Hospitais em Setúbal: promessas não tratam doentes
Não se espera que a ministra da Saúde vista a bata para tratar dos doentes, espera-se antes que tome as decisões políticas necessárias.
A situação do Centro Hospitalar Setúbal (constituído pelo Hospital de São Bernardo e Hospital Ortopédico Sant’Iago do Outão) não pode ser aceite como uma novidade. Os alertas sobre os problemas com a falta de profissionais de saúde e espaço físico eram de conhecimento público antes da pandemia.
A demissão do diretor clínico, seguido de 87 diretores, é o “último grito” de alerta. Contudo, não é factualmente o primeiro alerta dado pelos profissionais de saúde [1].
Em fevereiro de 2020, um pouco antes do surto epidemiológico, a Ordem do Médicos alertava para o risco de várias especialidades ficarem sem médicos. Este foi um de vários alertas proferido por várias entidades, sendo a classificação do Hospital de São Bernardo outro tema incontornável.
A classificação do Hospital de São Bernardo leva a que orçamento que é atribuído pela administração central seja menor. Ou seja, outros hospitais, que têm a classificação adequada, conseguem ter mais dinheiro disponível por cada ato médico praticado. Isto significa que cada ato médico praticado no Hospital São Bernardo tem menos dinheiro disponível para pagar os profissionais e meios materiais necessários.
Esta situação causa um défice operacional com um enorme impacto no distrito de Setúbal. Isto porque o Hospital de São Bernardo tem uma área de influência que abrange vários concelhos: Sines, Santiago do Cacém, Grândola, Alcácer do Sal, Palmela e Setúbal.
Como fica claro, a ausência de meios tem sido compensada pelo esforço adicional dos profissionais de saúde.
Contudo, a sobrecarga nos profissionais de saúde apenas piora a atratividade de um hospital que tem um orçamento curto para as suas necessidades. E assim torna-se mais difícil manter ou contratar médicos, enfermeiros, e todos os outros profissionais necessários.
Portanto, este não é claramente um tema político para os partidos se digladiarem, contrapondo diferentes ideias ou projetos políticos. É um tema que é prioritário para uma região.
É com este sentido de prioridade que deve ser exigida uma resposta ao Governo. Essa resposta não serve para dar razão a partidos, nem para “insuflar” o ego da ministra da Saúde. Serve para responder à saúde pública de uma região.
O Governo não pode adotar o estilo “sensacionalista” a que se assiste em cada Orçamento de Estado. Não é a primeira vez que as obras de ampliação do Hospital de São Bernardo estão inscritas no Orçamento de Estado. Mas não passam da “sensação” de que alguma obra vai ser realizada, servindo na apenas para frustrar os profissionais de saúde e utentes.
A intervenção a nível do reforço dos recursos humanos, espaço físico e outros meios materiais obriga igualmente ao enquadramento do Hospital Ortopédico Sant’Iago do Outão, cuja área de influência abrange todos os concelhos do distrito de Setúbal. A ampliação do Hospital de São Bernardo nunca deveria ter ficado pendente da venda do hospital ortopédico situado no Outão, como ocorreu em anos anteriores. Neste negócio impõe-se a máxima clareza e escrutínio, inclusive no Parlamento, para acompanhar uma transação imobiliária que não deveria estar misturada com as prioridades para a saúde pública de uma região.
O Governo tem que reconhecer a dimensão do problema para atuar de forma proporcional. Anunciar o concurso para dez médicos é o mesmo que propor uma aspirina para a mais grave das doenças. Ou seja, é uma atuação desproporcionalmente pequena face à dimensão do problema.
O esforço coletivo do país para superar a pandemia não é trabalho do Governo. A dedicação dos profissionais de saúde não é um mérito da ministra Marta Temido. Quando avaliamos o trabalho do Governo vemos que o Centro Hospitalar de Setúbal tem um orçamento curto e uma longa espera para a realização das obras necessárias devido à ausência de decisões governativas.
Não se espera que a ministra da Saúde vista a bata para tratar dos doentes, espera-se antes que tome as decisões políticas necessárias, porque as promessas não resolvem o problema.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico