aos populismos”.
O caminho tinha sido apontado por António Costa na abertura do congresso: o referendo deverá acontecer em 2024, quando for possível avaliar o caminho percorrido na descentralização de competências. O calendário coincide com o estabelecido por Marcelo que, porém, refere o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) como principal motivo para que o tema da regionalização não seja trabalhado nos próximos dois anos.
“Já viram o que seria estar a arrancar com o PRR e ao mesmo tempo ter debates abertos sobre uma matéria que envolve necessariamente os autarcas”, questionou o presidente para dizer que os presidentes de câmara “vão estar muito ocupados” em 2022 e 2023, “dois anos que são cruciais” para a implementação do plano.
“Daí parece-me que é prudente deixar essa iniciativa – se for essa a deliberação da Assembleia da República - para 2024”, disse Marcelo, aos jornalistas, à saída do Parque de Feiras e Exposições de Aveiro.
O Presidente tinha introduzido a questão no discurso, dentro do salão, ao fazer uma avaliação geral do processo de descentralização de competências, dos pontos altos (transferência de competências, progressiva adesão de reticentes, eleição para das CCDR pelos autarcas, combate à pandemia) aos baixos (falta de recursos que acompanhem a transferência, algum descaso pontual no relacionamento pontual entre poder local e CCDR preparação do PRR, a necessidade de rever a lei das finanças locais). “O saldo, em qualquer caso, é positivo”, sublinhou, para acrescentar que “valeu a pena o que foi feito em termos de descentralização, vale a pena prosseguir nesse caminho”.
Também em Aveiro, a ministra da Modernização do Estado e da Administração, Alexandra Leitão, manifestou a disponibilidade do governo “para continuar o diálogo” sobre a descentralização e para “identificar novas áreas que possam vir a ser transferidas para as autarquias locais”. Garantiu também que o avanço da descentralização não fica pendurado pela não aprovação do Orçamento do Estado para 2022.
A autarca de Matosinhos, Luísa Salgueiro, que neste congresso foi escolhida como nova líder da ANMP, propôs a criação de um observatório da descentralização “para monitorizar e avaliar a execução do processo” que envolva universidades e politécnicos e ajude a fornecer “dados essenciais” e a partilhar boas práticas.
O contributo do PÚBLICO para a vida democrática e cívica do país reside na força da relação que estabelece com os seus leitores.Para continuar a ler este artigo assine o PÚBLICO.Ligue - nos através do 808 200 095 ou envie-nos um email para assinaturas.online@publico.pt.