Lagarde tenta travar receios dos mercados sobre a subida de inflação
Está a ganhar força a ideia de que o Banco Central Europeu pode ser forçado a voltar atrás na sua promessa de não mexer nas taxas de juro por muito tempo. Mas Christine Lagarde insiste que subida da inflação será apenas temporária.
Em mais uma tentativa de convencer os mercados de que uma subida das taxas de juro na zona euro ainda é um cenário distante, Christine Lagarde reafirmou esta quinta-feira a sua convicção de que a escalada recente da inflação é temporária, não exigindo uma alteração dos planos do Banco Central Europeu (BCE), de retirada muito progressiva das suas políticas expansionistas.
Com a inflação na zona euro a chegar a 3,4% em Setembro, o valor mais alto dos últimos 13 anos, instalou-se de forma ainda mais acentuada nos mercados a dúvida sobre se o Banco Central Europeu vai conseguir manter durante muito mais tempo a sua promessa de manutenção das taxas de juro aos actuais níveis mínimos recorde no médio prazo.
São cada vez mais os analistas que consideram que a subida da taxa de inflação na zona euro, inicialmente vista como um fenómeno de curta duração, afinal está para durar, num cenário em que os constrangimentos nas cadeias de distribuição e escalada dos preços do petróleo e das matérias-primas contribuem para a persistência das pressões inflacionistas nas economias.
Num cenário deste tipo, em que a taxa de inflação permanecia bem acima da meta de 2% e as expectativas no médio prazo subiam também acima desse valor, a estratégia delineada pelo BCE seria colocada em causa. O banco central definiu como plano finalizar o programa anti-pandemia de compras de dívida em Março, mas mantendo durante mais tempo o programa normal de compras de dívida e deixando apenas para 2023 uma eventual subida dos juros.
Esta quinta-feira, no final da reunião do conselho de governadores do BCE, a presidente da instituição não cedeu e voltou a mostrar que em Frankfurt a convicção é que os receios dos mercados são infundados. “Nós olhámos seriamente e testámos profundamente a nossa análise dos motores actuais da inflação, e estamos confiantes que a nossa análise e aquilo que antecipamos é o correcto”, afirmou Christine Lagarde.
A presidente do banco central explicou que “a subida dos preços da energia, a recuperação da procura e os constrangimentos na oferta são aquilo que neste momento está a elevar a inflação”, mas mostrou-se confiante que “embora a inflação vá demorar mais tempo a diminuir do que o esperado, estes factores vão diminuir ao longo do próximo ano”.
“Continuamos a antecipar uma inflação no médio prazo que permanece abaixo da nossa meta de 2%”, disse. Na recente mudança de estratégia realizada pelo BCE, a instituição definiu que, após um período longo de inflação baixa como o vivido na última década, é natural que o banco central deixe a inflação superar, durante algum tempo, a meta de 2%, pelo menos até que as expectativas de curto médio prazo se possam equilibrar. Lagarde defendeu esta quinta-feira que essas expectativas, embora possam ter subido “um pouco”, “continuam baixas”.
Uma viragem brusca da política do BCE, com um regresso mais rápido a uma conjuntura de subida das taxas de juro, iria penalizar as economias mais endividadas como Portugal. Não só os encargos da dívida pública portuguesa poderiam tornar-se mais elevados, como as empresas e as famílias veriam as amortizações dos seus empréstimos (maioritariamente indexados às taxas Euribor) serem agravadas.
Para a próxima reunião do conselho de governadores do BCE, a realizar em Dezembro, está marcada a discussão definitiva que quais serão os passos a tomar pelo banco a partir de Março, o momento em que o programa anti-pandemia de compras de dívida do BCE chega ao fim. Também serão dadas a conhecer pela autoridade monetária as suas novas projecções para a variação do PIB e para a inflação na zona euro.
Christine Lagarde estará, na próxima semana, em Portugal, para participar, a convite do Presidente da República, no Conselho de Estado.