Um vídeo bem conseguido, com muitos efeitos especiais, concretizou uma manobra de marketing estrondosa que pôs meio mundo a falar sobre o que se pretendia a poucos dias da maior cimeira do Clima, que junta em Glasgow o DiCaprio aos actores internacionais que representam os cidadãos, numa tentativa de alcançarem mais que uma mera representação teatral e protocolar.
Mas terá sido este T-rex da Lourinhã o único dinossauro a discursar nas Nações Unidas? Talvez o problema seja em parte esse: muitos dinossauros pisam este palco enchendo o imponente púlpito de rotineiras narrativas anacrónicas. Os diferentes rostos são os mesmos que sempre se perpetuam nas juras intransigentes deste parque jurássico e temático tão assertivo como a neutralidade suíça.
A neutralidade até se pede, a carbónica que não corresponde à inércia que nos carboniza, mas ao pragmatismo que alimenta a nossa chama de viver, assente em oxigénio que ultrapassa uma fogueira de vaidades. Os discursos até podem ser bonitos ou tão dramáticos como cenas de outro Dino de balão, mas de rex, max ou remax vem sempre o mesmo remix de nenhum inspector ou agente ser capaz de propor ou executar diligências que encerrem este caso, nesta Pangeia dividida e endividada.
Desde Berlim, lugar da primeira edição e onde o muro caiu, que se tentam construir pontes que liguem os vários Estados a um objectivo comum: juntamos políticos e somam-se discursos, juntamos activistas e somam-se gritos, juntamos polícias para evitar o confronto destes e somam-se COP - já são 26. Porque insistimos então neste ritual? Mais vale ir para a Golegã ou para esta Feira do Cavalo de Tróia? Tudo isto comporta uma carga de desalento nesta península que pode virar ilha.
As COP não têm atingido os resultados desejados e necessários, porém continuam a ser um meio de extrema importância para atingir um fim. Falamos de consensos, os Estados desde Vestefália são soberanos e isto implica que estas partes numa posição de igualdade formal formalizem um acordo. A Assembleia Geral das Nações Unidas não pode por maioria dos seus membros aprovar uma legislação universal que vincule todo o mundo. Os próprios acordos recentes das COP não têm força vinculativa nem dispõem de sanções para o não cumprimento dos Estados ou qualquer possibilidade de coercibilidade.
Se não temos um verdadeiro Direito Internacional, nem um sistema universal que vá além da mera existência da ONU, temos que juntar as peças que temos na mesa para que o relógio funcione a nosso favor. Aproveitando que os pólos estão a descongelar a grande velocidade, apostemos em despolarizar a sociedade e arrefecer os discursos hostis nesta guerra fria constante entre os dinossauros conformistas e as “floribellas "que se julgam filhas de árvores. O planeta não é só a dicotomia entre o litoral inundado ou o interior abandonado, entre o pessoal rijo do campo que sofrerá graves consequências ou os urbanos que não se safam com uma horta na varanda.
Este parque das Nações não é só o Oriente que se diz incompreendido, apesar de maioritário em população e poluição, ou o Ocidente que se autoflagela. É um mundo de diversidade cultural onde falta empatia e COPeração, onde não existem regras e a diplomacia não é nuclear, onde a política externa continua a ser de consumo interno e onde os dinossauros ainda governam em nome da estabilidade.
Onde ficou o progresso que tanto ambicionávamos? Onde parou o espírito vanguardista ou os sóbrios sonhos do pós-Segunda Guerra? Ou criamos movimentos pela inércia ou exclamamos que o amanhã deve ser o passado, como se fosse o tempo de caravelas e não de bolinar noutros mares, rodar por outros moinhos e pintar novos painéis. Vendemos a sustentabilidade como um sacrifício quando nos trará maior qualidade de vida, não compreendemos o que significa desenvolvimento sustentável e almejamos um retrocesso fiável.
Todos os cientistas e historiadores que estudam pegadas marcarão o compasso das nossas pisadas seguras de conhecimento, mesmo que este divirja antes de se sedimentar. Mais que crianças fofinhas a questionarem-nos se comemos carne ou fruta hoje, mais que dinossauros que fossilizam a esperança e a irreverência, a ONU precisa desesperadamente de líderes carismáticos que fintem burocracias, divisões, entraves, conformismos e moralismos, projectando o progresso com todos a bordo no comboio da sustentabilidade, reforçado em todos os apeadeiros e presente em todas as estações, numa linha complexa com várias forcas e bifurcações.