Os primeiros desenhos de Siza chegam a Serralves por doação de Tereza Siza

“Eu era um péssimo desenhador, com seis, sete anos, até aos 15. Hoje, ainda não sei”, disse o arquitecto numa sessão que acompanhou a cerimónia de doação de 200 desenhos pela sua irmã.

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O arquitecto Álvaro Siza na inauguração da Casa dos Jardineiros em Serralves Paulo Pimenta

Uma doação de Tereza Siza vai dotar o acervo da Fundação de Serralves de cerca de 200 desenhos que marcam o início do percurso do arquitecto Álvaro Siza na arte, ainda durante a infância e adolescência.

O contrato de depósito assinado na segunda-feira entre a irmã do arquitecto, guardiã do acervo, e a Fundação de Serralves junta aproximadamente duas centenas de obras nunca antes divulgadas de desenho e aguarela dos finais da década de 1940 e da década de 1950. A colecção junta-se a um espólio de 40 projectos e mais de 50 mil documentos que incluía já 6500 desenhos de Siza.

O arquitecto foi responsável pelo projecto do Museu, pela reabilitação da Casa de Serralves, pela Casa do Cinema Manoel de Oliveira e, mais recentemente, pela Casa dos Jardineiros daquela fundação.

Hoje, até desenha com a mão esquerda, como contou Carlos Castanheira, arquitecto e moderador da conversa que se seguiu à assinatura do contrato, relatando uma noite em que, na conversa, Álvaro Siza encheu casualmente um livro com 52 desenhos, um dos quais executado com a mão esquerda, quando já tinha retratado tudo o que tinha à volta.

Mas o caminho não foi sempre assim. “Eu era um péssimo desenhador, com seis, sete anos, até aos 15. Hoje, ainda não sei”, afirmou o arquitecto galardoado com o prémio Pritzker.

Na sessão, como nos desenhos, tratou de “invocar a memória, as recordações”. “Anotei o que me vem imediatamente à cabeça com estes desenhos: sala de jantar da casa da minha avó, um pedagogo improvável, o meu tio Joaquim e uma medalha na Faculdade de Arquitectura”, contou.

Foi o “tio Quim” quem mais povoou a conversa, pois foi ao colo dele que Álvaro Siza aprendeu a cultivar o gosto pelo desenho, a única coisa que importa para se ser um bom desenhador, garantiu.

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Assim o foi quando, questionado pela irmã se se nasce com a aptidão para o desenho se ela é adquirida, respondeu prontamente dizendo que “aptidão para o desenho têm todas as crianças”. “Eu não fui criança, então”, retorquiu Tereza Siza, arrancando risos à sala. Contida a gargalhada, o arquitecto prosseguiu, explicando que “aptidão há, depois tem de ser estudada, aprimorada. Tem de haver esse gosto. Isso nem sempre acontece, mas não é por razões inatas”.

O arquitecto fez um percurso pelos desenhos da infância, lembrando que começou a carvão, antes de uma “incursão na cor”, com que sempre teve “bastante dificuldade”, e explicando que explorou a aguarela e o óleo, que não o seduziu. Passou também pelo desenho à pena, técnica com que gosta de lembrar a sua mulher, Maria Antónia.

As obras que fazem agora parte do acervo de Serralves têm de tudo. “Isto está nas costas do orçamento do telhado do Centro Paroquial de Matosinhos”, revelou Tereza Siza sobre um dos desenhos.

Para Ana Pinho, presidente do Conselho de Administração de Serralves, este é “mais um momento feliz” na relação com um artista cujo “nome se confunde com o da instituição”. “Não se consegue sequer dissociar o nome de Álvaro Siza de Serralves. É um local onde Álvaro Siza está presente de diversas formas”, reforçou.

Na sessão esteve também presente o ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, Pedro Siza Vieira, sobrinho de Álvaro Siza.

A pedido da administradora, o governante reservou umas palavras finais para enaltecer o “privilégio” de ter crescido “num ambiente multigeracional, estimulante e rico”.

Esse contexto deu-lhe a certeza “de que todos nós temos o potencial para sermos o que quisermos ser, precisamos é do ambiente certo, de ser estimulados, expostos a experiências, de ter professores, mentores, pedagogos que nos ajudam a atingir o nosso potencial”.

“Acredito profundamente nesta ideia de que temos de fazer uma sociedade onde todos os concidadãos tenham a possibilidade de ser expostos a estas experiências e desenvolver todo o seu potencial para se tornarem cidadãos plenos e capazes de contribuir para a sociedade com tudo aquilo que são capazes de trazer. Essa é a nossa responsabilidade que temos de ir construindo constantemente, como cidadãos, como sociedade”, defendeu.